quinta-feira, 14 de maio de 2009

Equilíbrio entre fundos e caderneta

Valor Econômico
14/05/2009


Tributação da poupança e redução das alíquotas de outras aplicações buscam evitar fuga de recursos
Por Alex Ribeiro e Arnaldo Galvão, de Brasília



O juro pago nas cadernetas de poupança com saldo superior a R$ 50 mil passará a pagar Imposto de Renda (IR) a partir do ano que vem. Aplicações com saldo até R$ 50 mil continuam isentas. Acima, pagam ou não o tributo, dependendo tanto da situação de cada depositante quanto das reduções que o Banco Central (BC) fizer na taxa Selic. Também está em discussão dentro do governo a redução temporária, até o fim deste ano, do IR incidente sobre renda fixa. O cenário mais provável é que as alíquotas, que hoje chegam a 22,5% do rendimento, sejam limitadas a um teto de 15%.

A mudança na tributação das aplicações financeiras foi a forma encontrada pelo governo para permitir que o BC continue cortando os juros. Desde janeiro, a Selic caiu de 13,75% para 10,25% ao ano, o que tornou a remuneração de investimentos de renda fixa (como fundos, CDBs e Tesouro Direto) menos competitiva em relação à caderneta, o que poderia provocar uma migração maciça de recursos.

O reequilíbrio das aplicações será feito em duas etapas. Em 2009, o governo deverá cortar o IR das aplicações de renda fixa, aumentando sua remuneração líquida comparativamente à poupança. No ano que vem, as alíquotas voltariam a subir, e o governo passará a taxar o juro da caderneta, de 0,5% ao mês. A variação da Taxa Referencial (TR) não terá imposto.

Ainda não está definido quando e quanto o IR de renda fixa vai baixar. O secretário do Ministério da Fazenda, Bernard Appy, disse que o governo vai primeiro esperar o corte da Selic decidida pelo Comitê de Política Monetária (Copom) na sua próxima reunião, em junho. Conhecida a nova taxa Selic, a Fazenda irá avaliar o impacto no setor de fundos. O cenário mais provável, disse, é que seja estabelecida uma alíquota máxima de 15%. Hoje, aplicações de até seis meses pagam 22,5%. Appy disse que o governo poderá reduzir a alíquota abaixo de 15% se for necessário para o BC cortar mais a taxa Selic.

Em 2010, a caderneta de poupança passa a pagar IR. Diferentemente do imposto sobre renda fixa, cobrado exclusivamente na fonte, a tributação da caderneta será feita na declaração anual. Apenas para grandes aplicadores, com saldos acima de R$ 349 mil, haverá retenção na fonte e, na declaração do ano seguinte, será feito o ajuste, como é feito hoje com salários e aluguéis no chamado carnê-leão.

A Selic será uma espécie de gatilho que aciona a cobrança de IR sobre o juro da caderneta. Quando a Selic cai abaixo de 10,5% ao ano (hoje está em 10,25%), começa a cobrança de IR. E, quando menor a taxa Selic, maior será o tributo. A tributação máxima acontece quando a Selic chega a 7% ao ano.

A outra variável é a situação do investidor na declaração anual de ajuste do IR. Paga mais quem já se enquadra na alíquota máxima da tabela de IR, hoje de 27,5%. Paga menos quem hoje é isento ou está nas faixas de renda menores, que vão de 7,5% até 22,5%.

No caso extremo, a nova tributação pode "comer" 1,73 ponto percentual do rendimento de um grande aplicador. Isso se a Selic cair para 7% ao ano e se o contribuinte recolha IR na declaração anual com alíquota de 27,5%. Nesse exemplo, apresentado pela Fazenda, o grande investidor vai receber um rendimento líquido de 4,5% ao ano na caderneta na parcela que exceder R$ 50 mil, abaixo dos 6,17% ao ano que receberá alguém que aplica até R$ 50 mil. Quanto maior a Selic, menor a diferença de ganho líquido entre o pequeno e o grande poupador.

A regra isenta investidores que vivem da poupança, até determinado valor. Por exemplo: se a Selic cair a 8,5%, alguém que não tenha nenhum outro rendimento que não a remuneração da poupança ficará isento de IR caso tenha um saldo de até R$ 986 mil. Assumindo a mesma Selic de 8,5% ao ano, alguém com renda mensal até R$ 1.000,00 fica isento de IR na poupança se tiver até R$ 486 mil.

