sexta-feira, 4 de junho de 2010

Bolsa vai muito além do Ibovespa

Valor Econômico

04/06/2010

Alessandra Bellotto, de São Paulo

O investidor que tentou replicar o Ibovespa, principal índice da bolsa, ao longo do ano amargou perdas maiores do aquele que buscou opções nas carteiras setoriais de consumo e imobiliário. Nos primeiros cinco meses de 2010, o Ibovespa recuou 6,64%, enquanto o Icon cedeu 1,38% e o Imob teve perda de 1,54%. Já aquele que optou pelo índice de telecom (Itel) está sorrindo à toa. A carteira é a única com valorização em 2010, de 9,14% até o mês passado.

Mais antigo índice da bolsa, o Ibovespa é também o de maior popularidade. A seleção das ações é feita com base no volume negociado e, por isso, dá uma ideia da movimentação do mercado, explica o pesquisador do Instituto Assaf Fabiano Guasti Lima. Ele lembra, porém, que são vários os índices calculados pela bolsa, que medem o desempenho de grupos de empresas com características comuns.

Em 2009, ano de ouro para o mercado de ações, índices como o de small caps (com ações de baixa liquidez) e o imobiliário foram muito melhores do que o Ibovespa. Segundo levantamento do Instituto Assaf, enquanto os dois primeiros subiram 137,53% e 205,03%, respectivamente, o Ibovespa teve alta de 82,66% mo período. "Essa diferença é um alerta para o investidor olhar para outros índices além do Ibovespa", afirma.

Ao montar uma carteira, Lima diz que o investidor deve buscar papéis que tenham correlações negativas, ou seja, andem em direções opostas. Segundo exemplifica o pesquisador, papéis de maior peso no Ibovespa, Vale e Petrobras tendem a seguir o mesmo rumo, apesar de estarem em setores diferentes. Um portfólio formado por esses papéis tem de ter também ações que, historicamente, tenham se movimentado num padrão diferente. Papéis como os da AmBev, por exemplo, são reconhecidos como mais defensivos, pois oscilam menos do que o índice.

Além disso, Lima destaca que, dependendo do momento econômico, os diversos setores podem ter desempenhos melhores ou piores. Hoje, dado o forte nível de atividade econômica do país, papéis de empresas ligadas ao mercado local podem oferecer retornos maiores.

As informações sobre os índices, como variação, volatilidade e dividendos pagos pelas empresas, estão no site da bolsa. O pesquisador reconhece que é difícil para o pequeno investidor replicar os índices de mercado, mas ele recomenda garimpar ações em outras carteiras.

terça-feira, 1 de junho de 2010

Bovespa cria novas regras para agentes autônomos

Autorregulação: Corretoras terão que gravar ordens de clientes aos agentes para tentar reduzir número de reclamações de investidor e bolsa publicará inquéritos.

Valor Econômico

Por Tatiana Bautzer, de São Paulo
01/06/2010

O aumento das reclamações de investidores sobre operações feitas por agentes autônomos levou a BM&F Bovespa a apertar os critérios para atuação desses independentes junto às corretoras. Os agentes autônomos lideraram no ano passado o ranking de reclamações de investidores junto à BM&F Bovespa Supervisão de Mercado (BSM), órgão de autorregulação que sucedeu o antigo fundo de garantia da Bovespa.

No ano passado, das 134 reclamações feitas ao Mecanismo de Ressarcimento de Prejuízos (MRP) da bolsa, 40 referiam-se a problemas com agentes autônomos. "Em 2010 devemos ter um número parecido de reclamações e a proporção dos autônomos continua a mesma", afirma o diretor da BSM, Luís Gustavo da Matta Machado, ex-diretor do Banco Central que assumiu a BSM no ano passado. O MRP sucedeu o antigo Fundo de Garantia da Bovespa.

 

 

O Programa de Qualificação Operacional (PQO) das corretoras da bolsa criou uma exigência no início do ano de que todas as comunicações dos agentes autônomos sejam gravadas, como já ocorre hoje nas mesas de operação dentro das instituições. "A corretora deve adotar os mesmos procedimentos de segurança que adotaria com seus operadores. Os regulamentos estão deixando mais clara a responsabilidade das instituições sobre os autônomos", diz Matta Machado.

