quarta-feira, 20 de fevereiro de 2008

Tentativa e erro

Valor Econômico
Por Danilo Fariello, de São Paulo
20/02/2008



Com 253 gestores e R$ 1,150 trilhão em ativos, a concorrência é cada vez maior no setor de fundos brasileiro. A busca por diferenciação entre os administradores de recurso cresceu nos últimos anos e levou a uma série de lançamentos e novidades. Avançou-se em técnicas comerciais, estratégias de gestão e de risco, e cresceram modalidades antes pouco exploradas. Muitos desses lançamentos conquistaram a clientela, como os fundos long/short, as carteiras que dão prêmios e as que garantem o principal investido em ações, para ficar em poucos exemplos. Outros, nem tanto. Mas podem ser válidos para se avaliar para onde caminha o mercado.


Um desses casos de sucesso questionável que traz uma nova visão sobre a administração de fundos no Brasil é o da família Melhor de 2, do Santander Asset Management. A modalidade chegou a ter patrimônio de cerca de R$ 800 milhões e mais de 28 mil cotistas. As carteiras devolviam parte da taxa de administração cobrada pela gestora para bancar o compromisso de o fundo oferecer o maior retorno entre fundos DI e renda fixa.


Essas carteiras surgiram em outubro de 2006, quando a perspectiva era de queda da taxa de juros, à época em 13,75% ao ano. Os investidores, na ocasião, sentiam certa insegurança sobre se a melhor alternativa seria investir em fundos renda fixa (que aplicam em papéis prefixados) ou nos fundos DI, que seguem o juro diário. O Santander criou então o fundo que ofereceria a estratégia que rendesse mais, alterando sua taxa de administração, que podia variar de zero a 4% ao ano. A primeira edição do fundo captou mais de R$ 500 milhões e a segunda, em março de 2007, mais de R$ 300 milhões.


Ambas as edições do melhor de 2 foram encerradas no dia 18 de janeiro e incorporados ao Top Renda Fixa. Os fundos tiveram rentabilidade acumulada de 70% do CDI no período de existência e, se considerada a rentabilidade líquida, perderam para a caderneta de poupança. Apesar do encerramento e da pouca rentabilidade para quem prometia o melhor do DI e da renda fixa, o Santander inovou nessas carteiras ao prever os rebates de taxa de administração.


O Santander é visto no varejo como o gestor com maior criatividade em fundos, acoplando seguros que preservam certa rentabilidade ou reduzindo taxas conforme o prazos de aplicação, por exemplo.


Mas apenas agora, depois do encerramento dos fundos, Márcio Appel, principal executivo da gestora, explica que a família Melhor de 2 investia em dois fundos - um DI e outro renda fixa - que rebatiam (devolviam) parte da taxa de administração cobrada ao fundo distribuído aos investidores de varejo. Dessa forma, bancava a diferença de rentabilidade entre as duas categorias. A aplicação mínima dos fundos era de R$ 5 mil.


Antes, essa prática de rebate de taxas ocorria em fundos de fundos, que costumam aplicar em carteiras com diferentes custos. Outra ocasião em que ocorre rebate de taxas é no caso da contratação de um alocador, que recebe parte da receita dos fundos que indica.


Apesar da inovação, concorrentes da gestora no mercado reclamaram da falta de transparência sobre o funcionamento do sistema para o investidor. À época do lançamento do fundo, Appel não revelou ao Valor como ofereceria o melhor dos dois mercados. "O mecanismo era segredo industrial", diz Appel. Mas os demais gestores do mercado faziam cara feia para o fundo, sob o temor de que, em um momento de crise, ele pudesse manchar a imagem de todo o setor, por provocar dúvidas entre seus milhares de cotistas.


Mesmo com uma variação branda do mercado e a suspensão da expectativa de corte de taxas, o fundo passou a ter de bancar rotineiramente a melhor rentabilidade entre o DI e a renda fixa aos seus cotistas, conta Appel. Esperava-se que a continuidade dos cortes e, por conseqüência, o maior sucesso dos prefixados, sustentasse com facilidade o menor lucro dos DI. No entanto, "o fundo ficou caro demais" para o Santander, disse Appel. Por isso, as carteiras foram encerradas em janeiro.


Nenhuma norma impede o Santander de devolver parte da taxa de administração cobrada dos investidores, explica Carlos Eduardo Sussekind, superintendente de Relações com Investidores Institucionais da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), entidade que regula e fiscaliza os fundos. "O importante é ele informar a taxa máxima e respeitar esse limite." Mas ele afirma que a propaganda dos fundos melhor de 2, estrelada por Cláudia Raia e Débora Falabella, não deixava claro como o fundo usava a taxa, o que levantava suspeitas sobre a promessa de rentabilidade. A CVM abriu processo para que o Santander revisse seu material publicitário, o que ocorreu de fato.


Segundo Sussekind, a CVM acompanha a cobrança das taxas pelos administradores, mas como exige apenas que informem o percentual máximo cobrado dos clientes, abre espaço para que eles o joguem para baixo, sem necessidade de haver uma assembléia de cotistas. O prospecto do Melhor de 2 dizia expressamente que "o administrador transferirá ao fundo, no todo ou em parte, a remuneração que receber pela distribuição de cotas dos FICs, a fim de que a rentabilidade do fundo seja equivalente àquela do FIC mais rentável ao final de cada mês." A expressão FIC significa Fundo de Investimento em Cotas, onde o aplicador efetivamente investia. No fim do mês, o administrador reduzia a taxa de uma carteira para bater com a renda da outra vencedora.


Segundo especialistas do mercado, apesar de uma instituição poder reduzir as taxas, a alteração poderia maquiar a rentabilidade da sua carteira. Segundo Appel, no caso do Santander, eram rígidas as regras internas de quando isso poderia ocorrer e em qual intensidade. Portanto, não havia manipulação. "Era uma fórmula matemática." Appel comenta que o Santander não tem planos de replicar a estratégia de cobrança de taxas dos Melhor de 2

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