quarta-feira, 13 de janeiro de 2010

Bolsa contagia previdência

Valor Econômico

Por Antonio Perez, de São Paulo
13/01/2010

A arrancada da bolsa no segundo semestre de 2009 contagiou os fundos de previdência aberta (PGBL e VGBL). Atraídos pela alta de 82,66% do Ibovespa no ano passado, os investidores acorreram aos fundos que aplicam parte do patrimônio em ações, revela estudo das consultorias NetQuant e Towers Perrin com 413 carteiras. Segundo o levantamento, a captação líquida dos fundos com ações atingiu R$ 7,93 bilhões em 2009, 36,37% da captação total da indústria, de R$ 21,82 bilhões. Em 2008, os fundos com ações haviam atraído R$ 2,53 bilhões, apenas 19,1% do total, de R$ 13,25 bilhões.

Os fundos de previdência que aplicam em ações são divididos em três subcategorias segundo a participação da renda variável no patrimônio (até 15%, 30% e 49%). Depois de amargar queda de 10,25% em 2008, os fundos com até 49% em ações lideraram a rentabilidade, com alta de 28,86% no ano passado.

As aplicações com até 30% em ações ficaram em segundo lugar, com valorização de 19,99%. Na terceira posição, os fundos com até 15% subiram 14,08%. Os fundos de renda fixa fecharam 2009 com rentabilidade de 8,66%, superando o desempenho dos multimercados sem renda variável, que avançaram 8,44%.

Com a dobradinha rentabilidade e captação líquida, o patrimônio dos fundos com ações cresceu 56,97% em 2009, atingindo R$ 35,77 bilhões, após avanço de 4,37% em 2008. O patrimônio dos fundos sem aplicação em ações aumentou 24,97%, de R$ 87,88 bilhões para R$ 109,82 bilhões. Ao todo, o patrimônio da indústria cresceu 31,56%, passando de R$ 110,67 bilhões para R$ 145,60 bilhões.

Para analistas, a revanche dos fundos com ações em 2009 pode indicar que começou a tão esperada migração de parte relevante do patrimônio da previdência para a renda variável.

Luciano Snel, diretor de produto Icatu Hartford, identifica uma trajetória sem volta rumo à representatividade cada vez maior da renda variável. "É natural a captação desacelerar um pouco se a bolsa vai mal e o patrimônio cair", diz Snel. "Mas a tendência é de aumento dos fundos com ações".

Em 2008, as captações dos fundos com ações representaram 53% do total amealhado pela Icatu Hartford. Já no ano passado, esses fundos responderam por 65% do total captado. No ranking elaborado pela NetQuant e Towers Perrin, a Icatu Hartford é a sétima em patrimônio (R$ 2,94 bilhões) e a oitava em captação líquida (R$ 391,7 milhões).

Os números da NetQuant são similares aos da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima), que mostram captação líquida total de R$ 23,34 bilhões em 2009, da qual devem ser descontados R$ 4,61 bilhões da reclassificação de dois fundos de renda fixa em previdência. O patrimônio total do setor é de R$ 148,86 bilhões.

Apesar do crescimento expressivo em 2009, os fundos de renda variável ainda ocupam parte pequena do patrimônio total, aponta o estudo. A participação de mercado dos fundos com até 49% em ações subiu de 7,90% para 10,10%. A participação dos fundos com até 30% avançou de 7,90% para 8,66%, e a das aplicações com até 15%, de 4,79% para 5,81%.

A liderança é dos fundos de renda fixa, cuja participação de mercado caiu de 44,78% em 2008 para 43,05% no ano passado. Os multimercados sem renda variável também perderam espaço, passando de 34,62% para 32,38%.

O diretor-geral da Bradesco Vida e Previdência, Lúcio Flávio Oliveira, também vê uma tendência clara de aumento do patrimônio dos fundos com ações. Cabe às seguradoras, avalia, evitar oscilações abruptas na captação líquida e garantir que o aumento da renda variável na indústria seja "virtuoso". A análise do perfil do investidor é fundamental para evitar que haja corridas cada vez que a bolsa tropece. "É preciso qualificar a oferta", recomenda Oliveira.

A Bradesco Vida e Previdência aposta em consultores dedicados exclusivamente à previdência, chamados de especialistas. Em 2009, a renda variável foi responsável por cerca de 58% de toda captação líquida. A companhia lidera o ranking elaborado pela NetQuant e Towers Perrin por patrimônio líquido (R$ 46,87 bilhões) e aparece em terceiro na captação líquida (R$ 4,68 bilhões).

Para Osvaldo Nascimento, diretor de produtos de investimento e previdência do Itaú Unibanco, uma avaliação da carteira completa do investidor é condição preliminar para determinar quanto será alocado em ações. "A tendência é que a previdência, no contexto do portfólio do investidor, tenha mais renda variável", afirma.

Nascimento trabalha com crescimento de 25% das captações este ano, após avanço de 20% em 2009. Os fundos de previdência do Itaú Unibanco fecharam 2009 com 20% do patrimônio em renda variável. A instituição ficou em segundo no ranking das consultorias, tanto em patrimônio (R$ 38,08 bilhões) quanto em captação (R$ 4,79 bilhões).

Mas Marcelo Nazareth, sócio-diretor da NetQuant, responsável pela pesquisa, é cético em relação a uma mudança estrutural na indústria de previdência.

A expectativa dele é de manutenção do crescimento acelerado da captação líquida dos fundos com ações nos primeiros meses, tempo em que os investidores ainda terão na memória a forte valorização de 2009.

Se a bolsa chacolhar este ano, porém, pode-se assistir a uma revoada dos fundos de renda variável. "Já vimos este filme antes, o investidor em previdência privada ainda é muito instável", afirma Nazareth.

Para Renato Russo, vice-presidente de Vida e Previdência da SulAmérica - que aparece na nona posição em patrimônio (R$ 1,52 bilhão) e na décima em captação líquida (R$ 248,4 milhões) -, não dá para chamar a movimentação de 2009 de "mudança estrutural". Ele lembra que a taxa básica de juros Selic permanece, apesar das reduções de 2009, "relativamente alta" e pode até subir este ano, o que compromete um avanço mais expressivo das captações em renda variável. "O custo de oportunidade ainda é alto, não há pressa dos investidores em assumir uma posição de risco maior", diz Russo. "Essa mudança para renda variável vai demorar para se consolidar", conclui o executivo da SulAmérica.

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