sexta-feira, 31 de julho de 2009

Investidor em bolsa é quem deve recolher os tributos


Valor Econômico

Luciana Monteiro, de São Paulo
31/07/2009

 

A tributação é um dos complicadores na vida de quem investe diretamente em ações, pois é o aplicador que precisa providenciar os pagamentos. Não é como nos fundos, em que o imposto é descontado automaticamente a cada resgate. Todos que vendem ações num valor superior a R$ 20 mil por mês precisam pagar 15% de imposto de renda sobre os ganhos obtidos em cada operação. E é o próprio aplicador que deve fazer o cálculo de quanto tem a pagar de imposto e recolhê-lo.

Isso exige uma organização maior do investidor, que precisa guardar os comprovantes de compra e de venda de cada papel para poder calcular de quanto foi o ganho na operação.

A apuração do imposto é mensal e vence no último dia útil do mês seguinte ao da venda das ações. Só há imposto, entretanto, se o valor vendido no mês for superior a R$ 20 mil. Isso quer dizer que, mantendo-se abaixo desse limite todo mês, o investidor pode ter uma isenção até R$ 240 mil por ano.

Muitos investidores pensam que o limite de isenção é R$ 20 mil por operação, mas, na verdade, é de R$ 20 mil no total vendido no mês. E, uma vez ultrapassado o valor de R$ 20 mil, o imposto incide sobre o total e não apenas sobre o que superar os R$ 20 mil. Se, por exemplo, um papel comprado por R$ 10 mil é vendido por R$ 21 mil, o investidor terá de pagar o imposto sobre o ganho de R$ 11 mil, e não apenas sobre R$ 1 mil. A partir do total vendido no mês, o investidor tem de pagar 15% sobre os ganhos líquidos, já descontadas eventuais perdas naquele mês ou em meses anteriores.

O imposto sobre o ganho com a venda de ações é pago pelo investidor em forma de Darf (Documento de Arrecadação de Receitas Federais), encontrado em qualquer papelaria, com o código 6015. E é bom guardar os comprovantes. Na hora de fazer a declaração anual, o investidor deve informar mês a mês o ganho total das operações acima de R$ 20 mil na seção Renda Variável. Esses valores informados na declaração não serão tributados novamente.

O Darf pode ser pago em qualquer agência bancária, esclarece Hugo Azevedo, no livro "500 perguntas básicas de Finanças para iniciantes no mercado". O investidor também tem a possibilidade de efetuar um download do arquivo SICALC (disponível no site da Receita Federal) para preenchimento ou impressão do Darf, lembra o autor.

É muito comum os investidores não fazerem o recolhimento do imposto porque, no ato da venda das ações, a corretora recolhe na fonte 0,005% de imposto sobre o valor, avisando a Receita da operação. Esse percentual pode ser deduzido na hora de pagar o imposto sobre o ganho de capital. Muito investidor, no entanto, vê esse recolhimento no extrato da corretora e acha que já pagou o imposto, o que não é verdade. Esse imposto serve apenas de dedo-duro para a Receita, mostrando que o investidor teve ganho tributável naquele mês.

quarta-feira, 29 de julho de 2009

Ganho com fortes emoções

Índice Bovespa recupera perdas pós-quebra do Lehman Brothers, mas volatilidade é a maior desde 1999 e aumenta o risco para o investidor.

Valor Econômico

Por Adriana Cotias e Angelo Pavini, de São Paulo
29/07/2009

Em menos de um ano, o Índice Bovespa zerou as perdas da crise iniciada em setembro do ano passado com a quebra do banco americano Lehman Brothers. Foi uma viagem de 25 mil pontos, que começou com 45% de queda, dos 54.404 pontos de 2 de setembro para 29.435 em 27 de outubro, seguida de alta de 85%, para 54.471 pontos ontem. Mas a crise deixou suas marcas no ritmo de oscilação do mercado. Conforme estudo da Economática, a volatilidade do Ibovespa é a mais alta desde 1999, época da flutuação do real, e não há sinais de que cairá tão cedo.

Se serve de consolo, o investidor brasileiro não está sozinho nessa jornada. O mercado americano também está com níveis de volatilidade nunca vistos, compatíveis com a maior crise desde 1929, lembra Einar Rivero, da Economática. "É o eletrocardiograma do mercado, mostra que o coração está batendo em ritmo alucinante", diz.