Cerca de 99% das contas de poupança, que englobam os titulares de 89 milhões de cadernetas, estarão isentos. Há um universo de titulares de 895 mil contas de poupança que vão ter que checar a sua situação individual para ver se devem ou não pagar impostos a partir da vigência das novas regras.

A tributação passa a valer, na prática, em fevereiro. A taxa Selic que servirá de gatilho é a dos últimos dias de dezembro. Hoje, os analistas econômicos apostam que a Selic termine o ano em 9,25% ao ano. Se esse cenário se confirmar, aplicações feitas em janeiro, com rendimento depositado em fevereiro, pagarão o imposto.

Ao fazer suas contas, o contribuinte deverá, primeiro, apurar a chamada base de cálculo do IR. Do rendimento recebido no mês, abate-se R$ 250, que é a chamada faixa de isenção. Isso significa que, na prática, quem tem R$ 50 mil na caderneta, e recebe R$ 250 de rendimentos mensais, não vai pagar imposto nenhum.

A parcela que excede R$ 250 vai compor a chamada base de cálculo bruto. Exemplo: alguém que tem R$ 150 mil e recebe rendimento mensal de R$ 750 mensais vai chegar a uma base de cálculo de R$ 500, depois de abatidos R$ 250 referentes á faixa de isenção.

Sobre a base de calculo bruto, há outra dedução pelo chamado redutor. Aplicado esse redutor, chega-se ao rendimento tributável, que vai ser levado á declaração anual. Se a Selic dois meses antes do recebimento do ganho da poupança estiver em 10,5% ao ano, o redutor será de 100%. Ou seja, não sobra rendimento a ser tributável na declaração anual. Se a Selic estiver, por exemplo, em 8,75% ao ano, o redutor é de 80%. Ou seja, dos R$ 500 apurados no exemplo acima, sobram apenas R$ 100 para serem levados à declaração anual. No extremo, se a Selic, cair a 7,25%, o redutor é zero e não há abatimento nenhum na apuração do rendimento tributável. No exemplo, o investidor leva uma renda de R$ 500 para a sua declaração anual de ajuste.

O fato de haver rendimento tributável, porém, não significa que o investidor vá pagar imposto. Alguém que, na declaração anual, é isento, pode não pagar imposto. Quem é tributado na faixa de 27,5% seguramente vai pagar IR sobre a poupança.

Poupança: IR vale só sobre o que passar de R$ 50 mil

Jornal da Tarde
14/05/2009


Medida passa a valer na virada do ano, e , segundo o governo, vai atingir apenas 1% dos aplicadores. A grande maioria tem saldo baixo. Quem tem a caderneta como única fonte de renda terá um tratamento diferente na tributação

Fabrício de Castro, fabricio.castro@grupoestado.com.br

Quem possui mais de R$ 50 mil aplicados na caderneta de poupança passará a pagar Imposto de Renda (IR) a partir de janeiro de 2010. Os lucros da aplicação, que atualmente são isentos, serão tributados mensalmente e o peso do imposto dependerá do nível da taxa básica de juros da economia - quanto menor a Selic, maior o imposto.

As mudanças foram anunciadas ontem em Brasília pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega, e pelo presidente do Banco Central, Henrique Meireles. Na avaliação do governo, a queda da Selic nos últimos meses tornou a poupança mais atrativa que os fundos de renda fixa. Para evitar que grandes investidores transferissem recursos dos fundos para a caderneta, o governo decidiu cobrar IR em aplicações superiores a R$ 50 mil.

Mantega destacou, no entanto, que uma parcela reduzida dos aplicadores será afetada. “Noventa e nove por cento das cadernetas são de aplicações de até R$ 50 mil”, disse.

Para o 1% restante, haverá cobrança de IR sobre a parcela do saldo que superar o limite fixado. Ainda assim, de acordo com o ministro, o peso do imposto será pequeno para quem mantém poucos recursos acima dos R$ 50 mil. “A taxação será sobre quanto rende, sobre os trocadinhos”, comentou Mantega.

