quinta-feira, 10 de janeiro de 2008

O dilema da renda fixa

Valor Econômico
Por Catherine Vieira, do Rio
10/01/2008


Depois de um fim de ano de muitas reviravoltas nas previsões dos analistas sobre inflação e juros, a vida do investidor de renda fixa promete não ser lá muito fácil em 2008. Apesar de a interrupção dos cortes na Selic significar que os aplicadores não mais verão seu retorno encolher em progressão, gestores e especialistas no assunto recomendam agora uma análise mais cuidadosa para quem está pensando em investir nessa classe de ativos. O rumo dos juros ficou mais incerto, o que faz com que alguns indiquem os fundos DI para quem vai aplicar dinheiro novo, porque é o mais conservador. Mas há também quem recomende fundos de renda fixa de gestão ativa, para quem pensa em arriscar lucrar um pouco mais com o cenário mais volátil. A compra direta de papéis tem sido considerada opção só para os que pretendem segurar os títulos até o vencimento e estiverem dispostos a assistir a possíveis dias de volatilidade pelo caminho.


Mas, se o juro agora é estável, por que tanta cautela? Bem, apesar de estável o rumo do juro é menos previsível. Em meados de 2007, era unânime a idéia de que a taxa Selic chegaria a dezembro em 10,75% ao ano, mas eis que a inflação e o crescimento começaram a surpreender e mudaram esse cenário traçado pelos gestores. Tanto que a taxa anual está inalterada em 11,25% ao ano desde outubro. Agora, o ano já começa na incerteza. Até novembro, a visão predominante era a de que em 2008 os cortes seriam retomados, embora houvesse divergências sobre quando isso ocorreria. Mas o quadro ficou bem diferente. Já são poucos os que acreditam em novos cortes e muitos gestores começam a considerar até a possibilidade de alta na taxa básica determinada pelo Comitê de Política Monetária (Copom).


Tudo isso, é claro, tem impactos no mercado de juros futuros e nos preços dos papéis que são comprados pelos gestores para os fundos, assim como nos títulos do Tesouro Direto. "Para se ter uma idéia de como as coisas mudaram nesse mercado de juros futuros, no início de 2007, os papéis com vencimento em janeiro de 2010 projetavam uma taxa de cerca de 12,17%, chegaram a atingir 10,16% em maio e fecharam o ano projetando um juro de quase 12,8%", lembra Eduardo Castro, diretor do ABN Amro. Isso mostra que, no ano passado, a expectativa do mercado para a taxa média de juro até 2010 começou otimista, ficou mais ainda e chegou ao fim mais pessimista.


Para Castro, os investidores que não acompanham muito o dia-a-dia do mercado devem optar por fundos nesse momento. "O cenário ainda está com incertezas e os gestores estão mais aptos a acompanhar isso de perto e mudar as estratégias com agilidade se e quando for necessário", diz ele. Porém, segundo Marcelo D' Agosto, do site Fortuna, o investidor também pode considerar a compra de LFTs para volumes pequenos e se a taxa de corretagem for baixa. "Os fundos voltam a ser uma opção, mas têm de ter uma taxa de administração baixa, senão comprometerão o ganho do cotista", afirma D'Agosto.


Investidores que forem mais arrojados e tiverem disposição para levar os papéis até o vencimento poderiam avaliar a idéia de comprar títulos, mas com ponderações. "No longo prazo, ainda continuamos a ter um cenário positivo para a economia brasileira, mas no meio do caminho há oscilações previstas, por isso o investidor deve avaliar o próprio perfil e o quanto de risco ele está disposto a aceitar, pois ele deve ter em mente hoje que renda fixa é fixa só na data do vencimento", diz o executivo do ABN.


Um outro gestor lembra que o juro real para o longo prazo, se nenhum grande problema ocorrer pelo caminho, tende a estar menor no futuro. Hoje, essa taxa real equivale ao cupom embutido nas NTN-Bs, em torno de 7,4% ao ano nos papéis com vencimento em 2010 e 7,5% para 2011. Ou seja, quem acreditar que o bom cenário de longo prazo vai vingar no Brasil poderia até pensar nesses papéis com vencimento um pouco mais distante, na expectativa de que o juro real poderá estar, num prazo superior a um ou dois anos, no patamar abaixo dos cupons atuais. Se isso ocorrer, quem aplicar nesses papéis hoje teria ganhos maiores do que aquele que aplicar no juro corrente. Também as LTNs (papéis com juros prefixados) ainda são consideradas arriscadas.


"Mais do que acreditar bastante nesse cenário positivo, o investidor que optar por esses papéis deve ter certeza de que não vai precisar dispor dos recursos no meio do caminho, pois com as variações podem e devem acontecer ", diz um especialista.


Por exemplo, quem comprou NTN-Bs com prazo para 2010 no início de outubro, antes da reunião do Copom que confirmou a interrupção dos cortes nos juros, e precisar vender esses papéis agora, possivelmente não terá ganhos como gostaria ou até ter alguma perda, já que os cupons dos papéis de médio prazo chegaram a ficar abaixo de 7% ao ano e agora já estão a cerca de 7,4%, sendo que chegaram a superar 7,5% nos últimos dias de 2007.


Para Alexandre Póvoa, do Modal Asset, especialmente este primeiro trimestre tende a ser de muita indefinição no terreno da renda fixa e dos fatores que a influenciam. Por isso, acredita ele, o ideal para os mais conservadores é deixar o dinheiro numa aplicação mais líquida, como um fundo DI, mesmo que seja de forma temporária. A natureza da inflação, hoje puxada principalmente por alimentos, é relativamente nova para o país. Portanto, não se sabe ao certo como o Banco Central vai lidar com esses aspectos no âmbito da política monetária, completa Póvoa.


O diretor de investimentos do HSBC Investments, Mario Felisberto, diz que, por enquanto, a previsão para a taxa de juro em 2008 é de estabilidade, ou seja, não sobe e nem cai. Porém, alerta ele, esse prognóstico pode mudar e não está de forma nenhuma descartada a possibilidade de uma alta na taxa básica pelo Copom este ano. "Ainda trabalhamos com a previsão de estabilidade, mas diria que a probabilidade de uma alta nesse momento seria maior do que a de um corte", diz Felisberto, que trabalha com uma projeção de 4,2% para o IPCA em 2008.


O executivo do HSBC diz que o aplicador que se acostumou com apostas no longo período em que o Copom sucessivamente cortou a taxa não deve esperar mais tempos tão fáceis. "Há indefinições e riscos no horizonte, portanto, a quem vai investir dinheiro novo, a melhor opção por enquanto pode ser até um fundo DI", avalia. "Só não recomendo migração de quem está em outros fundos para esses porque isso poderia implicar perda por conta de impostos", diz. (colaborou Rafael Rosas, do Valor Online

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