Com tanta volatilidade, o mercado busca se adaptar, procurando oportunidades em prazos mais curtos, aproveitando as oscilações e distorções de preços, observa Einar. "Muita gente está ganhando dinheiro no dia a dia, deixando o longo prazo um pouco de lado", observa. Com isso, a análise fundamentalista, do desempenho da empresa, acaba ficando de lado e os investidores buscam se orientar pela análise gráfica, que indica os movimentos de curtíssimo prazo. Para Einar, talvez no segundo semestre, com a volta dos bons resultados das empresas, os prazos se estiquem um pouco mais.

A volatilidade na Bovespa é ainda muito intensa e o investidor custa a se acostumar aos vaivéns. "Faz parte de um processo de aprendizado, pois com juros abaixo de 10% ao ano, o aplicador vai ter de entender que não dá para ganhar dinheiro sem sobressaltos", diz o diretor da Spinelli Corretora Manuel Lois. Ele lembra que o Brasil passa por uma mudança estrutural, que forçará o investidor a repensar o seu apetite por risco. Sem mais poder cultivar ganhos polpudos na renda fixa proporcionados por taxas estratosféricas, ele considera a migração para a bolsa compulsória para quem quiser retornos diferenciados.

"Investir em ações é para toda a vida, é para poupar parte da renda mensal, e não se preocupar com as oscilações de curto prazo, é entender que, quando a bolsa cai, é uma oportunidade para investir mais", diz Lois. O executivo reconhece, porém, que esse não é um comportamento óbvio porque quando o Ibovespa aponta sistematicamente para baixo, a exemplo do que ocorreu após a quebra do Lehman Brothers, o investidor se sente mais pobre.

Para um período de 12 meses, o Ibovespa ainda deve dar retornos acima do custo de oportunidade - a Selic projetada -, espera o diretor de Renda Variável do HSBC Global Asset Management, Eduardo Favrin. "O investidor local, especialmente o institucional, ainda está no início de um processo e ele vai se fazer mais presente a partir de 2010, é quando começaremos a ver um movimento mais intenso de migração da renda fixa para a variável." Com juros reais em níveis historicamente elevados, o executivo pondera que fazia sentido manter uma alocação relativamente baixa na bolsa. Mas, num cenário de taxas menores, é uma questão matemática buscar alternativas. "As fundações vão ter de agregar mais risco nas carteiras como um todo, pode ser em multimercados, crédito privado ou bolsa, só com o juro real não vai dar para bater as metas atuariais."

A única coisa que pode reduzir a volatilidade da bolsa é uma maior visibilidade sobre o futuro da economia mundial, cenário que ainda parece estar distante, diz Lika Takahashi, chefe da área de Análise da Fator Corretora. "Estamos vivendo ao longo deste ano de sustos e sustinhos, alguns bons e outros ruins, e isso aumenta a volatilidade", afirma. O lado positivo é que, nos últimos três meses, o fluxo de notícias positivas foi maior e fez o mercado subir. "Mas nada impede que haja uma nova onda de notícias ruins e o mercado caia novamente", alerta Lika.

Uma das variáveis que tornam o futuro do mercado mais incerto é a ligação do Brasil com a economia chinesa, grande consumidora de commodities. "E a China é uma grande incógnita, não só pelas questões econômicas mundiais em si, mas pela baixa confiabilidade dos dados", diz.

Lika vê com ressalvas a forte alta do Ibovespa nos últimos dias, fruto muito mais do fluxo de investidores externos do que da melhora das condições das companhias. "Olhando os números das empresas, as ações já não estão baratas e as apostas se tornaram menos óbvias", afirma. Por isso, no curto prazo, o mercado vai depender muito mais do fluxo de estrangeiros. Até dia 24, o saldo dos investidores externos na Bovespa no mês estava positivo em R$ 1,598 bilhão, depois de ter chegado a ficar negativo em R$ 2 bilhões. No ano, o saldo é de R$ 11,705 bilhões.

A recuperação rápida das ações criou também uma situação em que grandes investidores externos, que perderam a recente alta, ficam à espera de quedas para comprar. Com isso, quando há um recuo dos preços, há novamente um movimento de alta, mesmo sem muitos motivos macroeconômicos. "Isso impede uma queda maior", diz Lika.

Para ela, a visibilidade no mercado deve melhorar no fim deste ano ou no começo do ano que vem. "Mas só vamos ter uma ideia boa do efeito das medidas contra a crise na economia mundial em meados de 2010", diz Lika. Até lá, a bolsa deve continuar em função das notícias e do fluxo de investidores externos. Lika ainda mantém a estimativa de um Ibovespa na casa dos 51 mil pontos neste ano e de 60 mil para junho do ano que vem. "Mas vamos ver até o fim deste mês."

