quarta-feira, 7 de julho de 2010

Análise: No longo prazo, a psicologia do investidor em ações é inútil


 

Valor Econômico

Chris Watling, Financial Times
07/07/2010


 

Os mercados de ações são conduzidos pela psicologia do investidor e ocasionalmente passam por choques que duram de um a três meses. No fim de abril, medidas da exuberância dos investidores indicavam que uma onda de aversão ao risco provavelmente era iminente. No fim de maio, o apetite pelo risco e outros indicadores parecidos haviam oscilado para o outro extremo, sinalizando uma grande probabilidade de recuperação na disposição do investidor em assumir riscos.

Imediatamente antes, os investidores que participaram da onda de vendas haviam embutido os riscos nos preços de maneira exuberante. No fim do processo, os riscos estavam embutidos nos preços de maneira temerosa. Citando Warren Buffett: "Deveríamos ter medo quando os outros estão insaciáveis, e sermos insaciáveis quando eles estão com medo".

No longo prazo, porém, a psicologia do investidor é de pouca ajuda. A direção dos mercados de ações no longo prazo é motivada pelas perspectivas para o ciclo econômico. As fases de baixa ("bear market") antecipam e levam em conta as contrações econômicas. As fases de alta dos mercados ("bull market") antecipam e levam em conta as recuperações econômicas e as fases de crescimento. Dentro dessas fases de alta, três fases distintas tendem a ocorrer.

Inicialmente, quando os mercados começam a perceber que as notícias ruins já estão nos preços das ações e que uma recuperação está no horizonte, tem início a fase 1 do ciclo de "bull market". Essa fase normalmente representa 40% de todo o ciclo do "bull market" e tem uma duração histórica média de 11 meses. Trata-se da recuperação que testemunhamos em 2009, 2003, 1991 e até o fim de 1993.

A fase 2 de um ciclo de "bull market" começa quando os mercados começam a antecipar o início de um ciclo de aperto monetário. Historicamente, isso tem sido sinalizado pelo começo de uma alta sustentada dos rendimentos dos bônus de um e dois anos de prazo. Nesse ciclo, a fase 2 geralmente começa com uma desaceleração e depois um fim do afrouxamento quantitativo, o limite externo padrão da política monetária.

Em média, a fase 2 dura 11,4 meses e resulta em uma queda média de 7% nos preços das ações globais. Entretanto, essa tendência de queda não deve ser confundida com um "bear market" renovado, porque ela é simplesmente uma consolidação dos ganhos acelerados da fase 1. Ela é acompanhada por uma volatilidade notável; oscilações de 5% a 15% para cima e para baixo ao longo desses 11 meses.

Assim que a fase 2 chega ao fim, a fase 3, a última do ciclo de alta, começa. Isso se os investidores estiverem convencidos de que a economia mundial conseguirá absorver as altas de juros antecipadas e que o novo ciclo econômico terá força. A fase 3 pode durar até cinco ou seis anos (como na década de 1990), ou apenas um ou dois anos (como na segunda metade da década de 1970). O tempo de duração é ditado pela longevidade do ciclo econômico.

É nesse contexto que as movimentações recentes do mercado devem ser observadas. As ondas de vendas de janeiro e maio são um componente natural da segunda fase deste ciclo de "bull market". Por enquanto, continuamos esperando novos ganhos nesta recuperação, talvez até a metade ou fim do terceiro trimestre, e pelo menos enquanto os indicadores estiverem novamente sinalizando exuberância. Uma repetição do padrão típico da fase 2, porém, levaria a mais uma onda de aversão ao risco, mais para o fim do ano, levando os índices de ações nos EUA e em todas as partes do mundo a novas quedas em 2010.

A movimentação ou não das ações para a fase 3 vai depender da evolução do ciclo econômico global. É claro que há razões para cautela. A batida dos tambores da austeridade fiscal está ficando mais alta, especialmente na Europa, e os balanços dos bancos estão sendo novamente pressionados com as crises soberanas na Europa. Enquanto isso, temores de um aperto exagerado e uma bolha nos preços do setor imobiliário residencial na China levantam o espectro de uma "engasgada" do maior motor do crescimento da economia mundial.

