terça-feira, 25 de maio de 2010

A nova safra de ETF

Valor Econômico


 

25/05/2010


 

Por Daniele Camba e Alessandra Bellotto, de São Paulo

A iniciativa da BM&FBovespa , de abrir o mercado brasileiro de fundos de índice (os Exchange Traded Funds, ou ETFs) para novos participantes, está atraindo mais um gigante internacional, o americano State Street. Ele é o segundo maior em gestão de ETFs no mundo - um mercado com mais de US$ 1 trilhão em ativos -, atrás apenas da também americana BlackRock, que praticamente detém a exclusividade no segmento no país.

O State Street, segundo uma fonte próxima ao grupo que pediu para não ser citada, estaria negociando uma parceria com um gestor independente local para entrar na gestão de ETF no Brasil. Procurado, o grupo não confirmou nem desmentiu a informação. Do lado da asset local, o interesse estaria na expertise do Sate Street nesse mercado - que administra US$ 160 bilhões em ETFs globais -, com grande potencial de crescimento no país.

A expectativa é de que a parceria local não seja concluída a tempo de montar a estrutura operacional necessária para a participação no primeiro leilão de ETF organizado pela BM&FBovespa com o objetivo de selecionar novos gestores. O novo fundo, alvo do leilão, irá replicar o Índice Financeiro (IFNC). O cronograma com os detalhes da oferta deve sair ainda nesta semana. Além do PIBB (Papéis de Índices Brasil Bovespa), administrado pelo Itaú Unibanco, o mercado local reúne seis fundos de índice, sendo dois setoriais, de consumo e imobiliário, todos eles geridos pela BlackRock.

A asset americana já confirmou o interesse em participar do leilão, mas a bolsa também quer atrair gestores locais. Para isso, nas últimas semanas, executivos da BM&FBovespa visitaram as principais gestoras ligadas a grandes bancos, a fim de divulgar o leilão. Segundo apurou o Valor, boa parte delas ainda não tem interesse em participar do negócio. A exceção seria a Caixa Econômica Federal.

"Devemos participar do leilão, apesar de ainda não sabermos direito como serão as regras", diz a gerente nacional de produtos para terceiros da Caixa, Eliana Vincensi. Por ser a réplica de um índice fechado, ela acredita que o produto pode ser mais facilmente entendido pela pessoa física do que outros tipos de fundos de ações. "A Caixa pode usar a sua grande rede de varejo para distribuir os ETFs", acrescenta a executiva.

Já para os investidores institucionais, Eliana acredita que os fundos de índice são menos vantajosos do que carteiras exclusivas. Ela faz a ressalva, no entanto, de que o sucesso do ETF entre o pequeno investidor depende da melhora do cenário internacional e da continuidade do processo de queda da taxa Selic no longo prazo.

O Brasil deve seguir os passos dos mercados mais maduros, que perceberam a importância de estratégias passivas tanto para estimular transações em bolsa quanto para complementar o portfólio do investidor, afirma o diretor de marketing da BlackRock para América Latina e Ibéria, André Ribeiro Turquetto. "O ETF é a porta de entrada do investidor na bolsa", diz. Além de ser um instrumento simples, fácil de ser compreendido, o executivo destaca que, no caso da pessoa física, ele é bem mais barato do que uma carteira ativa de ações. Além da transparência, já que a cota é negociada em bolsa.

Nos Estados Unidos, pessoas físicas e institucionais dividem meio a meio o volume de negócios com ETFs, que já representa cerca de 20% do movimento total da Bolsa de Nova York. No Brasil, segundo Turquetto, esse é um segmento recente, ainda pouco explorado. Mas ele ressalta que a bolsa, ao pensar em mais um fundo de índice setorial, demonstrou claramente seu interesse pelos ETFs, o que é um avanço. "Como líder mundial em ETFs, com US$ 500 bilhões em ativos, e principal gestor local, a BlackRock naturalmente vai entrar no leilão", afirma.

