sexta-feira, 4 de julho de 2008

Multimercados à prova

Valor Econômico
Por Angelo Pavini, de São Paulo
04/07/2008


A maioria dos fundos multimercados de gestores independentes - os mais agressivos - apresentou no primeiro semestre resultados abaixo do CDI e, muitos, até negativos, em meio à forte instabilidade dos mercados financeiros e do ioiô que se tornou o Índice Bovespa. Vários também sofrem com os resgates de investidores descontentes com a rentabilidade, com a volatilidade das cotas, ou simplesmente seduzidos pelos ganhos maiores dos CDBs.


No ano, até 30 de junho, em uma amostra de 68 fundos independentes acompanhados pelo Valor no site Fortuna, os saques chegam a R$ 4,3 bilhões, reduzindo o patrimônio total das carteiras para R$ 14,743 bilhões. Há fundos que perderam mais da metade do patrimônio - como os da Mauá, da Quest e da Mandarin. Depois da chacoalhada, alguns, inclusive, estudam mudanças para se adaptar aos novos tempos, mais difíceis.


Apenas 20 fundos superam o CDI de 5,39% no período e 16 estão no vermelho no primeiro semestre. Mas há também quem foi bem no período, e que são as exceções. Como as carteiras da Sparta e da Guepardo, com retornos espetaculares proporcionados pelo mercado de commodities, mais especificamente de boi gordo, cujo preço disparou este ano. Há ainda gestores que estavam mais pessimistas, como os da Claritas, e carteiras que usam métodos quantitativos - unindo matemática e estatística -, caso do Kadima, Princípia e do Pátria. São esses fundos multimercados com bom desempenho que estão conseguindo captar.


Em muitos casos, o investidor que hoje está saindo dos multimercados aplicou olhando o passado do fundo, e não sua volatilidade, diz Celso Scaramuzza, responsável pela área de Private Banking do Unibanco. "Alguns entraram porque viram que o fundo rodava a 120% do CDI e não entendiam que era uma aplicação de risco", diz. Para ele, o mercado vive um momento duplamente prejudicial para o setor. Os mercados estão muito instáveis e os fundos não estão conseguindo um bom desempenho, salvo algumas exceções. "Além disso, tem banco de primeira linha pagando 105% do CDI com baixíssimo risco, é difícil segurar o investidor", diz.


Há casos até em que há motivo para o investidor sacar, mas são exceções. A maioria dos investidores que estão saindo não estava preparada para esse tipo de estratégia e nem para um período longo de perdas, diz Francisco Costa, da Capital Investimentos. Ele dá o exemplo dos fundos de arbitragem de ações, os long/shorts, que todos pensavam que não podiam perder. "Mas não é assim, há períodos em que os gestores têm maior facilidade de obter resultado, outros em que é mais difícil", diz. Hoje, porém, o investidor está 'rifando' o gestor que não rende em seis meses. Costa observa, porém, que há casos em que o resultado é irregular há muito tempo, 24 meses, e a descrença do investidor é justificada. "Mas isso não é a maioria". Ele alerta também que muitos fundos estão captando hoje somente porque tiveram ganho elevado. "É um motivo errado, o investidor continua olhando só para o curto prazo". Há ainda o fato de grandes distribuidores saírem das carteiras, provocando reações em cadeia de outros distribuidores e fortes desequilíbrios, lembra.


No caso dos fundos da Quest Investimentos, do ex-ministro Luiz Carlos Mendonça de Barros, o resultado foi ruim porque as carteiras trabalharam com cenários de longo prazo, explica Walter Maciel Neto, diretor e sócio da Quest. "Com a oscilação muito forte no curto prazo, do Ibovespa, por exemplo, subido 10% em um mês e caindo 10% no outro, a performance acabou sendo ruim". As carteiras sofreram ainda com a alta dos juros no mês de junho por conta da inflação, que teria provocado uma reação exagerada dos mercados, diz Maciel. "Achamos que os juros subiram demais, que há um prêmio nas taxas longas."


Mas mesmo perdendo quase metade do patrimônio em alguns fundos, a situação não preocupa, diz Maciel. "Temos ainda R$ 1,9 bilhão em ativos totais para R$ 350 milhões há dois anos", lembra. Além disso, a Quest está aproveitando para desenvolver uma nova família de fundos, menos volátil, para atrair o investidor quando ele resolver voltar para o risco. Para isso, trouxe de volta Luiz Alberto Marques, que havia trocado a Quest pela GP Investimentos, hoje BRZ. Ele volta com o fundo Iporanga, que passará a ser oferecido por dois bancos para clientes de varejo de alta renda.