Apesar da alta de 45% neste ano, o Índice Bovespa ainda está longe e precisaria subir mais 35% para voltar ao pico de 73.516 pontos, de 20 de maio de 2008, pouco depois de o país atingir o selo de investimento de baixo risco. Mas espaço para ganhos existe, dizem analistas. Pedro Martins, estrategista para América Latina da Banc of America Securities Merrill Lynch, vê um potencial de alta de 24% para as principais ações brasileiras em 12 meses e acha que o Brasil passará por um processo de reclassificação de risco, um "re-rating".

A diversificação dos investidores locais, que pode jogar US$ 22 bilhões por ano dos fundos de renda fixa para ações, forçará um aumento dos preços das ações. Com isso, a relação Preço/Lucro - P/L, referencial que estima em anos o tempo de retorno do investimento na ação e, portanto, quanto menor, melhor - do mercado brasileiro deve aumentar, para se equiparar aos mercados globais. "O P/L médio do Brasil tem um desconto de 13% em relação ao P/L global que deverá desaparecer com esse 're-rating'", acredita Martins. Ao mesmo tempo, esse dinheiro local servirá para aliviar o impacto da saída dos estrangeiros em momentos de turbulência.

segunda-feira, 27 de julho de 2009

CDB derrapa

Com taxas mais baixas, depósitos a prazo têm saídas líquidas de R$ 2 bi em julho e estimulam investidor a buscar alternativas mais rentáveis.

Valor Econômico

Por Adriana Cotias, de São Paulo
27/07/2009

 

Campeões absolutos de audiência em 2008, com uma captação líquida superior a R$ 230 bilhões, os Certificados de Depósitos Bancários (CDB), começam a perder fôlego. No ano, até o dia 20, acumulavam meros R$ 18,8 bilhões, com o saldo de julho negativo em R$ 2,1 bilhões, revertendo o ritmo observado em maio e junho, quando mais de R$ 7 bilhões ingressaram na categoria em cada mês. Março e abril já haviam registrado saídas líquidas, mas com os juros nominais em 8,75% ao ano, nível mais baixo da história, o investidor ensaia um novo comportamento. Alguns ainda estão com os recursos presos em CDB antigos, mas o dinheiro recém-resgatado e as sobras recentes têm buscado outros destinos, dispersando-se em ações, debêntures, multimercados ou a caderneta de poupança.

Com a criação dos depósitos a prazo com garantia especial (DPGE), que começaram a valer em abril, mas só decolaram nos dois meses seguintes, o fluxo se normalizou para os bancos de pequeno e médio porte, que, de lá para cá, captaram R$ 9,5 bilhões por meio do instrumento. Mas agora até mesmo essas instituições começam a colocar o pé no freio na oferta. Os grandes conglomerados financeiros, especialmente os privados, por sua vez, com o caixa cheio com as captações do passado recente e o menor ímpeto no crédito, mudaram o foco na rede. Com taxas mais baixas, a demanda também caiu.

"No varejo, efetivamente, a procura tem sido menor e o CDB ficou em segundo plano", diz o gerente-executivo de Produtos do Santander, Marcos Matos. "O investidor acompanha o seu extrato e quando vê 0,7% ao mês acha pouco quando compara com o histórico que era de 1% e, com o cenário mais calmo, ele acaba buscando alternativas mais rentáveis." Com o melhor desempenho da bolsa e dos multimercados, parte do dinheiro tem rumado para essas aplicações ou ainda para a caderneta, que tem sido o destino mais comum dos excedentes da conta corrente. Até meados de julho, o Santander observou uma captação líquida na poupança 50% superior a tudo que havia ingressado nos seis primeiros meses do ano.

Tal conduta está, em parte, relacionada à oferta menos agressivas das grandes instituições, com taxas muito aquém das observadas ao longo de 2008, quando o CDB de um banco de primeira linha chegou a pagar 110% do CDI no varejo. Atualmente, as taxas dos CDB convencionais para operações de baixo tíquete médio rondam os 80% do indexador. Comparando-se aos 6,17% anuais da poupança, livres de tributação, nem mesmo quem estivesse num depósito a prazo de dois anos, na alíquota mais baixa de imposto de renda (15%), ganharia mais no CDB, com um rendimento líquido de 5,95% ao ano.

