terça-feira, 15 de abril de 2008

Futuro incerto

Valor Econômico
Por Danilo Fariello, de São Paulo
15/04/2008


A previdência privada aberta arregimenta um exército de novos aplicadores a cada ano. Apenas em 2007, 1 milhão de pessoas resolveu guardar para o futuro, segundo dados da Superintendência de Seguros Privados (Susep). Já são 12,6 milhões as contas de planos tradicional, PGBL ou VGBL. No entanto, o mercado vê, a cada ano, uma parte expressiva dos recursos escoar por meio de resgates. Em 2007, para R$ 28,2 bilhões que entraram em previdência, R$ 12,1 bilhões foram sacados. Esse volume de saques representa 43% da quantia de depósitos, ou 10% das reservas, uma parcela elevada dada a história bastante recente dos planos de previdência no Brasil.


Se esses saques ocorrerem pouco depois da aplicação - o que não se pode calcular com precisão -, a eficiência dos planos fica restrita. A previdência privada apresenta vantagens tributárias em relação a fundos de investimento, por exemplo, apenas em períodos acima de cinco, dez anos, dependendo do produto. "Muitos investidores ainda têm dificuldades em ver a previdência privada como uma reserva de longo prazo", diz André Silva Oliveira, chefe da Divisão de Estudos Econômicos da Susep.


A impressão é de que os participantes de renda mais baixa têm mais dificuldade em permanecer por mais tempo nos planos. No caso do VGBL, por exemplo, produto mais popular e criado em 2001, os resgates no ano passado representaram 14% das reservas no fim de 2007. Esse mesmo valor, comparativamente às reservas existentes em 2004, representou 40%. O número mostra a falta de planejamento de longo prazo, já que é impossível que, em tão pouco tempo, haja tantos investidores maduros para receberem os benefícios. Para os demais modelos de previdência privada aberta, a média de saques foi de 7% das reservas em 2007.


A maior empresa do setor, a Bradesco Vida e Previdência, por exemplo, acredita desempenhar um bom trabalho ao conseguir que 72% dos recursos permaneçam por, no mínimo, três anos. Isso é acima da média da América Latina, diz seu presidente, Marco Antonio Rossi. Quando o brasileiro precisa de recursos no curto prazo, ele não resiste a sacar, comenta. Por isso a saída maior. "Isso tende a mudar conforme o participante passar a dar mais prioridade à previdência privada", diz Rossi.


O ritmo de saques já foi maior, quando ainda era maciço o uso do PGBL pelas empresas para pagamentos de bônus aos funcionários e a Receita era mais flexível quanto a técnicas de planejamento tributário. Em 2005, o resgate chegou à metade do que havia sido aplicado no ano. No caso do PGBL, a proporção dos saques perante os depósitos chegou a 68%. De lá para cá, porém, esses percentuais vêm caindo.


No ano passado, o equivalente a 43% do volume investido em planos de previdência foi resgatado (não necessariamente o dinheiro que entrou em um ano saiu no mesmo exercício). Embora essa proporção tenha caído, a parcela ainda é considerada elevada por diretores da Federação Nacional da Previdência Privada e Vida (Fenaprevi). Oliveira, da Susep, destaca, porém que se deve ter mais preocupação com o volume de resgates como proporção das reservas dos planos, que vem caindo com mais rapidez. Desde 2005, o volume de resgates de todo setor caiu de 14% do total de reservas para 10% de quase R$ 120 bilhões no fim do ano passado. Os dados da Susep não consideram a migração entre planos de previdência, observa Oliveira.


Esse é um mercado ainda em consolidação, porque a noção de investimento de longo prazo no país é relativamente recente, diz Tarcísio Godoy, presidente da Brasilprev. "O país ainda está criando essa cultura, aprendendo qual o melhor tipo de benefício", diz. A Brasilprev afirma que menos recursos são resgatados em média por lá. Ao ano, são sacados apenas 6,5% do volume total de reservas, diz Godoy. Para ele, a diferença para a média do mercado se dá no atendimento ao participante e na explicação da natureza de longo prazo dos planos. Mas ele não descarta a possibilidade que haja no mercado aquele investidor que "erra a mão" e acaba investindo mais em previdência do que deveria.


Godoy explica, ainda, outro fator que pode estar levando os participantes a sacar o dinheiro do PGBL ou do VGBL. "Com o mercado de consumo mais aquecido, a propensão marginal a poupar diminui." Segundo Rossi, a compra de imóveis é a segunda maior causa de resgates prematuros dos planos da seguradora - depois da necessidade de quitar dívidas e outros gastos no curto prazo.


Nesse sentido, há um entrave legal para reduzir os resgates. Apesar de a Lei da Blindagem dos planos - que segrega os ativos dos participantes daqueles das seguradoras e, portanto, permite o uso desses recursos como lastro de empréstimos imobiliários - ter sido aprovada em 2005, sua regulamentação não saiu, o que impede as seguradoras de lançarem os planos blindados. Ainda assim, o mercado estuda alternativas para os saques para compra de imóveis. "Estudamos na Bradesco uma maneira de conceder empréstimos imobiliários mais em conta com base nos recursos de previdência aberta, como ocorre nos planos fechados, mesmo sem a blindagem", diz Rossi. "O sonho da casa própria ainda é mais forte do que o sonho da previdência privada."


Além da necessidade com gastos imediatos ou a quitação de dívidas e a aquisição de imóvel, também pode estimular os resgates dos planos de previdência a rentabilidade menor dos ativos, com os seguidos cortes na taxa de juros que ocorreram nos últimos anos. No entanto, Godoy acredita que esse fato estimule mais a migração da renda fixa para planos com renda variável do que o resgate dos recursos.


A tendência de os participantes permanecerem mais tempo nos planos é esperada pelo setor tanto pela maior conscientização das pessoas como pela popularização da tabela regressiva de imposto de renda, cuja alíquota cai de 35% a 10% se o participante permanecer mais de dez anos com os recursos aportados no plano. Assim, o plano necessariamente só fica interessante depois de alguns anos.

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