Na Mauá Investimentos, que perdeu mais da metade do patrimônio este ano, a estratégia foi reduzir os custos, concentrar o foco e manter a transparência, diz o ex-Banco Central Luiz Fernando Figueiredo. "Falamos com todos os clientes e explicamos que o patrimônio ia diminuir", diz ele. A situação já está melhor, com o fim dos resgates. "Como temos carência de 90 dias, essas saídas que tivemos recentemente se referem ao desempenho do passado." A Mauá cortou em um terço as despesas administrativas, renegociando contratos com fornecedores, e encerrou a área de novos negócios, criada há um ano, o que significou a saída de um sócio e um funcionário. Hoje, com um patrimônio de R$ 800 milhões, a Mauá tem um equilíbrio financeiro mais modesto. "Criamos também uma reserva financeira que é suficiente para manter a empresa por pelos próximos dois anos", diz Figueiredo.


Outro ex-BC que sofreu com a onda de saques foi Ilan Goldfajn, da Ciano Investimentos. A gestora tem hoje cerca de R$ 200 milhões dos R$ 300 milhões que chegou a ter. "Mas isso é normal em momentos em que há uma redução do apetite por risco dos investidores", diz ele, lembrando que, assim como foram, os investidores vão voltar quando a rentabilidade melhorar e os juros caírem. "Foi assim no ano passado, quando os investidores saíram dos DIs para os multimercados", diz.


No caso da Bank of New York Arx, as saídas foram relativamente pequenas e não foram reflexo da rentabilidade, que ficou acima do CDI, explica José Alberto Tovar. "Uma parte é fuga do risco, pois o fundo é volátil, mas R$ 50 milhões foram investidores que saíram para carteiras exclusivas", diz. Já no caso da Neo Investimentos, os resgates acabaram sendo compensados pela captação em outro fundo da casa, o Neo Multiestratégia 30, explica o sócio Wagner Murgel.

quarta-feira, 2 de julho de 2008

Agrenco desencadeia "efeito BDR" na bolsa

Valor Econômico
Por Ana Paula Ragazzi e Graziella Valenti, de São Paulo
02/07/2008


O tombo de 17% dos papéis da Dufry South America na bolsa ontem acendeu a luz amarela para um movimento que já começa a ser chamado de "efeito BDR". Após os problemas com os administradores da Agrenco, os investidores despertaram para os limites de governança dos recibos de ações, os chamados BDRs, usados por companhias brasileiras que quiseram captar na Bovespa, mas preferiram ter sede em paraísos fiscais.


Desde o escândalo da Agrenco, os papéis da Dufry acumulam perda de 22,7% e os da Laep (antiga Parmalat Brasil) caíram 54%. Ambos foram alvo de rebaixamento de recomendação pelo UBS Pactual, que criticou a governança das companhias. Nos dois relatórios, o banco chama a atenção para o fato de serem empresas que não estão listadas no Novo Mercado.


"Deveria estar muito claro, desde o começo, que os BDRs oferecem risco maior aos investidores", destaca Alexandre Di Miceli, professor da Faculdade de Economia e Administração da Universidade de São Paulo (FEA-USP). Entretanto, ele destaca que não se deve associar más práticas de governança à opção por lançamento de BDRs, de forma generalizada.



As companhias com sede no exterior não podem ser listadas no Novo Mercado porque as regras para adesão foram criadas para empresas com sede no Brasil. O regulamento da Bovespa já toma como certo o fato de as companhias estarem submetidas aos compromissos de governança da Lei das Sociedades Anônimas, o que não pode ser exigido das estrangeiras. Portanto, se um dia essas companhias forem organizadas de acordo com sua governança, será necessária a criação de uma nova classificação, específica para BDRs.


"A Bovespa reconhece que tem esse desafio pela frente. Há tempos o tema está sendo discutido, mas ainda não há nenhum projeto concreto sobre o tema", afirma João Batista Fraga, diretor de relações com empresas da Bovespa.


A questão é relevante porque o plano de expansão da bolsa passa pela conquista de novos emissores de BDRs, especialmente, companhias latino-americanas. Atualmente, há nove BDRs na Bovespa. Desses, apenas dois têm atividade realmente fora do Brasil. Os demais são negócios nacionais.


Os problemas com a Agrenco evidenciaram os limites dos BDRs. Apesar de os controladores da empresa terem sido presos pela Polícia Federal, suspeitos de crimes que podem ter prejudicado a empresa e sua imagem, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) não têm poderes de punir esses executivos. De acordo com a Superintendência de Relações com Empresas do regulador, a autarquia pode apenas penalizar o representante legal da empresa estrangeira, responsável pelos deveres da empresa no mercado local. Nem mesmo se houvesse um contrato privado entre a Bovespa e as companhias estrangeiras, nos moldes do Novo Mercado, o regulador teria seus poderes ampliados nesses casos, explicou a superintendência.


