quarta-feira, 21 de janeiro de 2009

Opções para passar pela crise

Valor Econômico
Por Alessandra Bellotto, de São Paulo
21/01/2009

Com o fim da festa na bolsa, muitos investidores de ações foram encorajados a buscar estratégias diferenciadas para atenuar, pelo menos em parte, os estragos provocados pela crise financeira internacional em seus portfólios de renda variável. Nesse processo de sofisticação do investimento, o mercado de opções foi a alternativa encontrada por alguns aplicadores para garantir um rendimento todo mês - independentemente da variação do papel - e, em momentos de baixa, proteger a carteira.

O mercado de opções é caracterizado pela negociação de direitos de compra e venda de lotes de ações, com preços e prazos predeterminados. Entre as diversas estratégias, uma em particular vem se destacando entre os investidores que começam a se aventurar pelo mundo das opções de ações. Trata-se da operação de "lançamento coberto (para quem tem as ações em carteira) de opções", também conhecida como financiamento. O professor do Calil & Calil - Centro de Estudos e Formação de Patrimônio Mauro Calil diz que o financiamento coberto com opções é a operação mais simples do mercado de derivativos e tem vantagens. "Além de aumentar o potencial de retorno do investimento, funciona como uma proteção para a carteira de ações", diz. "Não é um hedge perfeito, mas reduz o prejuízo quando o mercado é de baixa."


O dentista L.P.T., de 41 anos é um dos que usam a estratégia. Ele se tornou um investidor de bolsa em 2003, ao herdar ações do Itaú. Em meados do ano passado, quando 100% de seu patrimônio estava aplicado em ações da Vale, ele começou a zerar suas posições ao acreditar que o pior ainda estava por vir. Chegou a ter prejuízo, porque vendeu as ações da mineradora entre R$ 35 e R$ 27, enquanto seu custo de aquisição variava de R$ 19 a R$ 39. Mas ele evitou perda maior, porque as ações caíram para R$ 19 no fim de outubro. Foi nesse momento que o dentista começou a recomprar Vale a um preço muito menor e a lançar opções cobertas. "O mercado de opções ajuda a proteger a carteira, mas só lanço opção coberta", afirma. Para ele, a grande vantagem da operação é que ela reduz o preço médio de aquisição das ações.


Na operação de financiamento coberto, o investidor vende opções de compra (call) na mesma quantidade de ações que tem em carteira, comprometendo-se a entregar o ativo a um determinado preço até o vencimento da opção. Em troca, é cobrado um valor, chamado de prêmio. O comprador das opções paga o prêmio para ter o direito, não a obrigação, de ficar com as ações no futuro pelo preço combinado. O exercício da opção pelo comprador, porém, só vale a pena se o preço da ação no mercado à vista estiver acima daquele combinado na operação.


"Busco ganhar de 3% a 5% (sobre o valor da ação no mercado à vista) por lançamento", conta L.P.T. Em uma operação recente, cujo prazo de exercício venceu na segunda-feira, o investidor teve ganho bruto (sem descontar taxa de corretagem, emolumentos e imposto de renda) de 4,2%, considerando o valor dos prêmios recebidos e a variação de suas ações. O investidor fez quatro lançamentos de opções cobertas com diferentes "strikes" (preços de exercício).


No primeiro, no dia 19 de dezembro, lançou mil opções de ações da Vale PNA ao preço de exercício de R$ 26,00, recebendo um prêmio de R$ 1,55 por opção. De imediato, ganhou R$ 1.550. No dia 30 de dezembro, lançou mais mil opções com "strike" de R$ 24,00 e um prêmio de R$ 1,30, ganhando R$ 1.300. No dia 5 de janeiro, vendeu outras 900 opções ao preço de exercício de R$ 26,00 e prêmio de R$ 1,10 por opção (ou R$ 990 no total) e, no dia 6, lançou mais mil opções com strike de R$ 30 e prêmio de R$ 1,30, ganhando mais R$ 1.300. Só de prêmio, o investidor garantiu R$ 5.140 com o lançamento de 3.900 opções.


