quarta-feira, 3 de novembro de 2010

BC denuncia agiotagem on-line

Correio Braziliense

03/11/2010

A pedido do Banco Central, Ministério Público abre processo contra o site Fairplace, suspeito de crime por oferecer empréstimos sem autorização

Fernando Braga

O Banco Central decidiu agir para conter, ainda no início, o que chama de agiotagem on-line, que pode deixar um rastro de prejuízos país afora. A instituição denunciou ao Ministério Público a Fairplace, que se apresenta com uma rede social na qual quem tem dinheiro pode emprestar para quem precisa a juros menores do que os cobrados no cheque especial ou no cartão de crédito (entre 9% e 10% ao mês). Na avaliação do BC, a Fairplace está transgredindo a lei ao exercer o papel de instituição financeira sem ter autorização para isso. Os responsáveis serão investigados pelo MP e poderão ser enquadrados na Lei nº 7.492, a do Colarinho Branco, por crime contra o sistema financeiro nacional.



Quem vê a propaganda da Fairplace na internet acredita se tratar de um negócio da China. De um lado, o site oferece a quem empresta o dinheiro a possibilidade de receber um rendimento (3,2% ao mês, em média) muito superior ao pago por aplicações tradicionais como a caderneta de poupança e os fundos de renda fixa entre 0,5% e 0,8% mensais. De outro, garante aos tomadores do empréstimo a possibilidade de saírem do sufoco por meio de débitos mais baratos. Para o BC, trata-se de um processo semelhante a uma pirâmide. Bastará alguns dos devedores não honrarem seus compromissos para que uma onda de calote seja detonada. Os próprios responsáveis pela Fairplace garantem que não se responsabilizam por qualquer problema. São meros repassadores de recursos.



As negociações entre emprestadores e tomadores de crédito são fechadas por meio de leilões, um sistema chamado de P2P (ponto a ponto). Vence aquele que aceitar a taxa de juros mais baixa para emprestar os recursos que pode chegar ao valor de R$ 5 mil por operação. Criada há seis meses, a Fairplace já conta com 14 mil pessoas credenciadas e realizou 410 operações, movimentando R$ 1,6 milhão. Com todos esses números, a rede social não se intimidou em propagandear seu sucesso, mesmo ciente de estar operando à margem da lei. No último 23 de outubro, porém, o Correio alertou para os riscos das facilidades oferecidas pela Fairplace. De início, o BC se recusou a se posicionar sobre as irregularidades. Mas acabou reconhecendo que havia denunciado a empresa ao MP em agosto. O processo já foi aberto.


Intermediário

O sistema criado pela Fairplace passa aos interessados um ar de sofisticação. Para tentar um empréstimo, o interessado deve preencher um cadastro, onde é avaliado o seu nível de risco pela conceituada Serasa Experian. Com os dados em mãos, emprestadores realizam um leilão, no qual oferecem o dinheiro com diferentes taxas de juros. Ganha quem propõe a mais baixa. Desse modo, o site recebe 2% de cada parcela recebida pelo emprestador. Já quem assumiu a dívida paga uma comissão que pode variar de 5% a 8% do valor.



O sócio-fundador da Fairplace, Eldes Mattiuzzo, apresenta o site sem constrangimento. Trata-se de uma sociedade prestadora de serviços de intermediação e captação de empréstimos entre particulares por meio virtual, diz. E acrescenta: A Fairplace não faz qualquer tipo de concessão direta de empréstimos ou financiamentos. Apenas usamos nossa plataforma na internet para reunir as pessoas interessadas nos negócios.



Na visão de especialistas, o BC está corretíssimo em agir, para evitar que o modelo usado pela Fairplace se espalhe como uma praga. Para ser intermediário do mercado financeiro é preciso ter o registro de instituição financeira ou de fundo de investimento. Se há um novo meio que ofereça investimentos ao público, ele deve estar cadastrado junto aos órgãos competentes, afirma José Luiz Rodrigues, presidente da Consultoria JL Rodrigues, voltada para o sistema financeiro.