No mercado, os comentários são de que os problemas não são exatamente dos BDRs, mas da qualidade da administração. Esse é o ponto que está por trás das recentes decisões do UBS Pactual sobre Laep e Dufry. Ambas as companhias foram levadas à Bovespa pelo banco, que coordenou as ofertas inicias de ações. Agora, a área de análise da instituição aponta que a Laep não cumpriu os compromissos de uso dos recursos captados e a Dufry manteve um empréstimo de US$ 35 milhões cedido à companhia controladora.


Di Miceli não gosta de vincular os BDRs aos problemas de governança. Porém, alertou que deveria ter sido a pergunta número 1 dos investidores porque companhias que atuam Brasil optam por ter sede fora daqui e emitir BDRs. "É preciso avaliar se não eram listagens de fachada." Para ele, se a companhia quisesse uma flexibilidade maior na estrutura de capital, deveria optar por um mercado desenvolvido e reconhecido, como os Estados Unidos, por exemplo.


Os problemas despertados pelo caso Agrenco levaram a Associação de Investidores do Mercado de Capitais (Amec) a decidir avaliar a questão. De acordo com Edison Garcia, superintendente da associação, será formado um grupo técnico para estudar o tema. No entanto, por enquanto, não há uma posição formal sobre as polêmicas que envolvem os BDRs.

Carteiras ligadas à inflação são destaque no semestre

Valor Econômico
Por Danilo Fariello, de São Paulo
02/07/2008


Enquanto praticamente todos os investimentos financeiros sofrem para bater os índices de preços, os fundos que aplicam em títulos de inflação são destaque em rentabilidade. No ano, até sexta-feira, pelo menos três dessas carteiras tiveram retorno acima do Certificado de Depósito Interbancário (CDI), que avançou 5,34%, segundo o site Fortuna. O IPCA deverá fechar o semestre em 3,60%, conforme projeções do mercado, e o IGP-M chegou ao fim de junho acumulando 6,81% no ano. Alguns bancos e gestores oferecem carteiras que seguem esses papéis, principalmente as NTN-Bs, que rendem pelo IPCA e um juro prefixado.


Apesar dos polpudos rendimentos, os investidores devem ter em mente, antes de aplicar, que esses fundos de inflação naturalmente oscilam mais do que os DI. São aplicações destinadas à diversificação dos recursos investidos com visão de retorno no longo prazo, diz Arnaldo Vollet, diretor-executivo da BB DTVM. "O forte retorno recente é sinal de cuidado, porque, se a inflação começar a cair, haverá volatilidade muito grande." A gestora do Banco do Brasil tem R$ 250 milhões investidos nos seus fundos de inflação. A carteira aberta a pessoas físicas subiu 5,56% no semestre. A aplicação mínima é R$ 20 mil. Segundo o site Fortuna, apenas os seis fundos mais populares de inflação captaram R$ 425 milhões no semestre.


Essas carteiras foram febre em 2002, quando a inflação disparou, mas, em pouco tempo, os preços foram contidos e muitos aplicadores saíram das carteiras com prejuízos ou rendimento pífio.


Com a alta dos preços recente, muitos procuram por informações sobre a carteira de inflação, mas a captação não cresce tanto, diz Fabio Guarda, gestor de renda fixa da Unibanco Asset Management (UAM). Para ele, a inflação deve permanecer ainda acima do CDI até o fim do ano, mas o prêmio de renda fixa embutido nos títulos pode levar a uma forte volatilidade e reduzir o ganho. "Recomendamos a carteira como uma proteção apenas no médio e longo prazos."


No longo prazo, a volatilidade perde importância e os papéis ligados a inflação ainda têm ganhos interessantes. Segundo Vollet, da BB DTVM, as NTN-Bs projetam atualmente retorno de 8,8% acima do IPCA para prazos acima de 2010. É um ganho real que salta aos olhos de qualquer investidor. "Mas um ajuste de apenas 0,1 ponto percentual na taxa implica oscilação muito forte no curto prazo."


Não dá para aplicar em um fundo de inflação sem saber exatamente o que se está fazendo, resume Guarda, da UAM. "Ele tem de entender que o retorno vai oscilar conforme a inflação, mas também segundo o cupom (prêmio), que embute a expectativa de inflação pelo mercado." No fundo de índice de preços da UAM, por exemplo, que rende 5,73% no ano, a aplicação mínima do fundo é de R$ 30 mil. Itaú, Legg Mason, Pactual e Credit Suisse Hedging Griffo, têm carteiras de inflação.


A maioria deles segue unicamente o IPCA, porque praticamente desapareceram do mercado títulos que seguem o IGP-M, as NTN-C. Isso porque o governo federal deixou de emitir esses papéis. Portanto, ficou mais difícil para gestores seguirem o indicador de perto.
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