Mas o ETF não caiu nas graças de todas as instituições. Entre os principais entraves apontados pelas gestoras de alguns bancos para entrar nesse filão, ao menos por enquanto, estaria a falta de demanda. Segundo o diretor de uma dessas assets, seria difícil oferecer o ETF a investidores institucionais cobrando uma taxa de administração de 0,75% ao ano (percentual máximo permitido pela bolsa), já que eles conseguem, com facilidade, montar carteiras exclusivas pagando menos de 0,5%. Já pelo lado da pessoas física, ele acredita que o produto é mais complexo e difícil de emplacar.

O diretor de renda variável da BM&FBovespa, Júlio Ziegelmann, rebate as críticas. Ele lembra que o 0,75% é a taxa máxima estipulada pela bolsa, mas nada impede os gestores de cobrarem menos. Sobre as pessoas físicas, o diretor destaca que elas representam 50% de todo o volume de ETF negociado nos EUA, enquanto no Brasil já movimentam quase 14%. "Existe sim um bom potencial de crescimento entre as pessoas físicas, especialmente se as assets de bancos de varejo se interessarem pelo negócio."

A participação do pequeno investidor ainda é baixa no Brasil por alguns motivos. Primeiro, porque os ganhos na renda fixa ainda são altos, o que inibe a migração para a bolsa. Outro motivo é o fato dos primeiros ETFs após o PIBB terem sido estruturados pelo Barclays, hoje BlackRock, gestores com muita relevância internacional, mas sem nenhum apelo junto ao investidor local.

Esse é um segmento que tem tudo para crescer entre os hedge funds locais, como investidores, acredita o vice-presidente da SulAmérica Investimentos, Marcelo Mello. "Para esse público, o ETF é um instrumento barato de alocação de recursos." No caso das fundações, a oferta esbarra no custo mais alto e, para a pessoa física, é preciso vencer a barreira da concorrência com os tradicionais fundos de ações do varejo.

Alguns dos gestores ouvidos pelo Valor ressaltam que o ETF do setor financeiro é um produto bastante específico e, portanto, com uma dificuldade adicional para o entendimento do investidor de varejo. Ziegelmann, da Bovespa, diz que a bolsa está aberta para criar ETFs de qualquer índice, até daqueles que ainda nem existem. "Temos o maior interesse em montar novos índices sugeridos pelas assets e os ETFs desses índices, contanto, é claro, que tenhamos algum tipo de compromisso dessas mesmas assets de participação no leilão."

Segundo o diretor de outra grande gestora de recursos, a instituição só tem interesse em participar dos futuros leilões para ETFs de índices internacionais. "Sem dúvida haverá muita demanda de investidores brasileiros para negociar ativos externos sem precisar sair do Brasil", diz o diretor. Antes, no entanto, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) terá de mudar a regra de fundos de índice, a Instrução 359, permitindo a negociação de ativos do mercado externo. A bolsa, juntamente com a Associação Brasileira das Entidades do Mercado Aberto e de Capitais (Anbima), já encaminhou para a CVM uma proposta de mudanças da Instrução, lembra Ziegelmann, da Bovespa.

Os grandes gestores também reclamam da falta de clareza sobre os critérios para a pré-qualificação para o leilão. "O ideal seria se já soubéssemos exatamente quais são as regras", diz Eliana Vincensi, da Caixa. Segundo o diretor da bolsa, os critérios ainda estão sendo definidos, mas tudo indica que serão simples, assim como o pré-requisito principal deverá ser um patrimônio mínimo sob gestão. "As regras estarão bem em linha com o que discutimos com os gestores", diz Ziegelmann.

Por fim, existe um ressentimento de alguns bancos pelo fato de a bolsa ter decidido dar exclusividade ao braço de ETF do Barclays, hoje nas mãos da BlackRock, na estruturação dos primeiros seis ETFs. Ziegelmann lembra que, na época, a bolsa precisava montar a parte técnica do produto e nada mais natural do que se unir ao "número 1" do mundo.

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