No entanto, assim como estamos aptos a esquecer os pontos negativos quando as ações estão em franca recuperação, também tendemos a subestimar os pontos positivos em períodos de volatilidade. Em especial, deveríamos lembrar de três pontos positivos principais.

Nas últimas décadas nunca houve uma recessão nos EUA, ou duplo mergulho, quando as companhias americanas se livraram de fluxos de caixa excedentes, nem quando quando a curva de rendimento esteve íngreme (sinalizando uma recuperação em andamento). As recessões nos EUA são motivadas pelo retrocesso do setor corporativo em resposta a choques. Quando as empresas estão com muito caixa, elas resistem aos choques.

Apesar do retorno de uma certa pressão sobre os balanços, as condições de crédito estão melhorando em termos mundiais, especialmente fora da Europa, uma vez que os bancos estão se recapitalizando nos últimos trimestres, e continuam surgindo evidências da virada no ciclo de crédito.

O crescimento dos mercados emergentes continua vigoroso, em especial o da China; os principais indicadores econômicos chineses, embora em ritmo mais lento, continuam mostrando uma tendência de alta; e o mais importante é que as taxas mensais de crescimento dos empréstimos melhoraram depois da desaceleração da segunda metade de 2009.

Portanto, embora aceitemos que a economia mundial enfrenta desafios consideráveis, o que significa que este ciclo será mais curto que o normal, por enquanto os condutores do crescimento deverão permitir aos mercados de ações ocidentais entrar na fase 3 neste "bull market" em algum momento do quarto trimestre.

Chris Watling é o executivo-chefe da Longview Economics

terça-feira, 6 de julho de 2010

Renda extra com ações

Investidor pessoa física pode obter ganho adicional na bolsa com o aluguel de seus papéis.


Valor Econômico

Por Alessandra Bellotto, de São Paulo
06/07/2010

Que tal garantir uma renda extra com ações? Para quem tem uma carteira de renda variável e não pretende se desfazer dela tão cedo - até porque o momento não é favorável, dada a queda da bolsa -, uma das alternativas para obter um ganho adicional é o aluguel das ações. Contratos registrados ao longo de junho indicam taxas que variam de 0,4% ao ano, para "blue chips" como Vale e Petrobras, a 4% para CPFL, 7,4% para Lojas Renner, 12% para Rossi Residencial e até 35% para Telebrás.

Na operação de aluguel de ações, o detentor do ativo "empresta" seus papéis temporariamente para investidores que precisam ou cobrir posições vendidas a descoberto (sem o papel em mãos) ou compor estratégias de arbitragem, em que se montam operações de compra e venda para ganhar com a diferença de preço das ações, e não com a direção da bolsa.

Além de não perder os direitos sobre as ações, como os dividendos pagos pelas companhias, o doador do ativo recebe uma remuneração que é definida entre as partes. Enquanto a ação estiver alugada, ele estará impedido de negociá-la.

No primeiro semestre, o volume de aluguel de ações somou R$ 204,5 bilhões, mais que o dobro do que os R$ 98,3 bilhões registrados no mesmo período do ano passado. Em número de operações, o crescimento foi de 35,7%, passando de 337.457 nos primeiros seis meses de 2009 para 457.984 no último semestre.

A participação da pessoa física é mais relevante como doador das ações, ou seja, aquele que empresta o ativo. Em junho, o investidor pessoa física foi responsável por uma fatia de 26,58% do total de operações, atrás dos fundos mútuos, com 35,6%, e do investidor estrangeiro, com 29,29%. Na ponta do tomador, a parcela da pessoa física ainda é pequena, com 4,95% das operações de junho. Fundos participaram com 48,74% e o estrangeiro, com 40,09%.

"O aluguel é interessante para quem pretende 'dormir em cima' dos papéis", afirma o professor e educador financeiro da Calil & Calil Mauro Calil. Em geral, explica ele, papéis de maior liquidez pagam as taxas mais baixas. Como tem muita ação no mercado e boa parte está nas carteiras dos fundos de pensão - investidores que não têm a política de girar o portfólio -, a oferta para alugar é grande, o que acaba derrubando a taxa.

Já os papéis de maior volatilidade tendem a oferecer taxas melhores. Tem muito investidor que reserva uma parcela pequena da carteira para carregar ações de maior risco, afirma Calil. Ele cita o exemplo da Brasil Ecodiesel, cujo aluguel das ações tem saído na faixa de 7,7% ao ano.

