terça-feira, 25 de setembro de 2007

Histórias de investidor

Valor Econômico
Por Angelo Pavini
25/09/2007



Todos os dias, a numeróloga Simone Limase, consultora da área de recursos humanos, ajuda as empresas a identificar entre vários candidatos aquele que melhor se enquadra em determinada vaga. Para isso, cruza dados como nome e data de nascimento para criar um mapa com 14 números que mostram em que áreas a pessoa tem potencial.


Simone usa a numerologia também para orientar seus recentes investimentos em bolsa. No ano passado, procurando informações sobre o mercado, ela ganhou R$ 1 mil em ações da Vale do Rio Doce numa palestra da empresa durante a Expo Money. "As ações subiram bastante, tenho quase o dobro agora e estou estudando para me atualizar e investir mais a partir de outubro", diz ela, animada.


Simone é um exemplo do exército de novos investidores que aflui para o mercado acionário. Só neste ano, são 53 mil estreantes, que ampliaram para 131 mil o total de usuários do sistema home broker, segundo dados da Bovespa. A maioria está ainda descobrindo o funcionamento da bolsa e procura, ávida, por informações e orientação. Do total, 19 mil ingressaram no sistema em julho, às vésperas da crise do "subprime", o mercado de hipotecas de alto risco americanas, e que fez a bolsa cair quase 10% no dia 16 de agosto. Mas a surpresa positiva é que a maioria não saiu vendendo o pouco de ações que tinha, o que permitiu recuperar as perdas até a semana passada.


A espera de Simone para comprar ações tem sua razão cósmica de ser. Segundo ela, desde seu último aniversário, em outubro, ela está no ano pessoal do balanço, que ocorre a cada nove anos, e que termina quando ela soprar as velinhas novamente este ano. Nesse período, explica, não é bom fazer negócios de longo prazo. "É um período de se livrar do que não serve mais", diz. O ano anterior, o ano pessoal 8, é o da conquista material, explica, quando é provável que a pessoa ganhe coisas, como ocorreu com ela. A partir de 9 de outubro, quando ela entrar novamente no ano 1, começa o perído de avanço material novamente. Ou seja, hora de comprar ações.


Mas manter o sangue-frio durante uma crise nem sempre é possível, como explica Vanilson Mota, funcionário da área operacional da Petrobras em Cubatão. Investidor em ações há oito anos, inicialmente em fundos e depois, a partir de 2003, diretamente em bolsa, achava que estava preparado para tudo. Mota havia comprado papéis da Telesp fixa em 14 de agosto, dois dias antes da grande queda do mercado. "Fui olhar como estava a bolsa no dia 16 e peguei o pior momento, quando a queda do índice estava em quase 10%, e me apavorei", diz. Sem entender direito o que acontecia, ele vendeu os papéis da Telesp no auge do pânico dos mercados. Resultado: o papel se recuperou e ele perdeu dinheiro. A lição que tirou foi que não é fácil pensar racionalmente quando o mercado despenca.


Mota recuperou o controle a tempo, porém, de aproveitar a queda dos papéis e, dois dias depois, comprou ações da Gerdau e da Porto Seguro. Ele se considera um investidor moderado, mantendo um limite de 45% das economias em ações. "Tenho amigos que aplicam 100% em bolsa, o que acho muito arriscado", diz ele, que usa tanto a análise fundamentalista quanto gráfica para decidir onde aplicar. Da parcela de ações, Mota separa metade para papéis com visão de mais longo prazo e característica de boas pagadoras de dividendos, como CPFL, Cemig e Telesp fixa. "Algumas pagam quase 10% de dividendo ao ano, assim, mesmo que o preço do papel caia, tenho um retorno extra, para minha aposentadoria", diz.


