segunda-feira, 20 de abril de 2009

Fundos na berlinda

Valor Econômico
Angelo Pavini, de São Paulo
20/04/2009


Na semana que vem, dias 28 e 29 de abril, o Copom se reúne e pode baixar o juro básico da economia dos atuais 11,25% para perto de 10% ao ano. Além de reduzir os ganhos de toda a cadeia de investimentos de renda fixa, a medida deverá acentuar a vantagem da caderneta de poupança em relação aos fundos de investimento de renda fixa, DI e curto prazo. Será também o sinal para o governo mudar as regras da caderneta, para tentar evitar uma fuga de recursos dos fundos de investimento, o que traria problemas para a rolagem da dívida pública, já que cerca de 70% do patrimônio de R$ 1,2 trilhão em fundos estão em títulos do Tesouro, lembra Marcia Dessen, da consultoria BankRisk.

Cálculos feitos pela Luz Engenharia Financeira mostram que hoje, considerando um rendimento para a poupança próximo do registrado nos últimos 12 meses, de 8% líquidos, os fundos renda fixa, DI ou curto prazo com taxa de administração maior que 0,75% ao ano já perderiam para a caderneta em aplicações inferiores a seis meses, onde alíquota de imposto de renda é maior, de 22,5%. O estudo foi feito com os fundos de cotas, que em geral são as carteiras oferecidas no varejo e onde as taxas de administração são maiores. Isso significa que 310 fundos com um patrimônio de R$ 185 bilhões seriam afetados pela concorrência.

Considerando o prazo de um ano, onde o imposto cai para 20%, estariam em situação delicada os fundos com taxa de administração maior que 1%, o que atingiria 225 carteiras com patrimônio de R$ 101 bilhões. Se a taxa básica cair para 10%, nenhum dos 477 fundos pesquisados ganharia da poupança em aplicações até seis meses. Levariam vantagem ante a poupança apenas os fundos com taxa de administração de 0,5% e isso para períodos acima de dois anos. "A queda da Selic vai ser boa para a economia, mas péssima para fundos de pensão e de investimentos", diz Edivar Vilela de Queiroz Filho, sócio da Luz Engenharia.

Apesar da queda de competitividade esperada dos fundos, os investidores não estão se mexendo. A captação da poupança no, até dia 13, está em R$ 995 milhões, enquanto os fundos receberam R$ 5,8 bilhões. Além da inércia natural do investidor, há também a expectativa de que o governo mudará as regras da poupança, eliminando uma eventual vantagem de quem entrasse agora na aplicação. "E não tem essa coisa de direito adquirido, se o governo mudar as regras de rentabilidade, o investidor antigo também será afetado", diz Sinara Polycarpo, superintendente executiva de investimentos do Grupo Santander Brasil.

Ela tem recebido consultas de muitos clientes, mas a orientação é pensar bem antes de qualquer mudança. "Grandes investidores já têm hoje acesso a fundos com taxas de administração menores e CDBs com remuneração mais alta, e muitos já têm aplicações com mais de dois anos, com imposto mais baixo, de 15%, e perderiam isso para ir para a poupança e correr o risco de ver as regras mudarem."

Há ainda outras características próprias dos fundos que as cadernetas não oferecem, lembra Sinara, como a rentabilidade diária. "No fundo o investidor pode aplicar por períodos quebrados, sacar e receber o rendimento até o dia anterior, o que não ocorre na caderneta, onde, se sacar antes do dia certo do mês, o aplicador perde a rentabilidade do aniversário anterior até o saque", diz.

Entre as mudanças em discussão, conforme apurou o repórter especial Cristiano Romero, estão limitar novas aplicações a R$ 5 mil por CPF, criar um imposto para maiores valores, mudar o cálculo da Taxa Referencial (TR, que corrige a poupança), reduzir os juros de 0,5% ao mês ou 6,17% ao ano ou ainda indexar a caderneta à Selic.

Mesmo que o governo acabe com a TR - a medida mais simples -, a vantagem da caderneta continua porque o juro de 6,17% ao ano não paga imposto. Neste mês, em vários dias, a TR já ficou em zero, ou seja, a caderneta rendeu apenas 0,5% por conta do menor número de dias úteis, que reduz o ganho nominal da taxa média dos CDBs. É essa taxa que serve de base para o cálculo e aumenta o impacto do redutor da TR. Mesmo sem a TR, fundos com taxa de 1% já começarão a perder da poupança nas aplicações até seis meses se os juros caírem para 9% ao ano, como se espera para junho.

Mas, para Marcia Dessen, a discussão não pode ficar apenas em reduzir a rentabilidade da caderneta. "É preciso que os fundos de investimento também se ajustem a essa nova realidade, de juros mais baixos", diz. "Alguns bancos cobravam 3%, 4%, até 5% ao ano de taxa de administração quando o juro estava em 25% ao ano e continuam com essas taxas hoje", diz. De qualquer maneira, ela observa que o governo não pode admitir um desequilíbrio muito grande entre as aplicações. "A questão não é se o banqueiro que vai perder receita com os fundos, mas sim a rolagem da dívida pública, que ficará mais difícil, o setor de fundos tem um papel importante que precisa ser preservado." Além disso, Marcia lembra que quem pagará o custo maior da poupança será o tomador do crédito imobiliário.

Sobre as mudanças possíveis para a caderneta, Marcia acha que a redução da TR terá pouco efeito uma vez que o indexador hoje já está muito baixo, perto de 1% ao ano. A tributação da caderneta seria mais fácil, uma vez que existe a previsão de cobrança de imposto na legislação que regulamenta a aplicação. "Só que, para a pessoa física, a alíquota é zero, só as empresas pagam imposto na caderneta", diz. O problema é que o imposto só poderia ser cobrado no ano que vem, pelo princípio da anualidade.

Ela acha que a saída será mesmo limitar os valores das aplicações ou reduzir o juro, apesar de toda a impopularidade de uma medida com essa. "O Congresso tem de pensar não só no aplicador, mas na pessoa que toma o empréstimo imobiliário e que vai ser prejudicada pelo custo mais alto e está em situação mais delicada."

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