quarta-feira, 2 de janeiro de 2008

Bem-vindo ao ano do rato

Valor Econômico
Por Angelo Pavini e Luciana Monteiro, de São Paulo
02/01/2008


Astuto e oportunista, o rato é o animal que irá reger 2008, de acordo com o horóscopo chinês, mas é o dragão que concentrará as atenções neste ano. O fantasma da inflação voltou a rondar as economias do mundo todo, o que fez com que a crença de cortes da taxa básica de juro no segundo semestre de 2008 perdesse adeptos. Já para as bolsas, as previsões astrológicas do livro "Seu Horóscopo Chinês para 2008", de Neil Somerville, dizem que os mercados de ações em todo o mundo estarão muito flutuantes. Mas, apesar das tendências econômicas favoráveis, o ano não será para extravagâncias. Verdade ou não, astrólogos e economistas concordam num ponto: assim como os roedores, os investidores terão de trabalhar muito e estar atentos para aproveitar as oportunidades, hoje muito mais raras, para obter ganhos diferenciados.


Depois de o Índice Bovespa encerrar o ano com ganho de 43,65% após cinco anos de altas consecutivas, será necessário peneirar mais para achar os tesouros da bolsa. Na renda fixa, o coro dos economistas que acreditam que a trajetória da taxa de juros é de baixa neste ano perde cada vez mais força ante uma inflação medida pelo IGP-M de 7,75%. "Lá fora, o crescimento está diminuindo, o que aumenta a possibilidade de estagflação", lembra André Schibuola, sócio da Precision Asset Management. "Já por aqui, o crescimento da economia continua, o que traz preocupação com uma inflação ainda maior." Mas, se o Banco Central (BC) decidir elevar um pouco o juro, aumentará o fluxo de recursos estrangeiros para o país, o dólar cairá e reduzirá o IGP-M, índice que têm forte concentração em produtos cotados na moeda americana, lembra.


A grande dúvida do mercado não é mais quando o BC vai reduzir os juros, mas sim se ele vai puxar as taxas por conta da inflação, avalia Reinaldo Le Grazie, da Banif-Nitor. "E isso não vai acabar em março, como alguns acham, as taxas devem ficar pressionadas por mais tempo", diz. Segundo ele, várias consultorias que projetavam três cortes nos juros em 2008 agora trabalham com estabilidade, um primeiro sinal de que o juro pode subir. Vão influenciar essas expectativas, no entanto, os preços das commodities e a pressão dos alimentos tanto aqui quanto no exterior.


Na opinião do economista, o cenário econômico é de espiral inflacionária e, a menos que a economia mundial tenha um tombo, os preços podem não cair. "A inflação não vai ter descanso, o mercado aqui está aquecido, o lado fiscal frouxo, temos crédito abundante e economia crescendo", diz Grazie, acrescentando, porém, que o país está ganhando produtividade com a queda do dólar e os investimentos das empresas. "Esses fatores justificam o BC esperar antes de subir as taxas", diz.


Diante de tantas dúvidas, a recomendação de Grazie para o investidor é de se proteger em papéis indexados aos juros, ou seja, LFTs e fundos DI. Em 2007, os DIs tiveram ganho médio de 11,63% até o dia 24 - retorno levemente inferior aos 12,07% dos fundos de renda fixa que podem aplicar em papéis prefixados no período. O CDI encerrou o ano em 11,81%. O especialista não recomenda papéis em inflação, apesar do cenário de alta dos preços. "Se o BC subir os juros, não adianta, os papéis em inflação vão sofrer pois seus juros além do IPCA são prefixados", lembra. Para ele, o investidor deve resistir à tentação de comprar papéis pré até o fim do primeiro semestre. "É melhor esperar", aconselha.


