quinta-feira, 15 de maio de 2008

Maior impacto do grau de investimento será no crédito

Luciana Monteiro
Valor Econômico
15/5/2008

O maior impacto da obtenção da nota de grau de investimento conferida ao Brasil pela agência de risco Standard & Poor"s será nos ativos de renda fixa. A avaliação é de Massimo Tosato, vice-presidente mundial da gestora britânica Schroders, instituição com US$ 270 bilhões sob gestão, dos quais US$ 10 bilhões aplicados em ativos brasileiros por investidores internacionais. Em entrevista ao Valor, o executivo diz que o "investment grade" certamente é uma boa notícia para o país, mas seu efeito só deverá ser sentido totalmente quando outra agência de risco elevar a nota do Brasil.

No mercado acionário, Tosato avalia que boa parte do impacto do selo já foi precificado, pois os agentes já estavam vendo o progresso do país nos últimos anos. "O maior impacto será visto na renda fixa, já que quando compra ações, o investidor olha muito mais para a empresa do que para o país, diferentemente do que acontece com a renda fixa." No time dos mercados emergentes, a gestora tem cerca de US$ 30 bilhões em ações , dos quais, boa parte estão nos BRICs (abreviação de Brasil, Rússia, Índia e China). Ele ressalta que a classificação de risco de investimentos no Brasil está agora igual à da Índia, mas ainda abaixo das de México, Rússia e China. "Então, ainda há muito trabalho para ser feito."

Na avaliação de Tosato, o Brasil se mostra como uma das maiores oportunidades mundiais por conta de seu tamanho e potencial de crescimento. Para ele, o país tende a se tornar um dos maiores mercados de gestão de recursos no mundo. Pelos dados do Investment Company Institute (ICI), o Brasil já era o décimo país em volume de recursos aplicados em fundos, com US$ 615,365 bilhões, em dezembro do ano passado.

No Brasil, a Schroders ainda tem um percentual pequeno diante do total da gestora, com R$ 3,2 bilhões sob administração. "Mas é preciso considerar a maturidade do mercado", diz Tosato, lembrando que o setor de gestão de recursos dos Estados Unidos, Reino Unidos e mesmo do Japão já tem pelo menos 40 ou 50 anos. "É preciso tempo para refletir a diferença." Os EUA hoje, sozinhos, têm 48% do total de ativos no mundo.

Ele lembra que, da primeira vez que esteve no Brasil, em 2004, a taxa de juros era de 19% ao ano e agora está 11,75%. "Há, claramente, um progresso, passo a passo, e, apesar de o Banco Central ter aumento o juro (em abril), isso pode ser visto como um sinal de disciplina e independência financeira, o que para o investidor é positivo", diz. Os juros continuam altos, mas, quando observados historicamente, é possível ver que a taxa já caiu bastante. "Hoje, por conta dos altos preços das commodities, há uma pressão inflacionária, mas se mantidas as políticas de melhorias econômicas, o país poderás ver visto como uma experiência onde a taxa ficou bastante competitiva e isso é o que as pessoas levam em consideração ao olhar o risco."

Tosato cita o exemplo da Itália, seu país de origem. Em 1981, a taxa de juros no país era de 22% ao ano e, com com um melhor gerenciamento, gradualmente caiu para 4,5%, levando o investidor a olhar mais para ações. "Naquela época, havia muito dinheiro em títulos públicos e, mesmo com as taxas de juros caindo, a migração para ações leva tempo, mas, à medida que a taxa vai caindo, as pessoas começam a aceitar mais o risco e o investimento em renda variável torna-se mais competitivo", avalia.

Embora o percentual dos investimentos em ações seja ainda pequeno, com participação de 6,72%, segundo dados do site financeiro Fortuna, a fatia deve crescer, avalia Beto Scretas, diretor-geral da Schroders Brasil. "Já vimos as aplicações em ações crescerem no ano passado; elas diminuíram agora por conta da turbulência e do aumento dos juros, mas a migração é uma tendência", diz. "As taxas brasileiras irão convergir para níveis mais decentes e, quando isso acontecer, o investidor buscará de forma mais forte a renda variável."

Diante da expectativa de maior diversificação das aplicações de brasileiros, a gestora estuda um fundo que possa investir 100% dos recursos no exterior para os chamados clientes superqualificados - com pelo menos R$ 1 milhão para aplicar. "Claro que é difícil competir com a taxa de juros do Brasil e, para os clientes brasileiros, pode não fazer muito sentido, mas nós não estamos preocupados somente em trazer produtos para o Brasil, mas trabalhar com serviços", diz Eduardo Mendes, que está assumindo a direção geral da área de distribuição da Schroders substituindo Adriano Koelle, que deixou a empresa. "É preciso também um processo de entendimento dos riscos de se investir no mercado internacional", diz Mendes, que era responsável pela área de distribuição de produtos para os segmentos de varejo e private.

Com relação à crise americana, Tosato avalia que há dois componentes. O primeiro diz respeito ao segmento imobiliário e de papéis hipotecários. "Nesse caso, os riscos foram claramente mal gerenciados e a crise ainda vai levar mais um tempo para passar, dois ou três anos", diz.

Outro problema será com a liquidez por conta da menor credibilidade. "Nós estivemos muito próximos de um colapso do sistema financeiro por duas vezes: em agosto do ano passado e março deste ano", diz. "Uma crise eclode não quando se perde dinheiro, mas quando não há mais dinheiro, e o sistema estava com falta de liquidez por ausência de confiança." Na visão de Tosato, essa segunda parte da crise, de risco de quebra, ficou para trás, já que os principais bancos centrais garantiram liquidez, mostrando que não deixarão nenhum banco quebrar.

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