Se a Selic se mantiver no patamar atual de 10,25% ao ano, por exemplo, uma aplicação de R$ 60 mil pagará R$ 10 por mês de IR. Para um saldo de R$ 200 mil, o imposto salta para R$ 150. O impacto do IR passa a ser maior na medida em que a Selic vai diminuindo.

Segundo o ministério da Fazenda, o imposto será cobrado na fonte, mas o desconto só ocorrerá todo mês, no momento de aniversário da poupança, para saldos muito altos - já que será considerada a tabela de isenção do imposto de renda, que deve ficar em R$ 1.499,15 por mês em 2010.

No caso da Selic ficar em 10% ao ano, por exemplo, haverá recolhimento na fonte para saldos da poupança superiores a R$ 1,55 milhão. Nos demais casos, a tributação ocorre na declaração de Imposto de Renda de Pessoa Física (IRPF).

Já a fórmula de cálculo do rendimento da poupança - hoje fixada em 0,5% ao mês mais a taxa referencial (TR) - não sofrerá alterações. “O governo está correto”, aprova o economista Otto Nogami, do Insper Instituto de Ensino e Pesquisa. “Ele não mexeu nas regras do jogo, apenas passou a cobrar imposto de renda.”

A professora Marcela Galeno, da Fundação Instituto de Administração, afirma ainda que, ao cobrar o imposto, o governo evitou a mudança nas regras de remuneração da poupança. “Isso exigiria a aprovação de uma lei no Congresso”, diz.

Segundo ela, a tributação vai atingir principalmente as classes mais altas. “É mais um imposto, não há dúvidas, mas 99% das pessoas possuem saldo inferior a R$ 50 mil.”

O governo informou ainda que pessoas que possuem a caderneta de poupança como única fonte de renda - e não recebem salários, por exemplo - pagarão impostos menores, de acordo com o saldo acumulado. Além disso, serão consideradas todas as contas de poupança de um mesmo titular para cálculo da tributação. Quem possui várias contas, em diferentes bancos, terá os saldos somados.



DÚVIDAS

Por que o governo vai cobrar Imposto de Renda (IR) da poupança?

A medida serve para evitar que os recursos aplicados em fundos de renda fixa migrem para a caderneta de poupança. Vale lembrar que ela só começa a valer em 2010, e se a taxa básica de juros da economia (Selic) estiver abaixo de 10,50% ao ano. Hoje, ela está em 10,25%.

E qual é o problema dessa migração?

Os recursos aplicados em fundos de renda fixa são estratégicos para o governo. Eles são reaplicados em Certificados de Depósitos Bancários (CDBs) de bancos, por exemplo, o que serve para capitalizar essas instituições. Além disso, a maior parte do dinheiro de fundos de renda fixa é reaplicada em títulos da dívida pública do governo. Na prática, os fundos ajudam a financiar as dívidas do governo.

Por que apenas as poupanças acima de R$ 50 mil serão tributadas?

Com essa medida, o governo busca atingir principalmente os grandes investidores. Dados de dezembro mostram que apenas 1% das contas da poupança possuem mais de R$ 50 mil de saldo.

Nada vai mudar na vida do pequeno poupador?

Absolutamente, nada. Se você tem menos de R$ 50 mil aplicados na poupança, continua isento de imposto. E se possui R$ 60 mil, por exemplo, pagará IR apenas sobre o excedente (R$ 10 mil)

O governo vai confiscar a poupança?

Não. O pequeno investidor pode ficar tranquilo quanto a isso. No início da década de 1990, quando o governo Collor confiscou a poupança, havia a necessidade de reduzir o volume de recursos (dinheiro) circulando no mercado. A situação atual é diferente. O governo está tributando a poupança para não desequilibrar o sistema de fundos de investimento

Tenho R$ 60 mil aplicados na poupança. Devo mudar para um fundo de renda fixa?

Provavelmente, não. Os fundos de renda fixa, além de terem a cobrança do IR e do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), cobram taxas de administração. Hoje, boa parte das taxas são superiores a 2% ao ano, o que torna a caderneta de poupança, mesmo com as mudanças, mais interessantes.

Quando os fundos passam a ser mais rentáveis?

Para descobrir, é preciso pesquisar as taxas oferecidas pelos bancos e fazer as contas. Investidores com mais de R$ 100 mil para aplicar normalmente têm acesso a taxas menores, o que torna a aplicação interessante.
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