Sem necessidades expressivas de captação, os grandes conglomerados financeiros conseguiram preservar um colchão de liquidez no atravessar da crise, mudaram de posição e agora jogam na retranca. "A grande maioria dos bancos, sobretudo os de grande porte, estão com o caixa cheio e o apetite para captar via CDB ficou significativamente menor", diz o diretor da Associação Nacional das Instituições do Mercado Financeiro (Andima) Nelson Rocha Augusto, também presidente do Banco Ribeirão Preto.

Conforme descreve, outros dois fatores explicam o fenômeno. A melhora do ambiente no mercado de capitais, com a volta das emissões de dívida e de ações nos últimos meses, permitiu às companhias acessar recursos por outro tipo de instrumento no lugar do crédito bancário. Além disso, fundos DI e de renda fixa, grandes compradores históricos de CDB, reduziram a demanda pelos papéis, já que a captação nessas carteiras também vem se mantendo discreta.

No Banco do Brasil, que tem sido um dos principais ofertantes de crédito do sistema no ano, enquanto os privados se retraem, não houve freio na venda de CDB na rede, diz o gerente executivo da Diretoria de Varejo Antonio Cássio Segura. "O CDB é o nosso principal 'funding' para crédito, estamos crescendo rápido e mantendo um excelente nível de liquidez." Segundo o executivo, a captação no ano cresceu 27%, só que, em julho, o aumento se limitou a 2%. Pelos últimos dados públicos, no fim de abril, o BB detinha uma carteira de R$ 128,2 bilhões em depósitos a prazo, com uma participação de 19,6% no mercado.

Segura credita à criação do DPGE o bom desempenho dos CDB nos meses de maio e junho. O instrumento adicionou uma cobertura de R$ 20 milhões do Fundo Garantidor de Crédito (FGC), que o investidor não encontra num CDB convencional, com seguro de até R$ 60 mil. Num primeiro momento, as taxas ofertadas eram bastante díspares, chegando a 130% do CDI pelos dados da Cetip, criando oportunidades para todos os perfis. Com prêmios desse porte, o BB criou cinco fundos de DPGE para investidores de alta renda. Em dez dias, as carteiras atraíram R$ 400 milhões e o banco vai conseguir remunerar os cotistas em 102% do CDI no Estilo e 105% no Private, já líquidos das taxas de administração. "Agora, com a normalização da liquidez, não conseguimos mais comprar nessas taxas."

Custos é o grande dilema hoje dos bancos de pequeno e médio porte, a quem a ampliação da cobertura do FGC visou atender. Para Renato Oliva, presidente da Associação Brasileira de Bancos (ABBC), que representa as instituições de nicho, o DPGE é hoje um título com risco praticamente igual ao do governo e deveria ter taxas até menores do que um CDB convencional. "O FGC é uma das instituições mais sólidas do Brasil, tem como sócio os principais bancos do país, com R$ 23 bilhões de caixa e patrimônio", diz Oliva. "No final das contas, o DPGE tem garantia do Tesouro, status de título público, e acaba sendo melhor do que o CDB do maior banco do Brasil."

Apesar de a liquidez ter se normalizado, as taxas pedidas hoje rondam os 110% do CDI, consideradas caras pelas instituições menores. Para ele, o preço justo hoje seria entre 100% e 102% do indexador. Mas esse é o retorno garantido por nomes como BB, Bradesco e Itaú, para grandes volumes.

A cobertura extra do FGC teve o mérito de redistribuir a liquidez, que vinha empoçando nos grandes bancos. Dessa forma, a iniciativa contribuiu para trazer mais solidez para todo o sistema e os bancos de pequena e média rede voltaram a emitir CDB com a garantia convencional, de R$ 60 mil, diz Oliva. Ele conta que, em agosto, antes da quebra do Lehman Brothers, essas instituições captavam a um custo entre 115% e 125% do CDI e que, atualmente, as taxas estão entre 110% e 115%.

Os volumes custodiados na Cetip confirmam a inflexão dos depósitos a prazo. Em julho, o saldo de DPGE atrelado ao CDI (78% do total) cresceu 7%, para R$ 9,5 bilhões. Já o estoque de CDB (também DI, que representa 88% do total), subiu só 1%, a R$ 781,7 bilhões. "Como a base de CDB é muito maior, não dá para inferir que possa estar havendo uma migração do CDB para o DPGE", explica o gerente de Relações com Participantes da Cetip, Fábio Hull.

