quarta-feira, 3 de dezembro de 2008

Para onde vai o dinheiro?

Valor Econômico
Por Luciana Monteiro, de São Paulo
03/12/2008



O mês de novembro termina com mais de R$ 4 bilhões deixando os fundos de investimento, o que eleva os resgates no ano para R$ 46,943 bilhões. Este é o segundo pior desempenho da história do setor no país. As saídas só são menores do que as registradas no episódio da marcação a mercado, em 2002. Na ocasião, os investidores saíram de fundos após se assustarem com perdas em carteiras conservadoras como os DIs. Naquele ano até novembro, R$ 66 bilhões tinham deixado os fundos, volume que subiu para R$ 68 bilhões no fim de dezembro.

Com o desempenho de novembro, o setor de fundos completou o oitavo mês consecutivo de resgates, acumulando saques totais de R$ 85 bilhões no período de abril a novembro de 2008, mostra o relatório semanal do site financeiro Fortuna. Observando-se somente o comportamento do setor entre abril e novembro, os resgates apresentados agora são maiores do que os R$ 69,966 bilhões que deixaram o setor no mesmo período em 2002.


Mas para onde está indo esse dinheiro? Grande parte desses recursos está migrando dos fundos para os Certificados de Depósito Bancários (CDBs), que vêm pagando taxas para lá de atraentes mesmo para aplicações menores. Levantamento do Valor Data com base nos números do Banco Central mostra que os CDBs já captaram R$ 228,330 bilhões no ano até o dia 26. Somente em novembro, R$ 4,634 bilhões ingressaram nessas aplicações até 26.


A onda mais recente de saques, no entanto, vem sendo capitaneada por pequenos e médios empresários, que estão resgatando os recursos de suas aplicações pessoais para capitalizar a empresa. "E não são apenas companhias de pequeno porte, mas grandes empresas também, uma vez que as linhas de financiamento secaram", diz um gestor. Ele conta o exemplo de uma empresa com faturamento anual da ordem de R$ 300 milhões que antes captava recursos pagando cerca de 104% do CDI e hoje esse custo aumentou para 130% do CDI. "Aí, o empresário preferiu tirar o dinheiro da sua conta de pessoa física e colocar na empresa, já que os recursos no fundo não estavam rendendo tanto e a companhia estava com um custo de captação muito caro."


Um outro gestor confirma esse movimento. Ele conta o caso de um investidor dono de uma empresa que abriu o capital durante a onda de lançamento de ações dos últimos dois anos. "A empresa precisa de caixa, o custo de captação estava muito alto e esse investidor resolveu resgatar R$ 450 milhões que estavam aplicados num fundo conservador."


No caso dos resgates apresentados em novembro, é preciso ponderar que boa parte deles pode ser explicada pelo "come-cotas", imposto de renda recolhido semestralmente por fundos das categorias curto prazo, renda fixa, DI e multimercados. Pelas regras, a alíquota de IR é de 15% sobre o rendimento das aplicações.


Os resgates no ano só não são maiores por conta dos fundos de poder público, outros (onde estão os fundos de investimento em direitos creditórios, FIDC), previdência e ações. As carteiras classificadas como poder público, que recebem aplicações só de estados e municípios, registram captação de R$ 23,042 bilhões. Já os FIDCs acumulam ingressos de R$ 10,038 bilhões, mas apenas investidores qualificados (com aplicações acima de R$ 300 mil) podem investir. Os fundos de previdência e de ações, que são abertos para o investidor de varejo, têm captação líquida de R$ 8,207 bilhões e R$ 3,820 bilhões, respectivamente.


O setor de fundos terá a partir de agora de se reinventar, diz Aquiles Mosca, estrategista de investimentos pessoais e superintendente de vendas da Asset Management do Banco Real. "A indústria de fundos terá de criar alternativas para concorrer com os CDBs, pois a bolsa e os multimercados dificilmente vão ganhar a briga com o CDI (o juro interbancário)", avalia.


Mesmo o investidor de varejo tem hoje acesso a CDBs com taxas que antes eram impensáveis. Para se ter idéia, no Unibanco, com R$ 1 mil, o investidor consegue uma taxa de de 100% do CDI após dois anos de aplicação. Para os clientes que têm valores expressivos, alguns bancos de primeira linha chegam a oferecer CDBs com taxas de 103%, 104% do CDI com liquidez diária. Se topar abrir mão da liquidez, o retorno é até maior.


As taxas dos CDBs subiram porque, com o aperto no crédito externo, os bancos tiveram que se voltar para o mercado local para captar recursos. Com a concorrência, as taxas oferecidas aos investidores tiveram de subir. "Fica difícil concorrer com CDB, já que em casos de bancos de primeira linha o risco é baixo, o investidor não vê volatilidade e ainda tem liquidez diária", diz Gustavo Coelho, responsável pela área de alocação da Arsenal Investimentos.


Os fundos multimercados são os que mais tiveram saques no ano, de R$ 44,280 bilhões até novembro. Em seguida, aparecem os renda fixa que podem aplicar em papéis prefixados, com resgates de R$ 38,278 bilhões. "Desde agosto do ano passado, os multimercados não têm apresentado bom desempenho e o investidor vem migrando tanto de fundos mais agressivos quanto de conservadores para os CDBs", diz Rogerio Betti, sócio da Beta Advisors.


As regras tributárias incidentes sobre os rendimentos dos fundos contribuem para os resgates, avalia Marcelo D'Agosto. Isso porque, além do come-cotas, a alíquota de IR varia conforme o prazo de permanência na aplicação, o tipo de fundo e a natureza do investidor (pessoa física, jurídica, fundo de aplicação em cotas ou institucional). "A tendência é de que quem saiu demore para voltar, já que terá de esperar dois anos para ter direito à menor alíquota de imposto (nas outras aplicações)."

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