segunda-feira, 27 de julho de 2009

CDB derrapa

Com taxas mais baixas, depósitos a prazo têm saídas líquidas de R$ 2 bi em julho e estimulam investidor a buscar alternativas mais rentáveis.

Valor Econômico

Por Adriana Cotias, de São Paulo
27/07/2009

 

Campeões absolutos de audiência em 2008, com uma captação líquida superior a R$ 230 bilhões, os Certificados de Depósitos Bancários (CDB), começam a perder fôlego. No ano, até o dia 20, acumulavam meros R$ 18,8 bilhões, com o saldo de julho negativo em R$ 2,1 bilhões, revertendo o ritmo observado em maio e junho, quando mais de R$ 7 bilhões ingressaram na categoria em cada mês. Março e abril já haviam registrado saídas líquidas, mas com os juros nominais em 8,75% ao ano, nível mais baixo da história, o investidor ensaia um novo comportamento. Alguns ainda estão com os recursos presos em CDB antigos, mas o dinheiro recém-resgatado e as sobras recentes têm buscado outros destinos, dispersando-se em ações, debêntures, multimercados ou a caderneta de poupança.

Com a criação dos depósitos a prazo com garantia especial (DPGE), que começaram a valer em abril, mas só decolaram nos dois meses seguintes, o fluxo se normalizou para os bancos de pequeno e médio porte, que, de lá para cá, captaram R$ 9,5 bilhões por meio do instrumento. Mas agora até mesmo essas instituições começam a colocar o pé no freio na oferta. Os grandes conglomerados financeiros, especialmente os privados, por sua vez, com o caixa cheio com as captações do passado recente e o menor ímpeto no crédito, mudaram o foco na rede. Com taxas mais baixas, a demanda também caiu.

"No varejo, efetivamente, a procura tem sido menor e o CDB ficou em segundo plano", diz o gerente-executivo de Produtos do Santander, Marcos Matos. "O investidor acompanha o seu extrato e quando vê 0,7% ao mês acha pouco quando compara com o histórico que era de 1% e, com o cenário mais calmo, ele acaba buscando alternativas mais rentáveis." Com o melhor desempenho da bolsa e dos multimercados, parte do dinheiro tem rumado para essas aplicações ou ainda para a caderneta, que tem sido o destino mais comum dos excedentes da conta corrente. Até meados de julho, o Santander observou uma captação líquida na poupança 50% superior a tudo que havia ingressado nos seis primeiros meses do ano.

Tal conduta está, em parte, relacionada à oferta menos agressivas das grandes instituições, com taxas muito aquém das observadas ao longo de 2008, quando o CDB de um banco de primeira linha chegou a pagar 110% do CDI no varejo. Atualmente, as taxas dos CDB convencionais para operações de baixo tíquete médio rondam os 80% do indexador. Comparando-se aos 6,17% anuais da poupança, livres de tributação, nem mesmo quem estivesse num depósito a prazo de dois anos, na alíquota mais baixa de imposto de renda (15%), ganharia mais no CDB, com um rendimento líquido de 5,95% ao ano.

Sem necessidades expressivas de captação, os grandes conglomerados financeiros conseguiram preservar um colchão de liquidez no atravessar da crise, mudaram de posição e agora jogam na retranca. "A grande maioria dos bancos, sobretudo os de grande porte, estão com o caixa cheio e o apetite para captar via CDB ficou significativamente menor", diz o diretor da Associação Nacional das Instituições do Mercado Financeiro (Andima) Nelson Rocha Augusto, também presidente do Banco Ribeirão Preto.

Conforme descreve, outros dois fatores explicam o fenômeno. A melhora do ambiente no mercado de capitais, com a volta das emissões de dívida e de ações nos últimos meses, permitiu às companhias acessar recursos por outro tipo de instrumento no lugar do crédito bancário. Além disso, fundos DI e de renda fixa, grandes compradores históricos de CDB, reduziram a demanda pelos papéis, já que a captação nessas carteiras também vem se mantendo discreta.

No Banco do Brasil, que tem sido um dos principais ofertantes de crédito do sistema no ano, enquanto os privados se retraem, não houve freio na venda de CDB na rede, diz o gerente executivo da Diretoria de Varejo Antonio Cássio Segura. "O CDB é o nosso principal 'funding' para crédito, estamos crescendo rápido e mantendo um excelente nível de liquidez." Segundo o executivo, a captação no ano cresceu 27%, só que, em julho, o aumento se limitou a 2%. Pelos últimos dados públicos, no fim de abril, o BB detinha uma carteira de R$ 128,2 bilhões em depósitos a prazo, com uma participação de 19,6% no mercado.

