sexta-feira, 6 de maio de 2011

Bolsa? Volto amanhã


06/05/2011

Alessandra Bellotto | De São Paulo

Abolsa de valores não está preparada para acolher o investidor iniciante. É o que mostra uma experiência com dez candidatos a investidor realizada pela empresa de planejamento estratégico de marca CO.R Inovação, a pedido da BM&FBovespa. Cada pessoa do grupo - formado por homens e mulheres de 25 a 35 anos das classes A e B - recebeu R$ 500 para um "test-drive" na bolsa. Com tantos tropeços pelo caminho, todos teriam desistido de estrear no mercado se não estivessem participando da pesquisa, diz a diretora de projetos da CO.R, Nathalia Souza.

A iniciativa, que tinha como objetivo converter aspirantes em investidores, foi realizada no fim do ano passado e apontou falhas que podem estar atrasando o crescimento do número de pessoas físicas na bolsa no ritmo esperado. Só nos primeiros quatro meses deste ano, 6,9 mil investidores deixaram o mercado - em abril, o número de contas de pessoas físicas caiu para 596.571. Uma ressalva: o ambiente atual, de bolsa em baixa, inflação pressionada juro em alta e crise internacional, não está favorável para a aplicação em ações. "Esses últimos quatro meses não ajudaram", destaca o diretor-presidente da BM&FBovespa, Edemir Pinto.

Mas ele também acredita que faz parte do trabalho de educação da bolsa mostrar para as pessoas que essa é a dinâmica do investimento em ações. E reconhece que há um desafio enorme para vencer as barreiras que têm afugentado, especialmente, os decididos a experimentar a bolsa, conforme apontou a pesquisa, e colocado a meta da bolsa de alcançar a marca de 5 milhões de investidores pessoas físicas até o início de 2015 mais distante.

O projeto liderado pela CO.R Inovação teve duas fases. Na primeira, o objetivo foi identificar o estilo de vida do público potencial, sua relação com o dinheiro, perfil e valores. Já nesse momento, alguns obstáculos foram detectados. Entre eles, conta Nathalia, percebeu-se que a bolsa não é lembrada quando se fala em investimento e está envolta em mitos, ao ser associada a um mercado para grandes investidores ou especialistas. Também se notou falta de conhecimento sobre como iniciar um investimento em ações, e foi isso que levou à segunda fase do projeto: o de acompanhar dez aspirantes a investidor na sua "conversão".

Uma vez selecionado o grupo, cada um dos participantes recebeu a missão de investir R$ 500 na bolsa. A opção por um valor inicial baixo para aplicação, explica Nathalia, teve como objetivo deixar os desafios ainda mais latentes. Em seguida, foram definidos cinco passos. No primeiro, o aspirante tinha de garimpar informações sobre como investir. A maioria recorreu ao sistema de busca Google, sem sucesso. Além de o site da BM&FBovespa não aparecer nos resultados da pesquisa, outra constatação desse potencial investidor foi que as corretoras indicadas usavam uma linguagem específica do mercado, nada amigável ao iniciante.

Também nesse momento, descobriu-se que, para operar na bolsa, é preciso de um intermediário. "Eles não sabiam que existia corretora, nem ligada à banco, o que provocou uma certa insegurança", afirma Nathalia. O segundo passo do processo de conversão era justamente entender o papel do intermediário para poder fazer a escolha. A experiência, mais uma vez, frustrou os potenciais investidores, postergando o investimento.

Segundo Nathalia, o estudo deixou o candidato a investidor com o sentimento de que a corretora é um pedágio, uma instituição para executar as ordens, e não para facilitar a vida do cliente. Além de colocar barreiras como investimento mínimo, as instituições mostraram que não estão preparadas para acolher o estreante, que sente falta da relação humana, de alguém para tirar dúvidas. O investidor iniciante, ressalta a diretora, não olha se a corretora tem o melhor preço, tecnologia avançada, equipe de análise premiada, distribuição de relatórios. "Ele quer a melhor orientação, de um jeito simples e claro, a um custo compatível", diz. E até está disposto a perder dinheiro nesse primeiro momento em troca da aprendizagem.

No banco, compara a executiva, há sempre um gerente para socorrer o cliente. E foi para essa fonte, diga-se de passagem, que boa parte dos participantes da pesquisa recorreu na busca por informações, obtendo como resposta a sugestão de investir em um fundo de ações, sob o argumento da gestão profissionalizada. "O gerente do banco, muitas vezes, acaba tirando a possibilidade de o cliente migrar para a corretora", destaca.

Outro obstáculo enfrentado no processo de investimento foi na hora de escolher as ações. As corretoras, em geral, trabalham com carteiras recomendadas, que incluem sugestões de alguns papéis. Mas o candidato a investidor percebeu que o valor inicial que tinha para aplicar não era suficiente para replicar a aplicação sugerida. Nem mesmo para comprar um lote de ações. E aí mais uma decepção: com R$ 500 só dava para operar no mercado fracionário, o que levou esse potencial investidor a acreditar que a bolsa, de fato, é para gigantes.

Como esse aspirante a investidor sempre ouviu dizer que diversificar é fundamental, a estreia na bolsa foi feita com baixa convicção, conta Nathalia. "Operar no mercado fracionário não foi considerado uma experiência completa", diz. Mas o investidor seguiu em frente, escolheu a ação e passou para a fase seguinte, que era explorar o sistema de negociação.

Também, segundo a diretora, além de não entender a dinâmica de preços do mercado, poucos sabiam operar no home broker, sistema de negociação on-line de ações. Nathalia conta que alguns compraram ações a um preço mais alto do que o médio, outros, papéis de baixa liquidez, acreditando que o fato de haver menos investidores negociando a ação era um bom sinal. "Eles fecharam os olhos e deram o clique", conta. Mas ainda ficaram na dúvida se o negócio tinha sido concretizado.

"Há um elo perdido no processo de conversão", afirma Nathalia. Segundo ela, quando um candidato a investidor decide aplicar na bolsa, não há quem o ajude a fazer esse caminho. "As corretoras precisam melhorar a comunicação com o iniciante, até porque ele pode vir a se tornar um grande investidor." Tudo vai depender da primeira experiência, acrescenta Nathalia.

No caso dos que participaram da pesquisa, apesar dos vários obstáculos que enfrentaram ao longo do processo, a diretora diz que todos manifestaram a vontade de fazer cursos e passar a acompanhar o mercado.

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