sexta-feira, 10 de setembro de 2010

Renda fixa ficará sem imposto, diz Mantega

Valor Econômico


 

10/09/2010


 

Murillo Camarotto e Carolina Mandl | Do Recife e de São Paulo

O governo federal vai anunciar nos próximos dias medidas para incentivar as emissões de títulos como debêntures e Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRIs), conforme antecipado pelo Valor na edição de 30 de agosto. Com o objetivo de tornar esses ativos mais rentáveis, os papéis deverão ficar isentos de Imposto de Renda, de acordo com o ministro da Fazenda, Guido Mantega.

Também serão anunciadas medidas de incentivo ao mercado secundário de títulos privados. De acordo com o ministro, o governo entende que o mercado de capitais brasileiro é muito sólido e confiável, porém de porte ainda modesto. Além de incentivar a expansão do mercado de títulos privados, a ideia é estimular a viabilização do mercado secundário desses papéis. "O investidor precisa ter a segurança de que conseguirá vender o título se precisar", afirmou Mantega.

Ontem, números divulgados pela Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima) mostraram que o mercado de capitais registrou uma captação de R$ 71,5 bilhões neste ano, até agosto, volume 32,1% superior àquele acumulado em igual período de 2009.

Em agosto, as emissões bateram R$ 5,1 bilhões, valor 42,7% superior ao mesmo mês do ano passado. O destaque no mês ficou justamente para os títulos que o governo pretende incentivar. As ofertas de debêntures somaram R$ 2,7 bilhões, enquanto as de CRIs ficaram em R$ 2 bilhões.

Porém, é preciso ressaltar que todas as emissões de debêntures foram feitas por meio de ofertas de esforços restritos, aqueles em que a companhia só pode vender seus papéis a um número limitado de investidores. Em geral, essa modalidade tem sido usada pelos bancos como um instrumento de crédito, já que eles mesmos acabam comprando 100% das debêntures.

Neste momento, não há ofertas de debênture voltadas aos investidores sendo analisadas pela Comissão de Valores Mobiliários. Segundo Alberto Kiraly, vice-presidente da Anbima, por causa das eleições, as companhias anteciparam as ofertas para o primeiro semestre, por isso a recente paralisação. As mudanças estudadas pelo governo também podem estar represando as emissões, já que as empresas tendem a esperar condições mais favoráveis.

segunda-feira, 6 de setembro de 2010

Bolsa em pequenas doses

Mercado de ETF registra recorde no número de negócios em agosto, com alta de 58% ante o mês anterior.
Valor Econômico

