quinta-feira, 23 de agosto de 2007

Hora das barganhas

Valor Econômico 23/08/2007

Por Adriana Cotias e Daniele Camba


A recuperação esboçada pelo Ibovespa nos últimos dias pode ser até temporária diante das indefinições no quadro externo, mas analistas e investidores já procuram as ofertas de ocasião. Não chega a ser uma temporada de liquidações, pois a percepção é de que os problemas originados nas hipotecas americanas de alto risco ainda podem produzir estragos, o que significa que o investidor não deve ir com muita sede ao pote. Mas, de meados de julho para cá - quando a crise se agravou a ponto de engessar o crédito corporativo e desencadear uma atuação coordenada dos bancos centrais dos Estados Unidos, Europa e Japão -, alguns papéis caíram demais, sem que houvesse mudanças significativas em seus fundamentos.


Nesse intervalo, ações como as preferenciais (PN, sem direito a voto) da Gerdau (-13,51%) e da Gerdau Metalúrgica (-13,90%) ou as as ordinárias (ON, com direito a voto) da Petrobras (-13,16%), as PN da Klabin (-15,71%) ou as PNBs da Eletrobrás (-11,37%), configuraram-se entre as 20 maiores quedas do Ibovespa, perdendo mais do que o principal referencial do mercado acionário. As duas classes de ações da Vale do Rio Doce, ON e PNA, que tinham perdas na casa dos 18% até terça-feira, só saíram do ranking dos piores desempenhos ontem.


Mesmo considerando um desaquecimento da economia americana, a China, a Índia e os países europeus prosseguirão como grandes compradores de minério de ferro no mundo, diz o chefe de análise da Ágora, Marco Melo, que recomenda Vale ON. "E, numa projeção conservadora, os preços da commodity devem ter reajuste na casa dos 15% no ano que vem." Entre as pechinchas de primeiríssima linha, o especialista sugere também Companhia Siderúrgica Nacional (CSN) ON, que apresentou o melhor balanço do setor no primeiro semestre e ainda tem um valor não reconhecido na mina Casa de Pedra, que se prepara para abrir o capital. Lojas Americanas PN e a imobiliária Lopes ON completam a lista da corretora, pela exposição ao mercado doméstico.


A lista de compras da Bradesco Corretora é também toda voltada para a expansão da economia brasileira, embora isso não signifique uma blindagem contra o estresse internacional, diz o chefe de análise, Carlos Firetti. No setor financeiro, ele cita as ordinárias do Banco do Brasil e da Porto Seguro, enquanto, no segmento imobiliário, as boas podem ser Abyara ON e Rossi ON. O especialista não vê um contágio direto da crise do "subprime" nos papéis imobiliários, defende que os estrangeiros, principais minoritários do segmento, sabem diferenciar os riscos, e credita os descontos à alta dos juros.


"Os juros de prazos mais longos pioraram, sinalizando que o estresse lançou dúvidas se a redução da Selic seguiria na velocidade esperada", diz Firetti. A Bradesco mantém projeções de uma Selic em 10,75% em dezembro, caindo a 9,75% em 2008, estimulando os bancos a desenvolverem carteiras de crédito imobiliário com recursos próprios. "Todos os mercados do mundo que passaram por processos de redução de juros viram o setor imobiliário deslanchar e esse é um pano de fundo para 2009, 2010 no Brasil", afirma. Para ele, um custo de 10% ao ano tende a criar demanda por financiamento.


Companhias que apresentaram bons resultados no primeiro semestre e que caíram demais compõem a seleção da Concórdia Corretora neste período de aparente bonança. A fabricante de ônibus Marcopolo, considerada competitiva e que mantém parcerias importantes na Rússia e na Índia, é um desses casos, cita o chefe de análise Eduardo Kondo. Klabin PN é outra escolha, dado o aquecimento da demanda por papel ondulado e a inauguração da planta industrial de Monte Alegre em outubro, que vai adicionar 50% a mais de capacidade instalada. Outras que sofreram prejuízos exagerados são Celesc PNB e Tractebel ON. "A geradora tem boas perspectivas de crescimento de resultados, tem projetos de investimentos e é boa pagadora de dividendos."


No setor elétrico, Eletrobrás PN é a predileta do analista Daniel Gorayeb, da Spinelli Corretora. Quando o Ibovespa estava no pico, em 58 mil pontos, os papéis eram cotados a R$ 58,00. Já no pior momento, na quinta-feira, o Ibovespa caiu para a casa dos 45 mil pontos e as ações cederam para R$ 41,00. Nesse meio tempo, a empresa fez um grupamento e as ações passaram a valer metade. Ontem, fecharam a R$ 23,31. Para Gorayeb, podem atingir os R$ 37,50, um potencial de alta de mais de 60%.


Ele justifica a recomendação pelos investimentos da estatal em geração, beneficiando-se do aumento do preço da energia nos próximos anos. Além disso, a Eletrobrás está bastante envolvida na construção das usinas do Rio Madeira, sem contar que ganha com o dólar em níveis mais altos, por ser credora em moeda estrangeira.


Entre as vedetes Vale e Petrobras, Gorayeb acredita que a melhor opção são os papéis da estatal de petróleo. "A compra da Suzano Petroquímica, a retomada dos projetos na Bolívia e o início das operações da plataforma P-54 não se refletiram no papel", diz. As preferenciais da estatal fecharam a R$ 48,74 e o analista tem um preço alvo de R$ 65,00.


Entre os papéis de primeira linha, Gorayeb ainda enxerga oportunidades em Gerdau, Embraer, Unibanco, Bradesco e Usiminas. Já as preferenciais da Telemar são uma opção defensiva, no caso de a bolsa voltar a cair. "Com o leilão em que os controladores da Telemar se comprometem a pagar R$ 45,00, as ações têm uma espécie de limite para cair."


A queda da bolsa atingiu indistintamente todos os tipos de ações, desde as gigantes, preferidas dos estrangeiros, até aquelas menores, com boas histórias de crescimento. "A crise deixou pechinchas para todos os gostos", diz o estrategista de renda variável para pessoa física da Itaú Corretora, Fábio Anderaos de Araújo. Entre as grandes, ele recomenda Gerdau Metalúrgica, Usiminas, Vale, Bradesco e AmBev. Já entre as menores estão BR Malls, Indústrias Romi, Odontoprev, Light, Lojas Renner e Lojas Americanas.


Para os novatos em bolsa, Araújo adverte que aproveitar as oportunidades não significa comprar o que mais caiu e pronto. Ele argumenta que a maior prova disso são as ações do setor imobiliário, que tiveram quedas significativas e que podem seguir patinando. "O setor pode sofrer com o contágio do segmento hipotecário nos EUA, sem contar que algumas dessas companhias têm apenas a promessa de bons resultados."


Logo após o tombo do Ibovespa da quinta-feira, o Santander divulgou relatório recomendando aos clientes que aumentassem as posições em bolsa, dado os preços convidativos. As sugestões incluíam Gerdau, CCR, ALL, Itaú, Unibanco, Dufry, Equatorial Energia, Perdigão, Agra e Dasa.

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