Segura credita à criação do DPGE o bom desempenho dos CDB nos meses de maio e junho. O instrumento adicionou uma cobertura de R$ 20 milhões do Fundo Garantidor de Crédito (FGC), que o investidor não encontra num CDB convencional, com seguro de até R$ 60 mil. Num primeiro momento, as taxas ofertadas eram bastante díspares, chegando a 130% do CDI pelos dados da Cetip, criando oportunidades para todos os perfis. Com prêmios desse porte, o BB criou cinco fundos de DPGE para investidores de alta renda. Em dez dias, as carteiras atraíram R$ 400 milhões e o banco vai conseguir remunerar os cotistas em 102% do CDI no Estilo e 105% no Private, já líquidos das taxas de administração. "Agora, com a normalização da liquidez, não conseguimos mais comprar nessas taxas."

Custos é o grande dilema hoje dos bancos de pequeno e médio porte, a quem a ampliação da cobertura do FGC visou atender. Para Renato Oliva, presidente da Associação Brasileira de Bancos (ABBC), que representa as instituições de nicho, o DPGE é hoje um título com risco praticamente igual ao do governo e deveria ter taxas até menores do que um CDB convencional. "O FGC é uma das instituições mais sólidas do Brasil, tem como sócio os principais bancos do país, com R$ 23 bilhões de caixa e patrimônio", diz Oliva. "No final das contas, o DPGE tem garantia do Tesouro, status de título público, e acaba sendo melhor do que o CDB do maior banco do Brasil."

Apesar de a liquidez ter se normalizado, as taxas pedidas hoje rondam os 110% do CDI, consideradas caras pelas instituições menores. Para ele, o preço justo hoje seria entre 100% e 102% do indexador. Mas esse é o retorno garantido por nomes como BB, Bradesco e Itaú, para grandes volumes.

A cobertura extra do FGC teve o mérito de redistribuir a liquidez, que vinha empoçando nos grandes bancos. Dessa forma, a iniciativa contribuiu para trazer mais solidez para todo o sistema e os bancos de pequena e média rede voltaram a emitir CDB com a garantia convencional, de R$ 60 mil, diz Oliva. Ele conta que, em agosto, antes da quebra do Lehman Brothers, essas instituições captavam a um custo entre 115% e 125% do CDI e que, atualmente, as taxas estão entre 110% e 115%.

Os volumes custodiados na Cetip confirmam a inflexão dos depósitos a prazo. Em julho, o saldo de DPGE atrelado ao CDI (78% do total) cresceu 7%, para R$ 9,5 bilhões. Já o estoque de CDB (também DI, que representa 88% do total), subiu só 1%, a R$ 781,7 bilhões. "Como a base de CDB é muito maior, não dá para inferir que possa estar havendo uma migração do CDB para o DPGE", explica o gerente de Relações com Participantes da Cetip, Fábio Hull.

Com os estoques formados no auge da crise vencendo e a percepção de que os episódios mais críticos ficaram para trás, os investidores, os agentes do mercado em geral, estão repensando o seu sentimento de aversão a risco, pondera o sócio-diretor da FinPlan, Mailson Hykavei. O advento do FGC até deu um fôlego de curto prazo para os depósitos a prazo, pois o mercado chegou a pagar taxas inimagináveis para um instrumento de renda fixa - de 135% do CDI, ouviu-se até 150% do indexador nas primeiras negociações. "O DPGE chegou a roubar fatia do dinheiro vencendo no CDB e houve também migração para outras classes de ativos."

Apesar de as taxas do DPGE hoje terem atingido níveis mais realistas, Hykavei considera que não há espaço para os custos caírem muito abaixo dos 110% ou 105% do CDI. "Uma coisa é você dar o conforto para o investidor com a cobertura de R$ 20 milhões, outra coisa é se colocar no cenário de executar essa garantia." Isso quer dizer que o retorno do DPGE dificilmente vai se equalizar ao do CDB, porque a diferença se justifica pela qualidade do crédito. "O mercado sempre vai atribuir um risco ao emissor", diz, além de ter, com a crise, aprendido a precificar liquidez.

Com o custo de oportunidade, dado pela Selic, mais baixo, Hykavei considera que os estoques de CDB e de outras aplicações de renda fixa vão cair progressivamente. A inflexão observada em julho é apenas um indício dos novos tempos que estão por vir

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