terça-feira, 29 de junho de 2010

Passado e futuro nas decisões de investimentos em fundos

Valor Econômico

29/06/2010

Marcelo D ' Agosto

A preocupação do investidor quando faz uma aplicação financeira qualquer é com o comportamento futuro de seu investimento. Questões tais como quanto será o retorno, quando os recursos estarão disponíveis para resgate ou qual a chance de alguma coisa dar errado refletem as suas principais inquietações.

No entanto, antes de tomar suas decisões, o investidor tende a gastar um tempo considerável avaliando o comportamento passado das alternativas de investimento disponíveis. Esse comportamento é particularmente marcante nas aplicações em fundos de investimento. A expectativa do investidor é de que a rentabilidade passada do fundo revele, de alguma forma, uma pista sobre como será seu comportamento futuro.

A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) sugere ao investidor cautela com a análise do passado. Por determinação, sempre que o material de divulgação do fundo apresente informações referentes à rentabilidade ocorrida em períodos anteriores, obrigatoriamente aparece em destaque a advertência de que a rentabilidade obtida no passado não representa garantia de resultados futuros. Por outro lado, a análise da rentabilidade passada pode revelar alguns dados intrigantes e dar ao investidor alguma sensibilidade em relação ao futuro.

Uma situação interessante pode ser constatada pelo investidor no reformulado boletim mensal de fundos de investimento preparado pela Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima) e divulgado no site da associação. Na página 4 do boletim surge em destaque o desempenho médio dos fundos da categoria multimercados long and short - direcional, com rentabilidade de 1,18% em maio. No ano de 2010, entretanto, a rentabilidade média dos fundos dessa categoria foi de 2,86%, inferior ao CDI. Em 12 meses a rentabilidade média foi de 11,42%, inferior à media dos fundos da categoria long and short - neutro, dos multimercados macro e dos fundos de ações. Fica evidenciada as razões para a CVM alertar o investidor sobre os cuidados com a análise da rentabilidade passada.

Mais interessante do que os dados do desempenho médio dos fundos de cada categoria é a tabela de rentabilidade dos principais parâmetros de referência, na mesma página do boletim. A Anbima calcula uma série de indicadores de desempenho baseados em carteiras teóricas de ativos financeiros, entre eles o IMA-S e o IRF-M. O IMA-S mede a rentabilidade média de uma carteira de títulos públicos federais indexados à taxa Selic e o IRF-M mede a rentabilidade de uma carteira de títulos públicos federais prefixados.

Nesses 5 primeiros meses de 2010 um dos principais temas dos analistas foi a necessidade de o Banco Central elevar os juros para controlar o ritmo de crescimento da economia e administrar o comportamento da taxa de inflação. De fato, os dados acabaram mostrando um crescimento acentuado do PIB e a tendência de alta da inflação, o que ocasionou efetivamente a elevação da taxa Selic pelo Banco Central.

Nesse cenário era de se esperar que os títulos indexados à taxa Selic tivessem desempenho superior aos títulos prefixados. Isso porque uma alta da taxa de juros aumenta a remuneração dos títulos indexados à taxa Selic e tende a derrubar o preço dos títulos prefixados. No entanto o IMA-S apresentou alta de 3,48% e o IRF-M teve alta de 4,64%. Apesar das projeções econômicas terem sido confirmadas, o desempenho dos ativos financeiros foi o oposto do esperado.

Ou seja, mesmo que o investidor tivesse uma boa leitura do mercado e apostasse numa estratégia coerente com essa visão, por exemplo por meio da aplicação em fundos DI e saques nos fundos de renda fixa, ele teria um desempenho inferior ao de outro investidor que mantivesse sua carteira distribuída igualmente entre fundos DI e de renda fixa.

Esse ponto, pinçado de uma situação específica, ilustra a dificuldade para o investidor tirar proveito de tendências do mercado, mesmo quando as projeções para o futuro se confirmam. Por outro lado, a busca pela escolha de aplicações que deverão ter o melhor desempenho futuro não pode ser desconsiderada, da mesma forma como a avaliação dos dados passados da aplicação para identificar alguns padrões de comportamento, mesmo que voláteis.

A forma mais segura para o investidor administrar sua carteira é combinar as análises do passado com as projeções futuras. Isso ocorre a partir da determinação de algumas classes de ativos consideradas estratégicas para seus investimentos. Depois o investidor pode fazer alguns desvios táticos, buscando ganhos com apostas em determinadas aplicações por um prazo relativamente curto.

Marcelo D " Agosto é consultor de investimentos e autor do livro "Como escolher o melhor fundo de investimento"

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