No último dia 19, com a cotação da Vale acima de R$ 26, o investidor teve três de seus lançamentos exercidos. Na operação em que entregou as ações por R$ 24,00, ele tinha pago R$ 24,14, valor que com o prêmio de R$ 1,30 foi reduzido a R$ 22,84, ou seja, o prejuízo de vender as ações a um preço abaixo do valor pago foi mais do que compensado pelo prêmio. Nos dois lançamentos de opções de Vale a R$ 26, ele foi exercido, mas não perdeu já que tinha pago um preço médio pelas ações de R$ 24,88. Já na operação de Vale a R$ 30, não houve exercício e o investidor ficou com o prêmio e as ações, pelas quais pagou o preço de R$ 29,29.


Para a aquisição das 3.900 ações de Vale, o investidor havia desembolsado um total de R$ 100.702. Após o vencimento das opções, no dia 19, seu investimento tinha virado R$ 104.930, sendo R$ 73.400 em dinheiro (R$ 5.140 de prêmio e o restante obtido com a entrega das ações) e R$ 26.390 em ações da Vale, segundo a cotação de fechamento daquele dia. Se o investidor não tivesse lançado as opções, as 3.900 ações da Vale em carteira, pelas quais havia desembolsado R$ 100.702, valeriam cerca de R$ 103 mil no dia 19, abaixo do valor que conseguiu com a operação.


Essa foi a alternativa que L.P.T. encontrou não só para proteger parte de seus investimentos em ações da Vale nesse período de turbulência, mas para conseguir ampliar o número de ações da empresa. "Não coloco dinheiro novo na bolsa, mas uso o prêmio para comprar mais papéis", diz. "E quanto mais ações eu tiver, mais lançamentos de opções posso fazer." Para ele, o momento atual é uma grande oportunidade, já que para comprar mil ações da Vale hoje é preciso ter metade do dinheiro necessário em maio de 2008, quando a bolsa fechou na maior pontuação de sua história.


O raciocínio do dentista-investidor é o de usar o financiamento coberto com opções para "forjar juros compostos", afirma o consultor Mauro Calil. Se o investidor que consegue um prêmio de 5% toda vez que lança uma opção coberta reinvestir o dinheiro na compra de mais ações para o lançamentos de novas opções, terá obtido uma rentabilidade excepcional após sucessivas operações, afirma. "Cinco por cento reaplicados todo mês em opções terão virado 79% ao fim de um ano", exemplifica Calil, mais do que qualquer retorno de renda fixa convencional - vale lembrar que o valor do prêmio varia, assim como o preço das ações. Calil destaca que as opções mais líquidas são as de Vale e Petrobras.


Mesmo com a estratégia de opções para proteger a carteira, L.P.T. ficou mais cauteloso após a crise. Do seu patrimônio total hoje, a bolsa, que chegou a representar 100%, equivale a uma fatia menor que 50%. A mesma atitude de cautela foi tomada pelo engenheiro Emerson Morga, de 50 anos, na bolsa desde 2002. "Comecei 2008 com mais de 60% do meu patrimônio financeiro em ações, saquei tudo no dia 27 de outubro (na menor pontuação da bolsa do ano) e comecei a me reposicionar ao poucos no início de novembro", conta. Hoje, sua exposição em ações é de 25%. Ele conta que está mantendo dinheiro em caixa para aproveitar quedas bruscas para comprar, mas pretende se limitar a 30% de exposição.


Emerson também usa o mercado de opções cobertas para proteger a carteira. No ano passado, com o lançamento de opções e outras estratégias mais sofisticadas, como a arbitragem de preços entre papéis, conseguiu ter uma perda menor (-20%) na bolsa do que o Ibovespa, que recuou mais de 40%.


Há quem tenha chegado em boa hora ao mercado de ações. É o caso do empresário de 40 anos Eduardo Barreto Wang. Ele conta que começou a investir mais pesadamente em ações no fim do ano passado, quando a bolsa estava em torno de 31 mil pontos. "Minha estratégia tem sido de realizar o lucro toda vez que a ação sobe e usar o dinheiro para ampliar o número de ações das companhias que tenho em carteira", conta. Esse é um dinheiro de longo prazo que ele pretende usar somente no futuro.

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