Com os estoques formados no auge da crise vencendo e a percepção de que os episódios mais críticos ficaram para trás, os investidores, os agentes do mercado em geral, estão repensando o seu sentimento de aversão a risco, pondera o sócio-diretor da FinPlan, Mailson Hykavei. O advento do FGC até deu um fôlego de curto prazo para os depósitos a prazo, pois o mercado chegou a pagar taxas inimagináveis para um instrumento de renda fixa - de 135% do CDI, ouviu-se até 150% do indexador nas primeiras negociações. "O DPGE chegou a roubar fatia do dinheiro vencendo no CDB e houve também migração para outras classes de ativos."

Apesar de as taxas do DPGE hoje terem atingido níveis mais realistas, Hykavei considera que não há espaço para os custos caírem muito abaixo dos 110% ou 105% do CDI. "Uma coisa é você dar o conforto para o investidor com a cobertura de R$ 20 milhões, outra coisa é se colocar no cenário de executar essa garantia." Isso quer dizer que o retorno do DPGE dificilmente vai se equalizar ao do CDB, porque a diferença se justifica pela qualidade do crédito. "O mercado sempre vai atribuir um risco ao emissor", diz, além de ter, com a crise, aprendido a precificar liquidez.

Com o custo de oportunidade, dado pela Selic, mais baixo, Hykavei considera que os estoques de CDB e de outras aplicações de renda fixa vão cair progressivamente. A inflexão observada em julho é apenas um indício dos novos tempos que estão por vir

Fundos: crédito privado cresce

Para compensar queda da Selic, aumentam as aplicações em papéis emitidos por empresas

MARIANA SEGALA, mariana.segala@grupoestado.com.br

A queda da taxa básica de juros (a Selic) está levando os gestores dos fundos a aumentarem as aplicações em títulos de dívida emitidos por bancos e empresas. A fatia de papéis como Certificados de Depósito Bancário (CDBs), Recibos de Depósito Bancário (RDBs), debêntures e notas promissórias cresceu de 16% dos ativos dos fundos em dezembro de 2004 para 25% ao fim de 2008, segundo a Associação Brasileira de Bancos de Investimentos (Anbid). Em junho, a participação dos títulos privados era de 24%. "Na medida em que a taxa de juros cai, passa a haver demanda por opções de retorno em renda fixa que apresentem prêmio frente ao CDI (Certificado de Depósito Interbancário)", diz o diretor de gestão da BB DTVM, Carlos José da Costa André.

O movimento se intensificou a partir do segundo semestre de 2008 em função da crise financeira internacional. Bancos brasileiros passaram a ter dificuldade para obter recursos lá fora para emprestar aqui dentro e substituíram a captação externa pela local, diz o diretor do Modal Asset Management, Alexandre Póvoa. "Vimos bancos grandes emitindo CDBs com taxas de 105% a 110% do CDI. Os gestores aproveitaram para aumentar a parcela deles nas carteiras", diz. Neste ano, a vez é das empresas. "Com dívidas vencendo, elas estão lançando debêntures com taxas altas. Telemar, Tractebel, Eletropaulo e CPFL ofereceram até 115% do CDI", explica Póvoa.

A tendência, na visão dos especialistas, é de que a participação do crédito privado na composição dos fundos cresça ainda mais, em detrimento da fatia dos papéis públicos, ainda os mais representativos. Eles somam 41% do total de ativos. Se consideradas na conta as operações estruturadas - empréstimos feitos com os recursos dos fundos, mas com garantia em títulos públicos - o valor chega a 60%. No fim de 2004, a soma era de 72%. A parcela de renda variável, de 12% há cinco anos, alcançou 22% em 2007, mas recuou para 16%, devido principalmente à desvalorização dos papéis negociados na Bovespa.

A demanda por ganho maior na renda fixa tem sido tanta que alguns bancos começaram a criar fundos que aplicam exclusivamente em papéis do tipo. "Não é incomum achar títulos privados em fundos de renda fixa ou DI para varejo", diz André, da BB DTVM. "Faz sentido que fundos conservadores complementem a rentabilidade com papéis privados, principalmente CDBs", diz o gestor de carteiras da consultoria Verax Serviços Financeiros.