Por Luciana Monteiro, de São Paulo
06/09/2010


Assim como os consumidores, os pequenos investidores também demonstram gostar de preços mais baixos. Bastou a BM&FBovespa reduzir a aplicação mínima para que os fundos com cotas negociadas em bolsa registrassem recorde no número de negócios. O total de operações com os chamados ETFs (Exchange Traded Fund) saltou 58% em agosto ante o resultado de julho.
No mês passado, o número de negócios com ETFs na bolsa somou 17.293, ante 10.918 realizados em julho, segundo dados da BM&FBovespa. O volume também cresceu, embora em menor intensidade: somou R$ 598,093 milhões para R$ 560,395 milhões no mês anterior.
A maior negociação está diretamente relacionada à redução, anunciada em julho, do lote-padrão dos ETFs, que caiu de 100 para 10 cotas - o que trouxe uma diminuição grande no valor mínimo necessário para investir nessas carteiras. Com o corte, um lote-padrão do ETF Bova11, que espelha o Índice Bovespa, passou a valer R$ 660,00 pela cotação de fechamento de sexta-feira. Antes, o mínimo para investir seria de R$ 6.600,00. A mudança começou a valer, no entanto, somente em agosto, por isso a diferença apareceu só agora.
O objetivo da bolsa com a medida é aumentar o potencial de negociação destes fundos, especialmente, entre investidores pessoas físicas. Segundo dados da bolsa, dos 598 mil investidores com contas ativas, a maior parte tem entre 26 e 35 anos. Mas é a faixa de investidores entre 18 e 24 anos que apresentou o maior crescimento mensal no número de contas entre janeiro de 2008 e dezembro de 2009. Esse segmento registrou expansão média de 2,9% no período.
No projeto de popularização da bolsa, um dos instrumentos mais eficientes para a diversificação de carteira da pessoa física é o ETF, diz Julio Ziegelmann, diretor de renda variável da BM&FBovespa. "Este é um mercado ainda pequeno por aqui, mas temos uma visão de crescimento de longo prazo." Ele lembra que, nos Estados Unidos, os 10 ETFs mais negociados giram o dobro das 10 ações mais transacionadas.
Os institucionais ainda são os maiores compradores de ETFs, com 60,4% de participação no volume em agosto. As instituições financeiras somam 18,4%, enquanto os estrangeiro respondiam por 11,9%. As pessoas físicas ficavam apenas em quarto lugar, com fatia de 9%. As empresas representavam 0,4%.
Gestora com o maior número de ETFs no Brasil, a BlackRock estuda o lançamento de carteiras que seguem índices internacionais. Falta, no entanto, uma mudança na atual regulação, a Instrução 359. Isso porque, pelas regras, todos os fundos de investimento brasileiros podem aplicar até 10% da carteira no exterior, sendo que os multimercados podem chegar a 20%. O percentual sobe para 100% em fundos para investidores superqualificados, com aplicação de R$ 1 milhão.
A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) precisaria, portanto, permitir que os fundos que seguem índices do mercado internacional pudessem ser oferecidos também para o investidor de varejo. "Essa é uma indústria ainda nova no Brasil e o país é considerado a menina dos olhos para o grupo", diz André Ribeiro Turquetto, diretor da BlackRock para América Latina e Região Ibérica. "Mas é também um mercado mais fechado, em que a cultura de bolsa está se desenvolvendo."
A CVM trabalha na atualização da Instrução 359, mas a minuta com as novas normas não deve entrar em audiência pública neste ano, somente em 2011, diz Luciana Dias, superintendente de Desenvolvimento de Mercado. "O entendimento da CVM é que é necessário abrir o mercado internacional para o varejo aos poucos", afirma. "Num ETF de índice internacional, é importante que o investidor, que não está acostumado a ligar com alguns riscos, vá devagar", avalia Luciana, citando a variação cambial, que passaria a ter impacto direto no desempenho dessas carteiras.
Atualmente, são negociados sete fundos de índices na BM&FBovespa. O mais popular é o Bova11, que em agosto representou 87% dos negócios com ETFs na bolsa e 79% do volume. Os dados mostram que o número de operações com esses fundos passou de 8.853 para 15.090 no mês passado. Já o volume, que em julho somou R$ 453,403 milhões, foi de R$ 508,232 milhões em agosto. E, em breve, mais um ETF deve chegar ao mercado: o que segue o Índice Financeiro (IFNC) e cujo gestor será o Itaú.
O administrador de investimentos Fabio Colombo acompanha esse mercado, bastante popular no exterior, há anos, antes mesmo de os fundos de índice chegarem ao país. "Para o investidor que prefere aplicar num fundo de ações e tem visão de longo prazo, os ETFs são mais interessantes, pois costumam ter taxas de administração menores do que as cobradas pelas carteiras tradicionais", diz ele. Já para quem gosta de fazer várias compras e vendas, o especialista recomenda a ação, até pela questão tributária, já que há isenção de R$ 20 mil no total de ações vendido no mês, benefício que não vale para os ETF.
Lá fora, são muito comuns também os ETFs de renda fixa, chamados de Exchange-Traded Note (ETN). Por aqui, esses fundos também esbarram num problema fiscal: o come-cotas. Os fundos de renda fixa no Brasil têm de pagar semestralmente 15% ou 20% (dependendo do prazo médio da carteira) dos lucros a título de antecipação de imposto, nos meses de maio e novembro.
O investidor interessado em aplicar em fundos de índices deve ficar atento às taxas cobradas pelas corretoras, pois custos maiores podem corroer boa parte do retorno, explica Colombo. Além disso, como os ETFs ainda têm liquidez reduzida, é comum o aplicador encontrar diferenças grandes entre os preços de compra e venda, diz.
O mercado de ETFs na América Latina registrou crescimento de 19% em julho em relação ao mês anterior, encerrando o período com patrimônio de US$ $10 bilhões ante US$ 8,4 bilhões de julho, de acordo com relatório da BlackRock. Apesar da expansão, no acumulado do ano, os ETFs ainda registram resgates, de US$ 1,122 bilhão até julho.
A expansão foi puxada principalmente pelo México (19,7%), cujos ativos em fundos de cotas bateram US$ 8,5 bilhões ante US$ 7,1 bilhões. No caso do Brasil, o crescimento foi menor, de 14,2%, com patrimônio líquido passando de US$ 1,4 bilhão para US$ 1,6 bilhão no mês passado.
Entre os 20 maiores ETFs no mundo em patrimônio no fim de julho, o iShares MSCI Brazil Index Fund aparecia na 14ª colocação, com um total de ativos de US$ 9,479 bilhões. No ano, esse fundo de Brasil registrava resgates de US$ 1,711 bilhão, dado o patrimônio de US$ 11,190 bilhões registrado em dezembro do ano passado.
Olhando-se o mundo todo, os ETFs encerraram julho com um total de 2.282 carteiras, 4.872 listagens e patrimônio líquido de US$ 1,095 trilhão, mesmo nível registrado no mês anterior. A diferença entre o número de carteiras e o total de listagens se deve ao fato de que um mesmo fundo poder ser negociado em mais de uma bolsa. No ano, o setor registra crescimento de 5,7%.
Do total de US$ 1,095 trilhão presentes em ETFs no mundo, 67% estão nos Estados Unidos, cujo setor soma patrimônio líquido de US$ 741,3 bilhões. Já a Europa detém 25%, com um total de ativos de US$ 236,3 bilhões.

