quarta-feira, 4 de julho de 2007

Transparência é arma para que filhos sigam o próprio caminho

Do Valor Econômico de 04/07/2007:

Mara Luquet

Um leitor da coluna quer saber até que ponto deve revelar ao filho o tamanho do patrimônio da família. É uma dúvida comum a muitos pais não só aos brasileiros. Recentemente, uma reportagem no jornal americano "The Wall Street Journal" mostrava como os pais estavam sendo surpreendidos com filhos pesquisando na internet o valor dos imóveis da família. Na reportagem, o colunista Robert Frank citava o caso de um herdeiro que descobriu que a família era dona de uma bela fortuna em mãos só depois que um colega de escola o presenteou com um exemplar da revista "Forbes" que trazia a lista das maiores fortunas da América e lá estava seu pai.
Mas, mesmo que você não figure em nenhuma lista dos mais afortunados do mundo, essa é uma questão relevante, principalmente porque faz parte de um processo importante da educação financeira de seus filhos. "Tem de ser transparente", diz Marco Gazel, sócio da M2 Investimentos, empresa especializada na consultoria de investimentos pessoais para famílias. Em seu trabalho, essa é uma questão rotineira e, para Gazel, a resposta é sempre a mesma: "seja transparente".
Mas observe que transparência não significa entregar seu comprovante de rendimentos para seu filho. O primeiro ponto a pensar é em relação ao orçamento doméstico e, neste aspecto, não tem discussão, a família toda precisa estar envolvida nas questões sobre receitas e despesas. Os consultores de investimento concordam que este cuidado facilitará muito a sua vida na hora de controlar despesas e construir um patrimônio.
"E se você chama a família para controlar despesas também precisa ser transparente quando a maré está boa e o patrimônio familiar cresce", diz Gazel. "Afinal, é uma conquista de todos".
No entanto, em geral, as pessoas não guardam dinheiro apenas por prazer. A construção de um patrimônio visa, além do conforto financeiro atual, financiar as despesas que estão para chegar, como a faculdade do filho, emergências, gastos com saúde e a sua aposentadoria. E este ponto tem de ficar claro para toda a família.
Assim, na hora em que seu filho perguntar sobre os investimentos da família mostre que esse é um dinheiro que tem destino certo. Veja bem, se seu filho não precisar custear os anos de aposentadoria dos pais já lhe será eternamente grato. E você poderá deixar bem claro que aquele é um investimento seu para poder manter o conforto a que tem direito por ter trabalhado duro por anos a fio. Ou seja, você conquistou o direito de ter uma boa vida e não quer viver de favores, principalmente de genros e noras.
"O papel do pai é educar o filho e não dar dinheiro", diz Gazel. Segundo ele, este cuidado vai fazer com que os filhos pavimentem seu próprio caminho rumo às próprias conquistas sem as quais poderão ter sérios problemas no futuro, inclusive com os pais. Muitos pais esperam que seus filhos fiquem adultos para, então, revelar integralmente ou parte da riqueza da família.
Ocorre que, como o acesso à informação está muito fácil, principalmente por meio da internet, seu filho poderá ter notícias sobre os ganhos dos pais por outras vias. Ele poderá ler em algum artigo a média salarial da profissão dos pais, notícias sobre participação no lucro ou opções sobre ações dadas pela empresa em que os pais trabalham, ou até mesmo as notícias sobre as altas espetaculares da bolsa poderão fazer com que seu filho faça a própria estimativa da riqueza familiar. E esse, definitivamente, não é o melhor caminho, segundo os especialistas.
No entanto, a maior parte das experiências coletadas pelos consultores financeiros pessoais com as famílias brasileiras dá conta que o problema na verdade é outro: dizer aos filhos que a família tem um patrimônio bem menor do que os pais sinalizaram ao longo de uma vida de gastos excessivos, sem qualquer planejamento.
Essa é uma bomba que vai estourar no colo do seu filho quando ele descobrir que os excessos financeiros praticados por seus pais não permitiram que eles cuidassem da própria aposentadoria. Será, neste momento, então, que o filho vai descobrir na prática que a família não era tão rica quanto ele pensava na adolescência. Torça para seu filho seja tão generoso quanto você foi.
Mara Luquet é editora da revista ValorInveste e autora do livro O Assunto é Dinheiro, escrito em parceria com o jornalista Carlos Alberto Sardenberg
E-mail: mara.luquet@valor.com.br

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