Mas há muitos otimistas, mesmo que moderadamente. Ronaldo Patah, da Unibanco Asset Management, vê um cenário ainda com dois cortes de juros no segundo semestre deste ano, mas ressalva que, se o IPCA dos três primeiros meses de 2008 vier mais forte, poderá haver reação do BC e uma alta dos juros no segundo trimestre, diz. Mas isso vai depender de outros fatores, como atividade econômica e do comportamento do dólar. "Se houver turbulência lá fora e o dólar subir, para R$ 2,00 por exemplo, a reação do BC poderá ser ainda mais rápida", diz. Patah acha também que o problema com a perda causada pelo fim da CPMF pode adiar o grau de investimento de baixo risco para o fim do ano. "É difícil os números fiscais piorarem, mas o cenário interno volta ao radar dos investidores."


Um possível adiamento do tão aguardado grau de investimento - "investment grade", nota de risco que permite aos grandes fundos de pensão estrangeiros aplicarem diretamente aqui - também aparece no radar de Celso Boin, da Link Investimentos. "O cenário interno pode ficar ruim pelo lado fiscal e um problema com a perda de receita da CPMF pode adiar o grau de investimento, criando preocupações para o investidor estrangeiro", diz. "Pelo contato que temos com as empresas, porém, o clima é de muito otimismo, com projetos e investimentos para os próximos anos", diz Boin.


Apesar de mais um ano de alta do Ibovespa, boa parte dos economistas ainda enxerga potencial de valorização. Mesmo com a boa performance, as ações ainda estão baratas e o investidor não deve se apegar ao preço nominal dos ativos, avalia Marco Antônio Franklin, sócio da Paraty Investimentos. "O Brasil está com taxas de juros historicamente baixas e, apesar da alta de preços de 2007, não vejo a inflação saindo dos trilhos em 2008", diz o executivo. "Além disso, há um fluxo intenso de recursos para ações de investidores que antes estavam em renda fixa por conta do juro alto."


A maior parte dos analistas trabalha com um Índice Bovespa entre 72 mil e 85 mil pontos no fim do ano. A previsão para o Ibovespa de Daniel Gorayeb, da Corretora Spinelli, é de 85 mil pontos e ele tem como premissa um crescimento de 25% no lucro das empresas brasileiras, que já jogaria o valor do Ibovespa para 81 mil pontos. Mas há ainda o grau de investimento que "não vai mudar o país, assim como ninguém muda após o aniversário", mas ajudará o processo de atração de capital externo. A economia também deve continuar crescendo, apesar de novas quedas dos juros estarem comprometidas, pelo menos no primeiro semestre.


A parte negativa continua sendo a economia americana. Boin, da Link, por exemplo, estima uma possibilidade de 20% da crise descambar para a economia e jogar o mundo em recessão. E o primeiro trimestre deve ser cheio de divulgações de problemas com bancos que ainda vão afetar o mercado de crédito mundial, até que se saiba o alcance das perdas com o "subprime" - títulos hipotecários americanos de alto risco.


Não por acaso, Boin tem sua maior aposta no mercado doméstico, incluindo aí consumo, bancos e infra-estrutura. Quanto à Petrobras, Boin diz que só a recomenda para quem quer uma carteira para bater o Ibovespa, onde a estatal tem forte peso, e pelo efeito de novas descobertas de reservas. "A administração atual não entrega o aumento de produção prometido há três anos, o governo usa a estatal para fazer política internacional, se mete onde não sabe e deixa reserva sem exploração", diz.


Os fundos compostos por ações da estatal do petróleo rendiam 88,06% até o dia 24, mas as cotas ainda não haviam incorporado os ganhos de 4,36% das ações ordinárias (ON, com voto) entre os dias 26 e 28. Já para os papéis da Vale, Boin é mais otimista, pela dinâmica de Ásia e, principalmente, China, com países acelerando a industrialização e urbanização da sociedade, o que vai demandar muito investimento. As carteiras compostas só por ações da Vale encerraram 2007 como as aplicações mais rentáveis do ano, com retorno médio de 86,48% em 2007, mas ainda sem considerar a queda de 0,84% dos papéis entre as festas.

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