A mesma avaliação é feita pelo professor Carlos Eduardo de Freitas, ex-diretor do BC. Captar recursos junto ao público é privativo de instituições financeiras autorizadas a funcionar pelo Banco Central ou de fundos de investimentos licenciados pela CVM (Comissão de Valores Mobiliários), observa. Para ele, uma entidade que capta recursos de terceiros à margem da legislação gera risco para a poupança popular. (Colaborou Vânia Cristino)




Como funciona




Cadastro

Quem deseja obter o empréstimo faz o cadastro no site e preenche uma ficha com dados pessoais e o valor de que necessita.


Classificação

O site classifica o usuário de acordo com o seu perfil e o risco que ele apresenta em não pagar o empréstimo. Mas o site não se responsabiliza por possíveis calotes.


Leilão

Pessoas que desejam emprestar o dinheiro participam de um leilão, cujo vencedor é o que oferece menores taxas de juros.


Retorno

Se tudo der certo, o emprestador recebe de volta o dinheiro em parcelas com os juros mensais

pré-estabelecidos.


Lucro

Em troca, o site recebe 2% do valor de cada parcela recebida pelo emprestador. Já quem captou o dinheiro paga uma comissão que pode variar de 5% a 8% do montante total.




Dicas para não se dar mal




Veja se o serviço é autorizado

Qualquer um que ofereça investimentos coletivos (como fundos, clubes de investimento e contratos do tipo boi gordo) ou se apresente como intermediário de uma instituição financeira precisa de autorização da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), como pessoa física, ou do Banco Central (BC), como pessoa jurídica.


Procure por registros

A CVM mantém o registro de quem atuou de forma irregular no passado. Com CPF ou CNPJ de quem oferece o serviço financeiro, o cidadão pode fazer consultas no site da CVM (www.cvm.gov.br). Basta ir em Atos Declaratórios Suspensão de Atividade Irregular.


Desconfie de depoimentos

Uma tática comum dos criminosos é usar depoimentos de quem parece ter aproveitado a oportunidade e ficado satisfeito. Mas lembre-se: depoimentos de desconhecidos não têm valor para decisões financeiras.


Confira quem são os representantes

Muitos golpistas usam o nome de uma instituição credenciada, mas apresentam dados diferentes para contato. Por isso, é importante checar se o suposto prestador de serviços realmente representa uma determinada empresa do setor.


Tenha calma

Geralmente os fraudadores pressionam as vítimas e tentar impedir que elas avaliem com calma as propostas. O discurso costuma envolver uma chance imperdível e a necessidade de pressa para que ela possa ser realizada.


Tome cuidado em eventos

A CVM recomenda que as pessoas tenham um cuidado especial com abordagens e propostas feitas em eventos, como cursos, feiras de negócios ou mesmo websites.




Lei prevê até prisão





Se a Lei nº 7.492, do Colarinho Branco, for seguida à risca pelo Ministério Público, os responsáveis pela Fairplace poderão estar sujeitos à prisão. A norma considera instituição financeira pessoa jurídica de direito público ou privado, que tenha como atividade a captação, intermediação, administração ou aplicação de recursos financeiros de terceiros. Justamente o que o site afirma que não é. Em casos como esse, o BC tem de agir rápido para evitar que o menor número de pessoas sejam afetadas, afirma um ex-diretor de Organização e Normas do Banco Central.



A legislação brasileira, por meio do Sistema Financeiro Nacional, atribui ao BC as tarefas de conceder autorização, regular e fiscalizar as atividades das instituições financeiras que funcionam no país. A CVM, por sua vez, é responsável por regular o segmento de capitais, protegendo os investidores. Por meio da política conhecida como disclosure, os administradores de fundos são obrigados a divulgarem diariamente informações como patrimônio líquido, investimentos, resgates e número de investidores de cada carteira, explica o superintendente de Relações com Investidores Institucionais da CVM, Francisco José Bastos Santos. Além disso, sempre que um fundo operar de forma irregular, o órgão alertará o mercado por meio de boletins.



