sexta-feira, 21 de agosto de 2009

Poucos e bons

Na média, só 5% dos fundos mistos no Brasil têm retornos que compensam o risco e justificam o custo cobrado na gestão, revela estudo do Insper


Valor Econômico

Por Adriana Cotias, de São Paulo
21/08/2009

Na média, só 5% dos fundos hedge brasileiros conseguem obter retornos que recompensam o investidor pelo risco e por não estar na renda fixa, e valem o custo da gestão diferenciada. E, no geral, são poucos os profissionais à frente desses portfólios com habilidade para identificar mudanças de tendência a ponto de mexer na carteira rapidamente para ganhar com o chamado "market timing". Em contrapartida, boa parte dos multimercados locais cumpre o papel de ter correlação nula com o mercado, o que quer dizer que a performance independe do vaivém dos ativos de referência. Tais conclusões estão no estudo "Análise e Desempenho dos Multimercados Brasileiros", recém-concluído por Gustavo Jordão e Marcelo Moura, do Insper - Instituto de Ensino e Pesquisa.

No trabalho, os pesquisadores mapearam 2.347 fundos mistos, com os dados mensais da Associação Nacional dos Bancos de Investimentos (Anbid). Para tanto, consideraram três períodos distintos: a vida dos fundos a partir de 2000 até seu término ou até fevereiro último (para os fundos ainda ativos); em 12 meses encerrados em fevereiro de 2009; e, de junho a novembro de 2008, intervalo que compreendeu as piores perdas do Ibovespa, quando os mercados globais se defrontaram com os desdobramentos da crise do "subprime", as hipotecas americanas de alto risco.

 

 

Para medir o desempenho das carteiras, Jordão e Moura se valeram do tradicional Capital Asset Pricing Model (CAPM, modelo que relaciona o retorno esperado de um determinado ativo de risco pela taxa livre de risco, o CDI, por exemplo, e o prêmio de risco do mercado, no caso o Ibovespa) e de Sharpe. Foram usadas também suas extensões: o CAPM com "market timing", de Treynor e Mazuy, além de modelos que levam em conta outros fatores além do prêmio de risco de mercado, como o Fama e French - que considera o efeito do tamanho das empresas, o valor de mercado e patrimônio líquido sobre o valor de mercado - e o de Carhart - que avalia o "momentun effect", que é o impacto de portfólios de ações com alto retorno sobre ações com baixo retorno.

Avaliando-se, primeiro, os diferentes períodos, os pesquisadores constataram que, quando considerada a vida dos fundos entre janeiro de 2000 e fevereiro de 2009, 82,36% deles conseguem ter rentabilidade média superior ao Ibovespa, mas apenas 42,56% ficam acima do CDI. Quando se restringe a análise para 12 meses (entre fevereiro de 2008 e fevereiro de 2009), 64,38% batem o índice e somente 9,54% ultrapassam o CDI. O mesmo ocorre na fase que corresponde aos meses mais adversos da crise, entre junho e novembro de 2008, quando 61,40% dos portfólios ficaram acima do Ibovespa e só 7,37% superaram o CDI. Vale lembrar que, nesses dois últimos intervalos, o índice de referência da bolsa brasileira apresentou perdas de 2,88% e 49,59%, respectivamente.

O que se conclui dessas amostras é que os resultados obtidos não foram dos mais favoráveis para os multimercados brasileiros, quando analisada a capacidade dos gestores de obterem ganhos que não sejam simplesmente explicados pela elevada taxa de juros e o próprio risco Ibovespa. Dependendo do modelo utilizado, somente de 3,58% a 6,35% dos 2.347 fundos analisados conseguiram criar aquilo que os financistas chamam de alfa, uma medida de geração de valor adicional ao prêmio de risco.

"A promessa que o fundo faz é conseguir um retorno que mais do que compense o que o investidor obteria se aplicasse diretamente em ativos arriscados, é um retorno que tem de justificar o custo da taxa de administração, caso contrário ele poderia comprar as ações do índice e não precisaria pagar o preço da gestão", diz Moura. Mas o pior do levantamento é que entre 8,44% e 12,61% dos fundos tiveram retorno negativo.

Tal dinâmica, explica Moura, não é particularidade do mercado local. Outros estudos internacionais comprovam que são poucos os gestores que acertam a mão também nas economias desenvolvidas. No caso brasileiro, os juros historicamente elevados explicam a dificuldade dos gestores de baterem o CDI.

Nas janelas de tempo mais recentes, ele suspeita que são as altas taxas de administração cobradas pelos fundos que corroem o desempenho. Mesmo as carteiras que conseguem bater o "benchmark" acabam tendo parte do resultado comido pelas taxas de performance, aquelas que incidem quando o gestor cumpre determinado objetivo de rentabilidade, acrescenta Jordão. Ele explica que todos os modelos foram calculados pelos retornos líquidos, excluindo-se os efeitos dos custos, sem considerar, entretanto, a tributação, que depende do prazo do investimento.

A habilidade dos gestores para prever as oscilações do mercado também foi testada e só 6,56% dos fundos, ou 154 carteiras, evidenciaram a capacidade desses profissionais para se aproveitar das mudanças de tendência pelo modelo CAPM. Nesse item, a evidência mais desalentadora é que gestores de 378 fundos (ou 16,10% deles) foram completamente inábeis: não só não agregaram ganhos para as carteiras como destruíram valor.

Tais resultados são tão mais relevantes num ambiente em que os juros brasileiros atingiram um nível historicamente baixo, com a Selic em 8,75% ao ano, pontua Moura. "Quando estava em 13%, até um ano atrás, os fundos tinham que, pelo menos, bater essa taxa e o investidor tinha a ilusão de que recebia um bom retorno, embora não tivesse a percepção exata do risco que corria." A crise, a seu ver, foi educativa no sentido de mostrar esse risco que o aplicador não enxergava nos multimercados enquanto a bolsa era para cima e os ativos só se valorizavam.

Em contrapartida, boa parte das carteiras avaliadas, 37% delas, conseguiram neutralizar o risco de mercado. No ano passado, por exemplo, quando o Ibovespa mergulhou de mais de 70 mil para 29 mil pontos, os gestores evitaram uma queda de tal proporção e, no geral, preservaram o capital do investidor.

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