As corretoras terão até 30 de junho para cumprir a determinação. A bolsa fará auditorias até o fim do ano para assegurar o cumprimento. "Nos inquéritos abertos para apurar problemas com autônomos, verificamos que as instituições procuram escapar à responsabilidade sobre as condutas dos autônomos", explica Machado. "As regras visam deixar esta responsabilidade clara", complementa.

Os regulamentos da BM&F Bovespa somam-se à nova instrução em elaboração pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM), que exigirá que o autônomo opere com uma única corretora e que haja um controle sobre o padrão das operações de seus clientes. O uso da mesma estratégia por vários clientes do autônomo indica que ele está administrando carteiras, atividade proibida aos agentes. Os autônomos podem apenas intermediar operações de compra e venda, mas não recomendar investimentos ou administrar recursos.

O número de reclamações de investidores vem crescendo desde 2008, com os prejuízos causados pela crise financeira internacional e a maior presença do investidor de varejo no mercado. Matta Machado diz que é natural o aumento do número de reclamações quando as bolsas estão em baixa e os investidores tentam recuperar perdas no MRP.

Num processo semelhante ao da CVM, as reclamações ao MRP dão origem a processos. Dificilmente, entretanto, os investidores apresentam provas suficientes que resultem em ressarcimento pela bolsa. "Muitos dizem que são investidores conservadores e foram levados a aplicar em termo ou opções. A gente verifica o histórico de operações e vê que isso não é verdade", conta o diretor da BSM.

Outras grandes razões de reclamação dos investidores no ano passado foram problemas em operações de homebroker e erros de operadores.

A bolsa também prepara maior publicidade para os inquéritos derivados de reclamações de investidores, como faz a CVM com os julgamentos de processos administrativos. O processo de digitalização está terminando e nas próximas semanas o extrato dos julgamentos, com relatório dos inquéritos e votos do conselho da BSM, serão publicados na página da BM&F Bovespa na internet. Hoje a BSM divulga apenas pequenos resumos dos processos administrativos originados de auditorias do próprio órgão de autorregulação a partir da supervisão de mercado, mas não os resultados de processos iniciados por reclamação dos investidores. Quase sempre os processos originados de auditorias internas referem-se a tentativas de manipulação de mercado. Como na CVM, a Bovespa também fecha com os acusados termos de compromisso para encerramento dos processos. No ano passado, de 30 casos, dois foram julgados e 28 encerrados por termos de compromisso, com o pagamento de R$ 2,17 milhões pelos acusados.

Subir ou descer do carrossel, eis a questão

Motivação e desempenho: Outras explicações, além das pecuniárias, fazem casos de sucesso ou de fracasso.

Valor Econômico

01/06/2010

Por João Carlos de Oliveira, para o Valor, de São Paulo
01/06/2010

"Economia da Identidade"

George Akerlof e Rachel E. Kranton. Trad. de Afonso Celso C. Serra. Campus/Elsevier. 216 págs., R$ 62,00

Preconceitos, cultura empresarial, movimento feminista, tabagismo, educação e racismo. Todos esses temas são tratados neste livro à luz das circunstâncias em que as pessoas tomam decisões e fazem suas escolhas. Seu feitio é o de uma introdução de conceitos (até porque não se aprofunda em nenhum tema), dividida em quatro partes: economia e identidade; trabalho e escola; gênero e raça; e uma proposta de nova abordagem para a economia.

Os autores acreditam que a economia não deve estudar apenas as motivações pecuniárias, como desejos de consumo e de renda. Todas as motivações, inclusive as não pecuniárias, como ter filhos, buscar equidade, retribuição ou status, são seus objetos. O detalhe é que esses gostos e preferências de ter ou não ter filhos, por exemplo, não devem ser entendidos como meras características individuais ou idiossincrasias. Afinal, as normas fixadas sobre como se comportar são função de quem interage com quem e em que contexto social.

