segunda-feira, 13 de agosto de 2007

A ambição desmedida pode colocá-lo em maus lençóis

Valor Econômico de 13/08/2007

Mara Luquet

A crise financeira que sacode o mercado se intensificou na semana passada e muitos gestores se preparam para dias ainda piores pela frente. No entanto, é mais uma crise financeira, como outras que ocorreram no passado. É certo que já começa a provocar destruição de riqueza e uma contração na liquidez internacional e mostra para investidores o quanto é importante ter uma diversificação da carteira para enfrentar momentos como este com maior tranqüilidade. Porque crises sempre vão existir.
No entanto, o grande perigo para suas aplicações não é a crise, mas a ganância. Contra a ganância só há um remédio, a racionalidade. Prepare-se porque a ambição desmedida de alguns e a sua própria vontade de ganhar muito dinheiro fácil e rápido poderá colocá-lo em maus lençóis.
O cliente de um banco foi consultar-se com o gerente sobre a melhor aplicação para seu dinheiro. Ouviu do interlocutor que ele próprio descobrira um investimento espetacular com um amigo do amigo que multiplica os ganhos em questão de semanas. Uma beleza. O produto não estava na prateleira do banco, era o tal amigo que oferecia. Esqueceu-se de dizer, porém, que o risco era igualmente alto. O resultado, já previsível para aqueles que mantêm os olhos fechados a este tipo de oferta mirabolante, foi um prejuízo na hora em que efetivamente precisou resgatar o dinheiro.
Esbarrar com esses "consultores" de investimento vai se tornar mais freqüente. Eles sempre estiveram à espreita. No entanto, a quantidade de pessoas dispostas a ouvi-los e, pior, colocar o dinheiro em suas mãos, aumenta a cada dia. Isso porque a taxa de juro está em queda e, desesperados, alguns investidores estão atrás de alguém que lhes entregue a renda mensal de 1%.
Ocorre que não tem mágica. O governo entregou taxas de juro altas nos últimos anos porque precisava se financiar e, como não estava com a casa em ordem, os investidores pediam taxas maiores para emprestar o dinheiro. Ou seja, o próprio governo no passado embutia um risco maior do que hoje e, por isso, se prontificava a pagar taxas de juro mais altas a quem lhe emprestasse os recursos.
Hoje os fundamentos macroeconômicos brasileiro estão em melhores, resultado de um trabalho de mais de uma década e, com isso, as taxas estão em queda. O risco-Brasil caiu, os investidores confiam mais no governo brasileiro e aceitam uma taxa menor para emprestar os recursos.
A taxa de juro tende a cair ainda mais nos próximos meses e para ter retornos maiores o investidor terá de buscar aplicações de maior risco. Mas espere um pouco. Tomar risco não significa sair por aí como um tresloucado entregando seu dinheiro ao primeiro que aparecer com ofertas mirabolantes.
Recomendação número 1: antes de aceitar qualquer oferta de investimento certifique-se com a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) se quem está vendendo o produto pode, de fato, fazer esse trabalho. Se ele não estiver credenciado, avise a instituição porque assim você estará contribuindo para restringir a atuação dessas pessoas e evitando que alguns mais incautos caiam nessas armadilhas. Recomendação 2: nunca esqueça a recomendação número 1.
A CVM é quem regula e fiscaliza o mercado de capitais. Nunca compre qualquer produto que não esteja autorizado pela CVM por mais que seus olhos cresçam com os retornos projetados por essas aplicações. A segurança institucional do mercado de capitais brasileiro avançou muito nos últimos anos. A CVM vem fazendo um trabalho espetacular nesta área e é um órgão no qual os tentáculos políticos ainda não conseguiram alcançar, embora o esforço tenha sido grande.
A presidência do órgão acaba de passar para as mãos de Maria Helena Santana, um nome reconhecido no mercado por competência e integridade. A sucessão de Marcelo Trindade foi, portanto, uma escolha técnica. Assim como o próprio Trindade, que sucedeu Luiz Cantidiano, primeiro presidente da CVM a ter mandato fixo. Cantidiano, advogado experiente na área de direitos de minoritários, negociou ajuda do Banco Mundial para equipar a instituição, fez contratação de pessoal, mas não completou seu mandato que atravessou a troca do governo FHC para o governo Lula e sofreu uma forte pressão para abandonar o posto.
Havia expectativas de quem o sucederia, mas a nomeação de Trindade mostrou uma continuação. Afinado com as idéias de seu antecessor, Trindade tornou a comissão mais ágil e menos burocrática. Na semana passada, numa entrevista à jornalista Catherine Vieira, do Valor, Maria Helena disse que a fiscalização, com foco em punições mais ágeis continua sendo prioridade para a autarquia e anunciou que criará uma superintendência especialmente para cuidar dos processos. Ou seja, é mais do mesmo e isso é muito bom para os investidores brasileiros.


Mara Luquet é editora da revista ValorInveste e autora do livro O Assunto é Dinheiro, escrito em parceria com o jornalista Carlos Alberto Sardenberg

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