terça-feira, 1 de junho de 2010

Subir ou descer do carrossel, eis a questão

Motivação e desempenho: Outras explicações, além das pecuniárias, fazem casos de sucesso ou de fracasso.

Valor Econômico

01/06/2010

Por João Carlos de Oliveira, para o Valor, de São Paulo
01/06/2010

"Economia da Identidade"

George Akerlof e Rachel E. Kranton. Trad. de Afonso Celso C. Serra. Campus/Elsevier. 216 págs., R$ 62,00

Preconceitos, cultura empresarial, movimento feminista, tabagismo, educação e racismo. Todos esses temas são tratados neste livro à luz das circunstâncias em que as pessoas tomam decisões e fazem suas escolhas. Seu feitio é o de uma introdução de conceitos (até porque não se aprofunda em nenhum tema), dividida em quatro partes: economia e identidade; trabalho e escola; gênero e raça; e uma proposta de nova abordagem para a economia.

Os autores acreditam que a economia não deve estudar apenas as motivações pecuniárias, como desejos de consumo e de renda. Todas as motivações, inclusive as não pecuniárias, como ter filhos, buscar equidade, retribuição ou status, são seus objetos. O detalhe é que esses gostos e preferências de ter ou não ter filhos, por exemplo, não devem ser entendidos como meras características individuais ou idiossincrasias. Afinal, as normas fixadas sobre como se comportar são função de quem interage com quem e em que contexto social.

Akerlof e Kranton tomam emprestada a figura de um carrossel, usada pelo sociólogo Erving Goffman, para ilustrar o que pensam. Goffman observou o comportamento de crianças de diferentes idades diante do brinquedo. Para as menores, até quatro anos, andar em cima de um cavalo no carrossel é um feito de coragem; para as maiores, não, tanto que, normalmente, buscam aumentar a sensação de "perigo" andando em pé no brinquedo, pulando dele em movimento - isso, se simplesmente não se recusam a subir. Em resumo, os menores demonstram sua alegria quando o que fazem está de acordo com as convenções e normas; já os maiores demonstram o seu desconforto e reagem de acordo com ele.

Esse entendimento das relações entre identidade, norma e categoria social varia ao longo do tempo e das diferentes culturas e estruturas sociais. Um exemplo: o tabagismo. Até a década de 1960, fumar era mais aceitável para homens do que para mulheres. A diferença de atitudes começou a terminar na década seguinte. Uma marca de cigarros, o Virginia Slims, usou o seguinte slogan: "Você já foi longe, querida!", fazendo o feminismo significar tanto a libertação do tanque de lavar roupas como o fim da "proibição" social de fumar. A abordagem tradicional da economia, que apenas pesquisaria a distribuição de renda na sociedade com a entrada das mulheres no mercado de trabalho, não conseguiria, afirmam os autores, explicar esse fenômeno.

Além do tabagismo - hoje, socialmente condenado -, a mesma abordagem é utilizada para analisar os mais diversos temas: das escolas à divisão do trabalho doméstico, dos ambientes militares ao racismo, passando pelo mundo corporativo. Em todos os casos, a busca é do que pode determinar determinada realidade de sucesso ou de fracasso.

No caso das empresas, uma pergunta relevante é como motivar funcionários para que ela tenha uma trajetória bem-sucedida. Hoje, a maioria atrela o pagamento de bônus ao desempenho. Parece lógico e eficaz. Assim, se a remuneração do principal executivo se baseia em opções para a compra de ações, maior será o incentivo para maximizar o preço das ações. Se os preços subirem é sinal de que o mercado sancionou uma expectativa favorável para o desempenho daquela empresa, e o executivo deve ser premiado. Será? Akerlof e Kranton não acreditam nisso. Eles lembram que há duas maneiras de se conseguir esse efeito (subir os preços das ações): aumentar mesmo o valor da empresa ou manipular os livros com criatividade.

"Evidências recentes mostram que os executivos compreenderam e adotaram a segunda hipótese", afirmam. É que, segundo eles, quando as únicas recompensas e objetivos são estritamente monetários e econômicos, os executivos vão sempre manipular o sistema até o ponto em que puderem garantir a própria impunidade e o lucro.

Isso não acontece só no alto escalão. É raro que as empresas montem seus programas de incentivo com base, por exemplo, no número de peças produzidas. É que, nesse caso, os trabalhadores tendem a manipular o tempo de fabricação, por recear que, se terminarem rapidamente o trabalho, a empresa considerará a tarefa fácil e reduzirá a remuneração por unidade de produção.

Akerlof e Kranton recomendam uma forma de quebrar esse ciclo de conflitos de interesse: criar comprometimento, identidade. Isto é, na medida em que os trabalhadores se identificam com os objetivos das organizações, desaparece o conflito de interesses.

Nas empresas ou em qualquer outra organização social, como escolas, é possível ter pessoas que aceitam e se identificam com a cultura dominante, os "insiders", e as que não conseguem agir de acordo com essa cultura, os "outsiders". Para os autores, o segredo do sucesso é fazer com que mais trabalhadores se vejam como "insiders". Se isso ocorrer, a companhia poderá obter alto esforço dos funcionários com diferenciais de remuneração mais baixa.

Identidade, nesse caso, significa mais do que alinhamento. Significa compartilhar bandeiras e causas. Significa que as pessoas vão se mobilizar, querer trabalhar em uma companhia, estudar numa determinada escola ou mesmo comprar um determinado produto para, assim, realizar um ideal.

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