Akerlof e Kranton tomam emprestada a figura de um carrossel, usada pelo sociólogo Erving Goffman, para ilustrar o que pensam. Goffman observou o comportamento de crianças de diferentes idades diante do brinquedo. Para as menores, até quatro anos, andar em cima de um cavalo no carrossel é um feito de coragem; para as maiores, não, tanto que, normalmente, buscam aumentar a sensação de "perigo" andando em pé no brinquedo, pulando dele em movimento - isso, se simplesmente não se recusam a subir. Em resumo, os menores demonstram sua alegria quando o que fazem está de acordo com as convenções e normas; já os maiores demonstram o seu desconforto e reagem de acordo com ele.

Esse entendimento das relações entre identidade, norma e categoria social varia ao longo do tempo e das diferentes culturas e estruturas sociais. Um exemplo: o tabagismo. Até a década de 1960, fumar era mais aceitável para homens do que para mulheres. A diferença de atitudes começou a terminar na década seguinte. Uma marca de cigarros, o Virginia Slims, usou o seguinte slogan: "Você já foi longe, querida!", fazendo o feminismo significar tanto a libertação do tanque de lavar roupas como o fim da "proibição" social de fumar. A abordagem tradicional da economia, que apenas pesquisaria a distribuição de renda na sociedade com a entrada das mulheres no mercado de trabalho, não conseguiria, afirmam os autores, explicar esse fenômeno.

Além do tabagismo - hoje, socialmente condenado -, a mesma abordagem é utilizada para analisar os mais diversos temas: das escolas à divisão do trabalho doméstico, dos ambientes militares ao racismo, passando pelo mundo corporativo. Em todos os casos, a busca é do que pode determinar determinada realidade de sucesso ou de fracasso.

No caso das empresas, uma pergunta relevante é como motivar funcionários para que ela tenha uma trajetória bem-sucedida. Hoje, a maioria atrela o pagamento de bônus ao desempenho. Parece lógico e eficaz. Assim, se a remuneração do principal executivo se baseia em opções para a compra de ações, maior será o incentivo para maximizar o preço das ações. Se os preços subirem é sinal de que o mercado sancionou uma expectativa favorável para o desempenho daquela empresa, e o executivo deve ser premiado. Será? Akerlof e Kranton não acreditam nisso. Eles lembram que há duas maneiras de se conseguir esse efeito (subir os preços das ações): aumentar mesmo o valor da empresa ou manipular os livros com criatividade.

"Evidências recentes mostram que os executivos compreenderam e adotaram a segunda hipótese", afirmam. É que, segundo eles, quando as únicas recompensas e objetivos são estritamente monetários e econômicos, os executivos vão sempre manipular o sistema até o ponto em que puderem garantir a própria impunidade e o lucro.

Isso não acontece só no alto escalão. É raro que as empresas montem seus programas de incentivo com base, por exemplo, no número de peças produzidas. É que, nesse caso, os trabalhadores tendem a manipular o tempo de fabricação, por recear que, se terminarem rapidamente o trabalho, a empresa considerará a tarefa fácil e reduzirá a remuneração por unidade de produção.

Akerlof e Kranton recomendam uma forma de quebrar esse ciclo de conflitos de interesse: criar comprometimento, identidade. Isto é, na medida em que os trabalhadores se identificam com os objetivos das organizações, desaparece o conflito de interesses.

Nas empresas ou em qualquer outra organização social, como escolas, é possível ter pessoas que aceitam e se identificam com a cultura dominante, os "insiders", e as que não conseguem agir de acordo com essa cultura, os "outsiders". Para os autores, o segredo do sucesso é fazer com que mais trabalhadores se vejam como "insiders". Se isso ocorrer, a companhia poderá obter alto esforço dos funcionários com diferenciais de remuneração mais baixa.

Identidade, nesse caso, significa mais do que alinhamento. Significa compartilhar bandeiras e causas. Significa que as pessoas vão se mobilizar, querer trabalhar em uma companhia, estudar numa determinada escola ou mesmo comprar um determinado produto para, assim, realizar um ideal.

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