Essa é uma empresa que tem uma parcela importante de acionistas que está de olho no futuro, no sucesso do combustível ecológico, e, portanto, vai ficar com os papéis em carteira por muito tempo, explica o professor. "Para esses, o aluguel vale a pena, uma vez que só com a taxa ele garante um rendimento equivalente ao da poupança." Fora isso, há a possibilidade de ganhos com a variação do papel na bolsa.

As taxas de empréstimo, no fim das contas, costumam oscilar ao sabor da oferta e demanda. Às vezes, até ações consideradas defensivas, de baixa volatilidade e boas pagadoras de dividendos, se tornam atraentes por conta do aumento da demanda pelo aluguel desse papel por parte dos fundos de arbitragem. Esse é o caso da empresa de energia CPFL, com taxa de aluguel de 4% ao ano.

A ordinária (ON, com voto) da Vivo é outro exemplo, com uma remuneração de cerca de 17% ao ano. "A Vivo é uma empresa sólida, que não vai desaparecer de uma hora para outra, mas que está no meio de uma disputa entre sócios", diz Calil. O professor ressalta que não há estratégia única e imutável, por isso é importante acompanhar os contratos na Companhia Brasileira de Liquidação e Custódia (CBLC), que funciona como contraparte, garantindo as operações, além de registrá-las.

"O crescimento do aluguel segue a expansão do mercado de ações brasileiro", afirma o sócio responsável pela corretora global de ações do BTG Pactual, José Miguel Vilela. Com o crescimento do número de companhias listadas desde 2002, aumentaram também as opções de ações para alugar. Na visão dele, esse é um instrumento que faz sentido para ambos os lados, para o doador que vai carregar o ativo e para o tomador que quer montar estratégias de arbitragem.

"É claro o benefício para o doador, uma vez que ele maximiza seu ganho", diz. E a pessoa física tem uma participação importante como doadora, justamente pela característica de olhar para a bolsa como um investimento de mais longo prazo, acrescenta o executivo. Do lado de quem toma a ação emprestada, explica Vilela, os fundos são mais relevantes, por conta de estratégias mais elaboradas. "Eles tendem a operar imperfeições de mercado, ganhar com as distorções de preços entre ações", diz.

O aumento da oferta de papéis e a evolução do mercado de ações levaram a uma redução do custo do aluguel, acrescenta o diretor de administração de risco da BM&FBovespa, Luis Antônio Vicente. As taxas menores, por sua vez, aumentam o número de investidores montando operações de arbitragem, criando um círculo virtuoso. "Quem tem a ação percebeu que, sem risco algum, pode manter o papel e, ao mesmo tempo, ter uma remuneração extra", afirma.

Um dos diferenciais do mercado local é que a bolsa, por meio da CBLC, garante a operação, enquanto lá fora a relação é bilateral, ou seja, há um risco de crédito envolvido. Isso é importante, segundo o diretor, para quem toma o ativo emprestado, mas principalmente para quem doa, porque sabe que vai receber a taxa e o papel de volta na data combinada.

Para o desenvolvimento do mercado, são dois os principais benefícios do serviço de empréstimo de ações, afirma Vicente. O primeiro é que ele permite uma melhor formação de preço dos ativos. "Com um mecanismo para ficar comprado e vendido em determinado papel, é mais difícil ter distorções de preço", diz. Quando se puxa muito um preço artificialmente, explica Vicente, tem uma outra força que vai fazer o valor do ativo no mercado convergir para o justo.

Uma segunda vantagem é que o aluguel de ações contribui para o tratamento de falhas na liquidação de operações. Segundo o diretor da BM&FBovespa, há casos em que o participante vende um papel, só que na data da liquidação - em três dias úteis -, por algum motivo operacional, ele não consegue entregar o ativo. A saída é tomar a ação emprestada e regularizar a situação. "Cerca de 80% das falhas potenciais são cobertas pelo empréstimo de ações", conta.

É preciso cuidado com as simulações para planos de previdência

Valor Econômico

06/07/2010

Humberto Veiga

As mudanças na previdência não se limitam à questão do futuro do INSS e da capacidade de pagamento de pensões. A principal mudança que se verifica é a alteração nos planos de previdência complementar da situação de benefício definido para contribuição definida. Essa última definição, um eufemismo para "o problema é seu".

