segunda-feira, 8 de junho de 2009

Fundos na era do juro menor

Na semana em que se espera a redução da Selic para a casa dos 9%, Bradesco diminui o valor mínimo de aplicação em carteiras de renda fixa e DI com taxas mais baixas.

Valor Econômico

Por Angelo Pavini, de São Paulo
08/06/2009




Às vésperas de um momento histórico, em que o Brasil terá, depois de décadas, uma taxa de juro primário abaixo de dois dígitos, os bancos de varejo começam a se movimentar para ajustar seus fundos de investimento à nova realidade. Diante da expectativa de que o Copom reduza a taxa Selic dos atuais 10,25% para 9,75% ou até 9,25% ao ano, o Bradesco resolveu se antecipar e deve anunciar hoje a redução do valor mínimo de aplicação de seus fundos oferecidos nas agências. São 23 fundos que ficarão mais acessíveis aos investidores com menor volume de recursos, afirma Marcos Villanova, diretor de Produtos de Investimento da instituição.

A medida é necessária pois, com a queda dos juros, aumenta o impacto da taxa de administração cobrada pelos bancos no retorno do investidor. Um fundo DI que cobra 4% ao ano de taxa ficará com quase metade do rendimento obtido no mercado se o juro cair para 9,25% ao ano - vale lembrar que a taxa é cobrada sobre todo o valor aplicado, não apenas sobre o rendimento. Depois há ainda o imposto de renda sobre o rendimento, e que varia de 22,5% para aplicações até seis meses até 15% nos prazos acima de dois anos.

Somando taxa de administração e imposto, esse fundo com 4% de taxa de administração renderia líquido para o investidor entre 3,8% se ele sacar antes de seis meses a 4,2% se o prazo da aplicação for maior que dois anos. Ou seja, mal cobrirá a inflação, levando-se em conta a estimativa de IPCA em torno de 4%. Se for comparada com a poupança, que rende pelo menos 6,17% ao ano, a diferença é ainda é maior.

Considerando ainda o juro de 9,25% ao ano, um fundos DI ou renda fixa conservador renderá menos que a poupança caso o banco cobre mais de 2% ao ano, no caso da alíquota mínima de imposto, de 15%, ou 1% ao ano se a alíquota for de 22,5%.

A ideia de baixar a aplicação mínima é uma alternativa a criar carteiras com taxas de administração mais baixa e deve ser seguida por outras instituições, como disse ao Valor o vice-presidente de Wealth Management do Itaú Unibanco, Alfredo Setubal, ex-presidente da Associação Nacional dos Bancos de Investimento (Anbid). Hoje, clientes do chamado varejo seletivo já pagam menos nos fundos.

Mas a expectativa era que os bancos fizessem a mudança sem grande estardalhaço, uma vez que ela significa ganhos menores para as instituições. O Bradesco, porém, resolveu transformar o limão em limonada e aparecer como primeiro a tomar a decisão. Ninguém fala, porém, em baixar as taxas de administração dos fundos atuais, que tenderiam a minguar sem aplicações novas, que iriam então para carteiras mais baratas.

Na nova tabela, a aplicação mínima dos fundos DI Brilhante e Renda Fixa Mercúrio, ambos com taxa de administração de 2,5% ao ano, cairá de R$ 10 mil para R$ 5 mil. Os fundos DI Topázio e Renda Fixa Saturno, que cobram taxa de 1,5%, passam de R$ 40 mil para R$ 30 mil. Já o DI Platinum e o Renda Fixa Marte, com taxa de 1% ao ano, caem de R$ 200 mil para R$ 80 mil. O fundo de curto prazo, que cobra 3% de taxa de administração, teve a aplicação mínima reduzida de R$ 5 mil para R$ 500,00.

A medida do Bradesco atinge também fundos de ações, que começarão a entrar no radar dos investidores a partir da queda dos juros, afirma Villanova. O Bradesco baixou a aplicação de quatro fundos de ações - Ibovespa Indexado, Ativo, Multi Setorial e Infra-estrutura -, de R$ 1 mil para R$ 500,00.

