quarta-feira, 12 de dezembro de 2007

Os IPOs e os novatos: "Ah, se arrependimento matasse!"

Valor Econômico
Gabriel Cintra
12/12/2007



Os tão falados IPOs (ofertas públicas iniciais de ações) têm sido uma importante ferramenta de atração de novos investidores para a bolsa. Parte desse público, principalmente jovens sem histórico em mercado acionário, ouve casos de grandes lucros de conhecidos e trabalha com o pensamento de que o sucesso passado é garantia de lucro no futuro.


Na realidade, a história não é bem assim. Embora a maioria dos IPOs tenha sido extremamente bem-sucedida, com diversos casos de desempenho muito acima do esperado, cabe ao novo investidor fazer uma análise completa do terreno em que começará a pisar: quais são as condições do mercado, da empresa e de seu setor, dar a devida atenção ao prospecto (por mais complexo que ele possa parecer), buscar saber quais as perspectivas pontuais para aquela empresa que vai abrir o capital.


Também é muito importante saber o porquê daquela empresa estar abrindo seu capital, afinal trata-se de uma maneira estratégica de captar recursos. A empresa busca dinheiro para novos investimentos, expansão, aquisições? Para onde vai o seu capital?


Uma parcela dos estreantes entra na bolsa com informações suficientes para lidar com investimentos de risco, sendo bem assessorados por corretores e analistas. Adquirem, assim, noção de longo prazo, a mecânica do mercado acionário, etc. Mas, em outra parcela, persiste uma pergunta cada vez mais freqüente: se o IPO de tal empresa rendeu tanto de lucro, então eu vou entrar neste e vou ganhar com certeza?


A pergunta que pode soar ingênua para alguns tem muita valia para essas pessoas. Se elas não se dessem ao trabalho de perguntar, não teriam o esclarecimento de que ganho passado não quer dizer lucro futuro. Ou que um exemplo bem-sucedido de um IPO não quer dizer que será repetido em um outro, pois as empresas são diferentes, os números são outros e até o mercado pode estar vivendo um humor distinto.


O papel do corretor ou do assessor de investimentos nesta etapa também é crucial para ajudar o investidor que ainda está iniciando no mercado de ações. No Ação Jovem, por exemplo, procuramos enfatizar aos jovens investidores que se informem da maneira mais completa possível com seus pares.


Outra questão crucial que se abre diante dos sucessos dos recentes IPOs é a realização do lucro precoce - são os chamados "flippers" (que tentam surfar na onda e vender logo na estréia). Há aí dois pontos a serem analisados: o primeiro é a questão já citada sob a ótica de longo prazo. Um investimento no IPO é um investimento em ação e deve ser analisado pelo mesmo critério.


Uma valorização grande no dia do lançamento pode gerar, porém, a vontade de realização. Isso pode ser um desperdício de oportunidade, já que as empresas não alteram sua perspectivas do dia para a noite e os papéis podem continuar se valorizando posteriormente. Basta olhar para IPOs recentes que deram uma bela rentabilidade no primeiro dia, mas continuaram subindo posteriormente. Ah, se arrependimento matasse! Mas a experiência serve para isso, e novos investidores têm muito a aprender com erros, e acertos também.


Por outro aspecto, um ponto que deve ser analisado, e agora pensando como economista, é o custo de oportunidade. Ora, um retorno de mais de 20% corresponde a quase o dobro da rentabilidade do CDI de hoje. Como não sair?


O importante neste caso é pré-determinar um limite pessoal de ganho, em que haja o incentivo para a realização. E que não gere arrependimentos futuros.


Voltando aos IPOs em si, cada vez mais empresas de setores outrora inimagináveis na bolsa estão fazendo suas ofertas iniciais. Quem diria há cinco anos que uma instituição de ensino, por exemplo, abriria capital? Hoje, vemos empresas deste setor na Bovespa com um bom desempenho. Há ainda empresas abrindo capital baseadas em projetos, sem sequer existirem ainda.


O que temos visto é uma demanda forte pelos papéis e, por causa da chamada Lei do Silêncio, muitas informações não têm permissão para ser divulgadas, tais como projeções e perspectivas. Diante disto, como analisar a inexperiência dentro do mercado? Como saber o comportamento futuro de um papel do qual não temos um benchmark? Há indícios de como é possível fazer uma análise mais profunda para se embasar nestes casos.


Quando há uma marca por trás da empresa, bem falada, com gestores conhecidos e bem-sucedidos, uma empresa líder no seu setor, já há pistas e o cheiro de um bom investimento. Empresas que pela natureza do seu negócio já são benquistas no mercado também saem com um pé na frente rumo à bolsa. E o que temos notado também é que um IPO dentro de um setor estreante no pregão acaba puxando concorrentes para a corrida do mercado. Foi o que ocorreu recentemente com o setor imobiliário e com os bancos médios. E com sucesso.


Os IPOs podem ser, portanto, bons negócios. Mas vale sempre lembrar: cada IPO é uma situação diferente - e rentabilidade passada não é garantia de lucro futuro, como dizem todos os prospectos.


Gabriel Cintra, economista, é presidente do Ação Jovem do Mercado Financeiro e de Capitais.


E-mail: ajmca@jmc.com.br


Este artigo reflete as opiniões do autor, e não do jornal Valor Econômico. O jornal não se responsabiliza e nem pode ser responsabilizado pelas informações acima ou por prejuízos de qualquer natureza em decorrência do uso destas informações.

Nenhum comentário:

Locations of visitors to this page