Os bons tempos do benefício definido nos deixavam como dúvida apenas o risco de crédito da empresa de previdência contratada. A contribuição definida (que utiliza o termo definida para denominar a sua escolha no momento de cada um dos depósitos), por sua vez, agrega à primeira dúvida a indefinição de quanto será a sua pensão no momento da aposentadoria.

Um dos maiores problemas que surgem é a questão das simulações. Relatórios de organismos internacionais apontam o dano que simulações enganosas podem causar na formação de poupança dos futuros aposentados.

Os vendedores dos planos utilizam-se da velha máxima de que o "papel aceita tudo", aliás, de que um simulador de previdência aceita tudo. E o exemplo é simples. Vamos para um caso em que você utilize uma taxa de remuneração de 8% para depósitos de R$ 100,00 para um período de 30 anos, o valor acumulado bruto será de R$ 140.855,06. Se a taxa utilizada for de 4%, esse valor cairá para R$ 68.527,06.

Na hora de vender o plano, é melhor mostrar o número grande, uma vez que você irá se sentir tentado a fechar o contrato para adquirir o plano. E quando chegar a hora de se aposentar? Como fica?

A maioria das pessoas não tem a visão de que simulação não é compromisso. Se o valor dos juros utilizados na simulação for incorreto, o que vai acontecer é o seguinte: tanto você poupará menos do que o necessário para o seu objetivo, quanto terá que arrumar um dinheiro extra na hora de parar de trabalhar.

Desconhecer o assunto, portanto, faz surgirem três pontos básicos. O primeiro diz respeito a uma suposta conclusão óbvia: por que o futuro aposentado previdente não escolhe a taxa mais alta? Pelo simples fato de que é o mercado quem irá ditar as taxas máximas de juros a serem pagas. E o investidor, individualmente, somente poderá abrir mão delas. Para suplantá-las, são necessárias estratégias muitas vezes inacessíveis ao cidadão comum.

O segundo ponto refere-se aos juros reais (acima da variação da inflação). Quando você olha para os números pensa que são adequados, mas, passados 30 anos, provavelmente terão pouco valor. Para que tais montantes possam ser avaliados do ponto de vista do poder de compra na data de hoje, os juros utilizados têm que ser reais e não as nominais.

É muito comum o investidor desavisado equivocar-se e comparar os 8% com o valor da taxa básica, a Selic (hoje na casa dos 10,25% ao ano), e imaginar que se trata de uma estimativa conservadora para os juros, quando, na verdade, ela é extremamente ousada.

Atualmente, no país, a taxa de juros real da economia gira em torno de 4,5% ao ano. Assim, utilizar o valor de 4% para a taxa de juros é algo mais apropriado. Com essa taxa, aquele montante produzirá resgates de R$ 412,68 durante 20 anos, ou R$ 324,34 durante trinta anos ou, ainda, R$ 283,36 durante 40 anos.

Ainda com relação aos juros reais, para que os R$ 68.527,06 possam representar o real potencial de compra do dinheiro, é necessário que o poupador faça depósitos de R$ 100,00 ajustados mensalmente pela inflação.

Finalmente, o último é a questão dos custos dos planos de previdência. Se você errar nesse aspecto, o que já era pouco ficará ainda menor, porque os 4% de juros reais podem transformar-se em 1% (ou até ficar negativos, isto é, juros abaixo da inflação), o que reduziria sua poupança para pouco menos de R$ 42.000,00, diminuindo seu benefício em, pelo menos, 53%!

Seja realista com as taxas nas simulações de planos e evite procurar a consultoria de quem vende os produtos de previdência na sugestão dessas taxas. Ainda que os fundos apresentados para você exibam números robustos, seja previdente e lembre-se da máxima dos investimentos: rentabilidade passada não é garantia de retornos futuros.

Humberto Veiga é consultor e autor do livro "Tranquilidade Financeira - Saiba como investir no seu futuro"

Este artigo reflete as opiniões do autor, e não do jornal Valor Econômico. O jornal não se responsabiliza e nem pode ser responsabilizado pelas informações acima ou por prejuízos de qualquer natureza em decorrência do uso destas informações.

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