Da outra metade, 20% ficam em um fundo de ações da Geração Futuro e os 80% restantes em ações com visão de curto prazo. "Acompanho diariamente a média de preços de cerca de 20 papéis e compro os que caíram demais para vender assim que eles se recuperaram", diz. Hoje ele tem 15 ações nessa carteira e trabalha com duas corretoras, uma com corretagem fixa, a Ágora, e outra variável, a Bradesco. "Dependendo do valor da operação, trabalho com uma para reduzir o custo", diz.


A experiência acaba ajudando investidores não só a atravessarem essas fases críticas como reduzir as perdas usando instrumentos de proteção (hedge). Um exemplo é o pequeno empresário William de Oliveira, dono de uma empresa de logística e entregas. Depois de perder dinheiro em maio do ano passado, na crise da alta dos juros americanos, e em fevereiro deste com a balançada da bolsa chinesa, ele buscou formas de se proteger com operações no mercado futuro. "Não acho que a turbulência acabou, deve vir uma segunda paulada por aí", diz ele, que prefere ser chamado de Dr. Fox, apelido que usa em seu blog, o www.drfox-investidor.blogspot.com.


Oliveira, ou melhor, Dr. Fox, diz que infelizmente o mercado brasileiro não tem muitas opções de proteção para quem investe em bolsa. "O ideal era termos opções de venda, como nos Estados Unidos, mas temos apenas opções de compra (onde o investidor se compromete a vender determinada ação a determinado preço no futuro)". Assim, ele resolveu usar os minicontratos futuros de Ibovespa na BM&F. "Eles não exigem muita margem e são mais baratos do que alugar e vender uma ação", diz. Ele fez o hedge vendendo o Ibovespa quando o índice estava em 54.800 pontos, perdeu enquanto a bolsa subia, mas evitou prejuízos maiores na grande turbulência de agosto. "E não desfiz a proteção, o mercado está muito volátil."


Formado em física pela USP e mestre pela Escola de Administração de Empresas da FGV-SP, Dr. Fox é um seguidor de tendências ou "trend follower". Ele tenta detectar nos gráficos de preços para onde está indo determinada ação a partir do comportamento passado. Antes investidor em CDBs, Dr. Fox começou comprando ações da Petrobras, Bradesco e BCN em 1999, mas, com a correria da empresa, sobrava pouco tempo para o mercado. Ele só voltou a operar há três anos, quando descobriu o home broker, que facilitou o acompanhamento do mercado e as negociações. Hoje ele opera com quatro corretoras.


Apesar do gosto pelo mercado, ele não opera todos os dias. "No máximo faço uma operação por mês, pois quem faz muito negócio só dá lucro para a corretora", diz. As crises ensinaram-no a deixar sempre uma parcela do dinheiro livre para aplicar. "Nessa última queda, eu tinha 20% em caixa para as oportunidades", diz. Ele também evita resgatar mais de R$ 20 mil em ações por mês, para não pagar imposto de renda.


Dr. Fox é um fã da Vale, que ocupa lugar de destaque na carteira ao lado de outras blue chips como Acesita e Bradesco. Nas "small caps", ele tem BR Malls e Randon. Ele diz que não dá bola para relatórios de corretoras e prefere olhar os gráficos para decidir onde aplicar. Quando encontra a empresa que gosta, faz tudo para conhecê-la bem. "Encho o saco do RI até ele pedir socorro, vou nas reuniões com investidores, assembléias, visito a fábrica, estudo balanço, mando fax, e-mail, até me convencer que a empresa é mesmo boa", diz. "Sou o investidor pentelho, quero sentir o cheiro da empresa, se eles sentem que a empresa está crescendo", afirma ele. Só neste ano, oito empresas receberam a visita de Dr. Fox em suas reuniões.


Oliveira e seu personagem financeiro fizeram tanto sucesso nos blogs e fóruns de discussão que ele foi chamado para dar uma palestra este ano na Expo Money. Para quem for, ele deverá passar um cenário nada otimista. "Espero uma correção grande este mês ou no outro, os gráficos mostram que podemos ter uma queda do Ibovespa até os 42 mil pontos ou até menos, 35 mil", diz.

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