Futuro hipotecado

Folha de São Paulo
06/09/2010
Maria Inês Dolci
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Dispor do imóvel é risco maior que o necessário; hipoteca é palavrão que não deveria ser pronunciado
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HIPOTECA é uma palavra pesada, cortante e vinculada a pesadelos, à dificuldade de dormir, porque a pessoa tem uma dívida associada a um bem, hipotecado em garantia do empréstimo.
Deveria ser a última opção, usada, em situação de extrema dificuldade, para obter recursos necessários ao combate de uma doença grave, de uma falência financeira que comprometesse o futuro da família.
Um novo mundo, contudo, tem significados diferentes para velhas palavras, como essa, que, segundo o dicionário "Houaiss", já é conhecida há mais de 600 anos.
Hoje, leio abismada que se hipoteca a casa, no Brasil, para consumir. Por que alguém cometeria uma loucura dessas -arriscar-se a ficar sem imóvel para contrair um empréstimo? Pelo que se saiba, para pagar taxas de juros bem menores, com prazos de 20 a 30 anos.
Essa operação financeira tem crescido vigorosamente nos últimos anos, em alguns casos para subsidiar novos empreendimentos, como uma franquia.
E, entre as instituições que trabalham com esse, digamos, empréstimo, está uma pública, a Caixa Econômica Federal. Estamos mesmo numa economia movida a dívidas!
Contrair um financiamento habitacional, esgotadas as consultas e comparações entre as condições oferecidas pelos bancos, já não é tarefa simples. Trata-se de um compromisso por muitos anos.
Não há como mapear o futuro e dizer, com certeza, que teremos emprego e renda suficiente para bancar o financiamento. Mas, concedamos, esse é um investimento importante na vida das famílias -um lugar para morar, um teto que nos proteja das intempéries.
Nem sempre será um investimento, no sentido financeiro da palavra.
Teremos, contudo, uma moradia própria, evitando os gastos com aluguel, que, sujeitos a oscilações de mercado, não "comprarão" parcelas de um imóvel. Tem a ver mais com segurança e com vontade de ter algo em nossos nomes.
Dispor de um bem assim, adquirido com dificuldade na maioria dos casos, parece-me um risco maior do que o necessário.
Vejamos, por exemplo, um imóvel cuja hipoteca banque o investimento em uma loja franqueada. Por mais forte que seja a marca da loja, o sucesso de vendas dependerá da habilidade do franqueado. Planejamento, trabalho e dedicação são tangíveis. Tino comercial e clima econômico são intangíveis.
Se não der certo, haverá o perigo de perder um imóvel quitado, pois a operação, no Brasil, é feita com imóvel já pago, para evitar o "subprime" norte-americano, que tem alta probabilidade de calote.
Argumenta-se que a economia brasileira só cresce, nos últimos anos, devido ao aumento do crédito e que é necessário ser criativo, inventar novas formas de permitir o acesso ao consumo.
Tenho minhas dúvidas. O crédito consignado aos aposentados transformou-os em fontes de recursos para familiares e amigos não tão escrupulosos. O ideal seria aumentar a renda dos idosos com pensões e aposentadorias mais próximas do custo de vida efetivo.
Financiamento não é renda. É uma forma de facilitar o acesso a bens e a serviços mais caros pelo prolongamento do período de pagamento. Em países com taxas de juros absurdas, como o nosso, o risco de inadimplência é muito maior, ainda mais se considerarmos os baixos salários.
Não saberemos o final dessa história tão cedo, pois os empréstimos são de longo prazo. Inicialmente, as prestações costumam ser compatíveis com a renda.
Temo, porém, que, em alguns anos, comecem a estourar as dívidas escoradas nos imóveis e que, consequentemente, cidadãos percam seus únicos bens pela ilusão do dinheiro rápido, sem burocracia.
Se imaginarem que a Justiça os protegerá, releiam as reportagens publicadas nos últimos dias sobre os poupadores que perderam rendimentos por causa dos planos econômicos do passado.
Hipoteca é um palavrão que não deveria ser pronunciado nem utilizado em vão.
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MARIA INÊS DOLCI , 54, advogada formada pela USP com especialização em business, é especialista em direito do consumidor e coordenadora institucional da ProTeste Associação de Consumidores. Escreve quinzenalmente, às segundas, nesta coluna.
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