No varejo de alta renda, o Prime, os fundos DI e Renda Fixa de R$ 20 mil, que cobram 2% de taxa ao ano, passarão a aceitar aplicações de R$ 5 mil. Os de R$ 100 mil, com taxa de 1% ao ano, caem para R$ 40 mil e os de R$ 200 mil, que cobram 0,70% ao ano, para R$ 80 mil. Dois multimercados também reduzirão o valor mínimo, de R$ 25 mil para R$ 10 mil.

Os fundos mais acessíveis do varejo, DI Safira e o Renda Fixa Vênus, ambos com taxa de administração de 3,5% ao ano e que já rendem menos que a poupança, seguirão sem alterações, mantendo aplicação mínima de R$ 100. "Vamos tentar oferecer a melhor rentabilidade possível, alongando os prazos dos papéis, por exemplo", diz Villanova.

Ele não espera, porém, uma saída em massa de recursos desses fundos com destino aos mais baratos, mas que as novas aplicações sejam orientadas para as carteiras com taxa de administração menor. "O investidor que está nesses fundos mais antigos já tem direito a alíquotas menores de imposto, com mais de dois anos, e trocar de aplicação agora significaria recomeçar a contagem ou pagar mais imposto se precisar sacar", avalia.

Mesmo a vantagem da caderneta de poupança é relativizada por Villanova. "Quem aplica em fundos não quer ficar preso a uma data do mês para sacar, como na poupança", diz ele, lembrando que o investidor pode até ter cadernetas para os filhos, "mas usa mais o fundo para ele mesmo".

Para Villanova, o investidor quer liquidez diária e, para valores menores, a diferença de ganho entre poupança e fundo será pequena. "Quem aplica em um fundo de 3,5%, 4% de taxa de administração resgata logo, quer liquidez, não está preocupado em ganhar menos R$ 2, R$ 3 por mês numa aplicação de R$ 1 mil."

Villanova reconhece também que, com a taxa de juros menor, a concorrência entre as instituições vai crescer. "Não dá para comparar fundos de ações porque a qualidade da gestão tem um peso grande no desempenho, mais até que a taxa de administração", diz o executivo. "Mas num fundo DI, que tem 90% de títulos do Tesouro, ou até num renda fixa, já dá" afirma. Por isso a decisão de realinhar toda a grade de fundos do banco, ajustando-a a nova realidade do mercado. "A Selic vai cair e queremos que mais investidores tenham condições de entrar em fundos mais competitivos" , diz.

Outro ponto é que, com juro menor, o investidor vai querer diversificar. Não que de repente todos passarão a querer desesperadamente correr mais risco, "mas, com o retorno da renda fixa caindo bastante, será preciso diversificar para ganhar um pouco mais", observa Villanova. Para auxiliar nesse processo, o banco montou uma área de consultoria para os clientes e uma equipe que corre o Brasil orientando investidores. "Mostramos, por exemplo, que o multimercado é a ponte para quem não está acostumado com risco para entrar em ações no futuro", afirma.

O potencial de diversificação do mercado brasileiro é grande, lembra Villanova. Olhando o mundo, dos US$ 26 trilhões aplicados em fundos, metade está em ações, enquanto aqui esse percentual mal chega a 12%. Essa tendência torna importante a questão da preocupação do banco em conhecer o tipo de investimento que melhor se adapta ao cliente, a chamada "suitability". Os bancos terão de montar sistemas que permitam esse acompanhamento até janeiro do ano que vem. "Já fizemos isso para o private, agora estamos nos preparando para a rede."

De qualquer maneira, analistas recomendam que o investidor não mude suas estratégias neste momento. O ideal é primeiro avaliar a redução dos juros e a reação dos bancos e do governo, para depois pensar em sacar dinheiro dos fundos DI ou renda fixa.

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