quarta-feira, 14 de julho de 2010

Linha direta com o dividendo

Fundos de ações creditam o lucro distribuído pelas empresas direto na conta do cliente, o que reduz o imposto pago pelo investidor.

Valor Econômico

    Por Angelo Pavini, de São Paulo
    14/07/2010

 

Os fundos de dividendos, que selecionam as empresas que regularmente distribuem bons lucros aos acionistas, fazem sucesso entre os investidores mais conservadores como uma alternativa de aplicar em ações e ter um rendimento relativamente garantido. Mas alguns fundos têm um diferencial: em vez de incluir o dividendo no valor das cotas, eles o creditam diretamente na conta do cliente.

A principal vantagem desse tipo de estratégia é fiscal. O dividendo é isento de imposto de renda para pessoas físicas, pois a empresa já pagou os impostos antes de distribuir o lucro. Se ele é somado à cota do fundo, como a maioria dos gestores faz, o dividendo passa a estar sujeito à tributação de 15% que incide nos resgates das carteiras. Ou seja, ao entrar direto na conta do investidor, não há essa dupla cobrança. Em alguns casos, há ainda a redução do valor pago ao gestor, pois a taxa de administração não incide sobre o dividendo.

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A diferença pode parecer pequena, já que os dividendos representam um percentual reduzido dos ganhos, entre 5% e 10% do valor das carteiras. Mas, ao longo dos anos, a economia pode atingir quantias expressivas. "Calculamos que, em dez anos, em uma aplicação de R$ 1 milhão e com um retorno em dividendos de 7,5% ao ano, investidor economizaria R$ 250 mil", afirma Clecius Peixoto, sócio da Vinci Gas Investimentos. A casa tem um fundo, o Gas Dividendos, que adota esse sistema.

Outra vantagem do crédito dos dividendos em conta é que o investidor passa a ter uma fonte de recursos regular sem precisar sacar o dinheiro do fundo, explica Maurício Gallego Augusto, sócio da Set Investimentos. Apesar de o fundo da casa não ser uma carteira de dividendos, o Set FIA também credita os valores pagos pelas empresas direto na conta dos investidores a cada seis meses. "Uma cliente ficou contente, porque ia sacar recursos do fundo para pagar IPVA e IPTU e não precisou", diz.

Alguns bancos oferecem esse tipo de fundo para clientes de alta renda, no private bank. No varejo, há apenas duas carteiras duas opções, ambas do Itaú Unibanco. O Uniclass Dividendo foi o pioneiro. Criado em 2006, ele credita os dividendos para os clientes no mês em que eles são pagos pela empresa. Com aplicação mínima de R$ 1 mil, ele tem taxa de administração de 4% ao ano. O modelo foi replicado pelo Itaú no Personnalité Renda Dividendo, que tem aplicação de R$ 2 mil e igual taxa de administração.

A estratégia dos dois fundos do Itaú Unibanco é a mesma: investir em empresas que deem retornos em dividendos (ou "dividend yield") 50% acima da média de mercado, explica Walter Mendes, superintendente de renda variável da Itaú Asset Management. "Não é um compromisso, é um tipo de controle de qualidade do fundo", diz. Assim, se o "dividend yield" das empresas do Ibovespa está hoje entre 3% e 4% ao ano, o fundo tem de procurar empresas que paguem ao menos 4,5% a 6% ao ano em dividendos.

Uma desvantagem para quem recebe o valor em conta é que o cliente tem de reaplicar o valor no fundo por conta própria, avalia Mendes. "Mas, em outros países, essa estratégia de pagar separado é mais comum, não só em carteiras de dividendos, mas em fundos de ações em geral", diz.

Ele observa que o investidor não pode comparar os fundos que distribuem dividendos com os demais, ou mesmo com os índices de bolsa. "Todos os outros incluem em suas variações os dividendos, que aparecem como ganho nas cotas ou nos pontos dos índices", diz. Já os fundos que pagam por fora têm esse ganho à parte, não nas cotas.

A solução para isso encontrada pela Gas é calcular a rentabilidade do fundo das duas formas, com e sem o dividendo creditado. Assim, a carteira, criada em setembro de 2005, rendeu até 12 de julho 83,60% sem os dividendos e 163,27% com a reaplicação dos dividendos. O Ibovespa no período se valorizou 109,34%. "Operacionalmente, é um fundo mais complicado, porque precisa ter um controle de todos os valores de dividendos para cada cliente em separado", afirma Peixoto, da Vinci Gas.

Os fundos de dividendos são por definição carteiras defensivas de longo prazo, diz Peixoto. "São empresas com baixo endividamento, estabilizadas, e que estão ganhando dinheiro." Assim, esses fundos tendem a cair menos que o mercado em momentos de crise, mas também sobem menos em momentos de euforia. Peixoto estima que o fundo da Gas, que paga os dividendos trimestralmente, distribuiu o equivalente a 7,5% em média ao ano desde 2006. Em 2010, o pagamento, de R$ 2,585 milhões, já equivale a 4,5% da carteira de R$ 71 milhões. O percentual deve chegar a 7% até o fim do ano.

O fundo tem 19 papéis, alguns dos quais já pagam dividendos com regularidade, com retornos de até 10% ao ano. Outros ainda vão pagar daqui dois anos. "Há desde empresas como Coelce, Eletropaulo, até metalúrgicas, como Gerdau, que representa uma diversificação."

Somente no dia 7, o fundo de ações da Set distribuiu R$ 1,710 milhão em dividendos aos 35 cotistas, o maior valor de sua história, diz Sérgio Fontana dos Reis, fundador da gestora. "Fazemos o pagamento a cada seis meses, mas o maior valor que já tínhamos pago era de R$ 338 mil", afirma Reis. O valor pago neste mês presenta R$ 0,40 por cota de R$ 21,40, ou 1,87%. "O recorde anterior era R$ 0,21", diz. Do total pago, 80%, ou R$ 1,4 milhão, foram reinvestidos no fundo.

Reis observa que, com esse sistema, o investidor economiza mais que o imposto. "Como não há cobrança de taxa de administração, a economia do investidor pode chegar a 18%, 15% do imposto de renda e 3% dos serviços", diz. Por isso, explica, muitos gestores não gostam de usar esse sistema. "Os administradores de fundos também não gostam, porque isso representa muito mais trabalho, de controle de cada cotista e dos dividendos", diz. Segundo ele, o fundo, criado em 2008 a partir de dois clubes de ações que existiam desde 1998, apresenta retorno médio em dividendos de 3% ao ano, apesar de esse não ser seu foco. Neste ano, o volume pago cresceu porque as empresas, passado o pior da crise, distribuíram mais lucros, afirma o executivo. O Set tem mais R$ 400 mil provisionados para distribuir aos cotistas em janeiro do ano que vem.

Mendes, do Itaú, observa que, no curto prazo, com a economia crescendo e as empresas investindo, o dividendo pode cair porque as empresas vão usar uma parte maior do lucro para ampliar sua capacidade. Mais adiante, porém, essas empresas devem se consolidar e voltar a distribuir lucros. Ele estima que o Ibovespa deve ter um "dividend yield" de 8% este ano.

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