terça-feira, 18 de maio de 2010

Cautela na previdência

Valor Econômico

18/05/2010

Por Alessandra Bellotto, de São Paulo

Que longo prazo que nada! Nem o investidor de previdência quis arriscar e aproveitar o momento de pânico da bolsa para aumentar seu pé de meia com aplicações em renda variável a preços mais atrativos. Nos primeiros dias de maio, o comportamento predominante no segmento de fundos de previdência aberta tem sido o de cautela, mostra levantamento realizado pelas consultorias NetQuant e Towers Watson com 477 carteiras. Os fundos sem ações lideram os investimentos, contrariando a tendência verificada nos últimos meses. E essa deve ser a toada daqui para frente.

A inversão de rumo reflete mais a repercussão na mídia da crise na Europa e seus potenciais desdobramentos do que o impacto da queda da bolsa na rentabilidade das carteiras, acredita o sócio-diretor da NetQuant, Marcelo Nazareth. Ele argumenta que o mercado de ações já apontava para baixo desde o início do ano - reduzindo os ganhos nos fundos com renda variável -, mas nem por isso o investidor se mostrava preocupado. Até o mês passado, segundo Nazareth, o aplicador ainda pautava suas decisões olhando o desempenho da bolsa em 2009, quando o Índice Bovespa subiu mais de 82%.

No acumulado do ano até abril, os fundos de previdência aberta com renda variável atraíram R$ 4,39 bilhões, mais de 71% dos R$ 6,15 bilhões aplicados no setor. Desse total, as carteiras mais agressivas, com até 49% em renda variável, receberam R$ 1,8 bilhão. O volume está acima do recebido por fundos de renda fixa e multimercados sem ações (R$ 1,76 bilhão).

Já em maio, até o dia 12, o destaque ficou por conta das carteiras sem ações. Invertendo a rota, segundo a pesquisa, esses fundos atraíram o equivalente a 67,4% do total: R$ 301 milhões dos R$ 446,44 milhões aplicados em previdência aberta.

Esse movimento foi guiado por clientes do varejo, afirma o gerente comercial da seguradora Icatu Hartford, Sérgio Prates. Segundo o executivo, nesse universo de investidores, a preferência pelo conservadorismo pode ser medida pelas novas contratações. A demanda é muito maior por planos de renda fixa do que com ações. O investidor menos sofisticado é bem mais sensível ao curto prazo, diz.

E, conforme atesta o histórico, ele está sempre no rabo do foguete, acrescenta Prates. Tanto é que o varejo só passou a considerar aplicações em fundos com renda variável depois de ver a forte alta da bolsa no ano passado. "A crise na Europa deixou todo mundo temeroso", reconhece. "Mas o grande investidor, mais sofisticado, tem aproveitado o momento para aumentar o dinheiro em ações."

Prates ressalta que, na previdência, faz todo sentido olhar para um horizonte mais longo, de três, cinco ou dez anos, até por conta dos benefícios fiscais - a alíquota de imposto de renda é regressiva, ela começa em 35%, chegando à mínima de 10%, após dez anos de aplicação. Além disso, afirma o executivo, as perspectivas para o país são bastante positivas, basta ver o forte potencial de crescimento econômico.

Ainda assim, ele não vê mudança no comportamento do pequeno investidor. "O ano tende a ser muito volátil, com muita indefinição", afirma. Do lado externo, a crise europeia ainda deve fazer novos estragos, até que as medidas adotadas se mostrem eficientes. Por aqui, a contribuição para o sobe e desce dos ativos virá das eleições presidenciais.

Para Nazareth, da NetQuant, o mercado de previdência aberta neste ano - ao contrário do que foi nos últimos meses - será da renda fixa. "Em geral, o cliente da previdência aberta não é tão sofisticado e tende a se comportar como um tradicional cotista de fundo DI", diz. Na opinião do diretor da consultoria, esse investidor não sabe separar o que é dinheiro de curto prazo e os recursos que podem ficar alocados em aplicações com vencimento mais longo. "Ele tende a olhar só o curto prazo, além de tentar acertar quando a bolsa vai subir ou cair."

Mesmo no universo das aplicações de renda fixa o investidor de previdência tem perdido oportunidades, acrescenta Nazareth. Levantamento da NetQuant aponta que a rentabilidade média nos últimos 12 meses da parcela de renda fixa dos fundos abertos de previdência gira em torno de 8%, ante 11% da previdência fechada. Em 24 meses, a diferença é maior: 19,9% nos fundos abertos para 26,5% na previdência fechada.

"Na previdência aberta, ainda prevalece a cultura do CDI, é raro ver uma alocação diversificada por prazos", diz Nazareth. Um dos argumentos, na sua opinião, pode ser a volatilidade maior nas cotas dos fundos quando a carteira reúne títulos de mais longo prazo, prefixados ou indexados à inflação, o que tende a assustar o cotista, afirma. Na fechada, compara, isso não é problema.

Na Icatu, Prates afirma, no entanto, que a procura por fundos atrelados à inflação tem crescido. "Essas carteiras têm sido destaque desde o ano passado, por conta das pressões inflacionárias", diz. Vale lembrar que, por ser uma seguradora independente, a Icatu atrai investidores mais sofisticados.

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