terça-feira, 29 de janeiro de 2008

Leão manso

Valor Econômico
Por Danilo Fariello, de São Paulo
29/01/2008

Cada vez menos dinheiro está saindo do bolso dos investidores de fundos de renda fixa, DI e multimercados para os cofres do governo. Um estudo da Associação Nacional dos Bancos de Investimento (Anbid) para o Valor mostra que o total recolhido semestralmente - em maio e novembro - por esses fundos à Receita Federal, conhecido como come-cotas, está caindo nos últimos dois anos, apesar de as alíquotas continuarem as mesmas.


Em novembro último, o governo recolheu R$ 2,53 bilhões, 15% menos do que a média entre maio de 2005 e novembro de 2007. O valor supera apenas o recolhimento de novembro de 2005, quando o patrimônio dos fundos que bancavam o imposto era 19% menor do que o atual. De acordo com a Anbid, são duas as principais razões para a queda do valor cobrado: o encolhimento recente do patrimônio dos fundos sobre os quais incide o come-cotas e a menor rentabilidade média dessas carteiras.


Cálculos do site Fortuna indicam que a rentabilidade média dos fundos com come-cotas caiu de cerca de 8% nos semestres anteriores para 5,17% no período encerrado em novembro. Como o come-cotas toma por base a rentabilidade - sobre a qual incidem as alíquotas de 15% nos fundos de longo prazo e 20% nos de curto prazo -, com os ganhos menores, o valor abocanhado pelo leão caiu. É o lado bom de uma notícia ruim.


Além do pagamento semestral, os aplicadores dos fundos de renda fixa, DI e a maior parte dos multimercados pagam o IR também no resgate, de acordo com a variação do valor das cotas desde a última cobrança. Se o aplicador tiver perda no fundo até a data do saque, poderá compensá-la futuramente.


Outro fator que tem feito a arrecadação cair é a migração dos investidores para outros investimentos. Em 2007, por exemplo, houve migração maciça dos pequenos aplicadores dos fundos de renda fixa para a caderneta de poupança, que teve captação de R$ 33,3 bilhões. Já os fundos de renda fixa perderam R$ 12,856 bilhões em 12 meses, e os DIs, R$ 9,751 bilhões, segundo dados do Fortuna. Os fundos de ações, que não pagam come-cotas, captaram R$ 23,3 bilhões. Entre os fundos sujeitos ao imposto, cresceu apenas o número de investidores institucionais, como fundos de pensão, que não pagam o come-cotas. O percentual de clientes não-institucionais, no qual se incluem pessoas físicas e jurídicas, caiu, diz a Anbid.


Aplicadores não apenas deixaram os fundos de renda fixa e DI à procura de outras alternativas conservadoras sem come-cotas, como também partiram para aplicações em renda variável, cuja incidência de imposto de renda ocorre apenas no resgate, comenta Gilberto Braga, professor de finanças do Ibmec-Rio. "A queda da taxa de juro e o vigor da bolsa nos últimos anos levaram a essa realocação e à queda de receita do governo no recolhimento semestral."


Para Andréa Bazzo, do escritório Mattos Filho Advogados, também pode ter reduzido o recolhimento da Receita a decisão dos investidores de migrar para carteiras de recebíveis ou mesmo aplicar em imóveis, que não têm incidência do come-cotas. Outro motivo seria o maior número de fundos fechados, cuja incidência do recolhimento periódico é discutível e pouco aplicada, diz ela.


Até 2004, o recolhimento do come-cotas ocorria ao fim de cada mês. Quanto menor a freqüência da cobrança, melhor para o aplicador, porque pode obter rendimento sobre o valor antecipado aos cofres da Receita. "A mudança de mensal para semestral estimulou as aplicações em fundos", diz Braga, do Ibmec-Rio.


Para Braga, o caminho natural da tributação come-cotas seria transformá-la agora em anual e depois extingui-la. "No entanto, no atual contexto da não renovação da CPMF no Congresso, acho que isso ainda não é para 2008, uma vez que o come-cotas representa cerca de 5% do que o fisco vai deixar de arrecadar com a contribuição". Não há, atualmente, nenhuma discussão em pauta no governo sobre revisão dos critérios do come-cotas. "No longo prazo, porém, a Receita poderia até passar a arrecadar mais sem o come-cotas", diz ele.


A derrubada do come-cotas poderia levar a uma queda das taxas de administração cobradas pelos fundos, porque seriam reduzidos a burocracia e os custos de administração das carteiras, acredita Braga. Para outros profissionais do mercado, porém, grande parte dos investimentos necessários para o recolhimento do come-cotas já foram feitos pelos administradores, portanto, haveria pouco impacto nos custos com sua derrubada.


Vale lembrar que o aplicador que ficar menos de dois anos em um fundo de investimento está sujeito a um ajuste do IR recolhido no come-cotas. O motivo é que a alíquota recolhida semestralmente é a menor possível a ser paga pelo aplicador - de 15% nos fundos de longo prazo e multimercados e 20% nos de curto prazo. Se o aplicador de um fundo de longo prazo resgatar em um período entre um ano e meio e dois anos, por exemplo, pagará alíquota de 17,5% sobre o seu lucro. Mas bancará no resgate a diferença entre a cobrança de 15% do come-cotas e os 17,5% de imposto sobre o ganho no período de um ano e meio
.

Nenhum comentário:

Locations of visitors to this page