Saiba mais

CRÉDITO PRIVADO

Fundos que destinam mais de 50% do patrimônio para títulos de dívida de empresas precisam, obrigatoriamente, trazer a inscrição "crédito privado" no nome, para sinalizar ao investidor que o a aplicação corre o risco do emissor seja ele banco ou empresa

RISCO MAIOR

É que há a possibilidade de que, eventualmente, a empresa que emitiu os títulos incluídos na carteira dê um calote, caso tenha problemas. Num fundo tal risco é reduzido porque o patrimônio não é concentrado nos papéis de um único emissor

Nova queda dos juros: quem ganha é a poupança

Com a taxa básica da economia em 8,75%, está mais difícil ganhar com fundos de investimento DI e renda fixa

Jornal da Tarde

27/07/2009

PRISCILA DADONA, priscila.dadona@grupoestado.com.br

Em um cenário de juros menores, quem tem até R$ 5 mil disponíveis para investir encontra na caderneta de poupança a melhor opção. O JT pesquisou os sites dos nove maiores bancos do País e descobriu que não existe fundo de investimento Renda Fixa ou DI (que seguem as taxas de juros) de varejo disponível que aceite aplicação neste valor e cobre taxas de administração abaixo de 1,5% ao ano.

Os fundos que aceitam aplicações mínimas de R$ 5 mil para baixo cobram taxas de administração em geral, acima de 3% ao ano. Somadas ao Imposto de Renda obrigatório, as taxas afetam a rentabilidade dos fundos que, com isso, têm ganhos menores que os da caderneta de poupança, isenta de taxas e impostos.

Dos 145 fundos abertos para captação disponíveis nos portais dos bancos (Banco do Brasil, Bradesco, Caixa Econômica Federal, HSBC, Itaú, Nossa Caixa, Real, Santander e Unibanco), 39 cobram taxas de administração iguais ou menores que 1,5%. No entanto, os fundos com taxas menores e que poderiam dar maior retorno só aceitam ingressos acima de R$ 50 mil (veja quadro).

O levantamento apurou também que existem fundos que aceitam aplicação de R$ 50, porém, as taxas não saem por menos do que 3%. Outro dado interessante é que clientes "preferenciais" com renda acima de R$ 5 mil conseguem aplicar valores menores em fundos com taxas de administração mais baixas. Ou seja, muitas vezes vale mais o relacionamento com o banco do que o valor disponível para aplicação.

Simulação feita por Luiz Jurandir Simões, consultor da Fundação Instituto de Pesquisas Contábeis, Atuariais e Financeiras (Fipecafi), a pedido da reportagem, mostra que um fundo DI com taxa de administração de 1% hoje já perderia para a poupança. Com a taxa básica da economia (Selic) a 8,75%, este fundo renderia 0,49% ao mês, após o desconto da taxa e do IR de 20%. Já a caderneta ganharia em média 0,55% no mesmo período (veja quadro).

Vale lembrar que o imposto cobrado nos fundos são regressivos e que para pagar a menor alíquota (15%) é preciso manter o dinheiro aplicado por, no mínimo, dois anos. Na poupança não há custo e nem imposto, mas o investidor também deve ficar atento à data de aniversário da aplicação.

O que fazer?


Para Simões, o investidor que quer ganhar da poupança tem duas alternativas: ou junta um montante maior e aplica num fundo com taxa mais baixa ou aplica diretamente nos títulos públicos do governo. "O Tesouro Direto é uma ótima opção", afirma. Neste caso, pode-se fazer a aplicação diretamente por meio do site do governo federal.

Reinaldo Zakalski, administrador de recursos de terceiros da BI Investimentos, acredita que o investidor que quer poupar e possui até R$ 15 mil deve preferir a caderneta. "Para quem ainda está formando um valor, a poupança é uma boa alternativa", acredita.

Segundo o especialista, o aplicador de um fundo DI muitas vezes investe na modalidade por comodidade. "Dificilmente um investidor destes fundos quer poupar por um prazo muito longo."

É o caso do dentista Carlos Eduardo Miranda, que não sabe dizer o valor da taxa de administração do fundo DI no qual aplica há quatro anos. Apesar de ter consciência que, com a queda dos juros, os fundos podem perder para a poupança, prefere deixar seu dinheiro onde está "enquanto isso vai rendendo". A primeira aplicação do dentista foi de R$ 70 mil para a aquisição de uma casa, mas atualmente possui cerca de R$ 11 mil em um fundo DI.

O movimento de redução nas taxas de administração dos fundos de varejo já começou. O pioneiro foi o Banco do Brasil, que cortou, na última sexta-feira , as tarifas de cinco fundos (dois DI e três de renda fixa). Além disso, o BB reduziu a aplicação inicial em 17 carteiras.

Outros bancos como Bradesco, Itaú Unibanco, HSBC e Caixa Econômica Federal também já reduziram os valores dos ingressos iniciais em alguns de seus fundos e também estudam reduzir as taxas de administração.

Locations of visitors to this page