Na visão de Carlos Thadeu de Freitas Gomes, ex-diretor do BC, apesar de o Banco Central e de a CVM se esforçarem para ser cada vez mais eficientes no que diz respeito a regulação, sempre estão atrás das soluções que surgem no mercado. Com o tempo, as autoridades do sistema financeiro estão se tornando mais eficientes, mas, mesmo assim, é difícil, porque elas sempre ficarão para trás, pois o mercado é muito ágil e criativo, diz. (FB)

segunda-feira, 1 de novembro de 2010

Investidor busca lucro com ação em baixa

Folha de São Paulo

01/11/2010


Volume de aluguel de papéis por pessoas físicas bateu recorde em setembro, movimentando R$ 2,1 bilhões

Operação permite obter ganhos com queda de ativos; aumento dos negócios indica maior especulação na Bolsa

MARIANA SCHREIBER
DE SÃO PAULO

O investidor pessoa física está mais ousado. Em setembro, pelo segundo mês seguido, o volume de ações que esses aplicadores alugaram de outros investidores (bancos, fundos etc.) bateu recorde. Foram R$ 2,1 bilhões, de acordo com a BM&FBovespa.
Isso significa que mais investidores estão especulando em cima da oscilação dos papéis, buscando lucro em momentos de queda.
"A Bolsa vinha de anos seguidos de alta. Era só comprar a ação e esperar subir. Com esse solavanco [a crise de 2008], o mercado ficou mais difícil", diz Paulo Levy, diretor da corretora Icap.
A operação mais simples consiste em alugar ativos de outro investidor e vendê-los para comprá-los depois e devolvê-los. Quem faz isso acredita que a ação vai cair e por isso vai conseguir recomprá-la por um preço menor depois, embolsando a diferença (veja exemplo no quadro).
"É um jeito de ganhar sem ter o papel na carteira. Mas, se a ação disparar, vai ter de comprar para devolver", resume Marcelo Coutinho, sócio-presidente da Youtrade.
O aluguel de uma ação dura, no mínimo, um dia. Os contratos, geralmente de 30 dias, podem ser renovados.
Quem aluga paga ao dono do papel uma taxa, que varia de acordo com o ativo e a demanda, e é proporcional ao tempo de demora para a devolução. Quando mais gente acredita na queda do papel, a procura pelo aluguel aumenta e o custo, também.
Nas duas últimas semanas, quem alugou a ação ordinária da Petrobras pagou em média 0,54% ao ano.
Entre os dias 15 de setembro 5 de outubro, a taxa média era de 8,46% ao ano.
O aluguel da ação de uma pequena empresa como a Refinaria de Manguinhos saía, em média, por 19,68% ao ano nos últimos 15 dias.

RENDA EXTRA
Alugar ações para outros investidores é uma fonte de renda extra para quem costuma comprar papéis e mantê-los parados.
A maior parte dos investidores pessoas físicas, no entanto, atua na ponta mais conservadora, alugando suas ações para outros operadores. Em setembro, pessoas físicas alugaram R$ 10,9 bilhões para outros investidores. O volume foi recorde em agosto: R$ 13,7 bilhões.
Apesar de o retorno, em geral, ser baixo, o economista Francisco Rocha liga toda semana para sua corretora para alugar seus ativos.
"É um rentabilidade muito reduzida, mas já é alguma coisa. Alugo todas as ações: da Vale, da Petrobras, da Random e da Fosfertil."
"O único risco que o investidor tem é o de perder uma boa oportunidade de venda", observa o educador financeiro Mauro Calil.
Quem aluga o papel de alguém automaticamente deposita garantias (ações, títulos ou dinheiro) na BMF&Bovespa que cobrem mais de 100% do valor alugado.
Isso dá segurança ao "doador" do papel de que o "tomador" terá recursos para recomprar os ativos e devolvê-los. Essa garantia é ajustada diariamente, de acordo com a oscilação do papel.

"INTRA DAY"
Se o investidor quiser ganhar com a queda do papel no "intra day" (num só pregão), ele não precisa alugar as ações.
Pode fazer uma venda a descoberto, ou seja, vender ações que não tem para comprar no mesmo dia. Isso é possível porque, quando um papel é vendido, ele só é efetivamente entregue depois do fechamento do pregão.
O ex-empresário Silvio Vaiano se desfez dos negócios há um ano e meio e desde então faz vendas a descoberto diariamente. "Já tive alguns prejuízos. Meus ganhos por operação ficam entre 0,4% e 0,8%. Ao atingir esse patamar, fecho a operação."
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